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AVISO AOS CINÉFILOS: “PORCARIAS” A VISTA!

AVISO AOS CINÉFILOS: “PORCARIAS” A VISTA!

Arthur José de Oliveira
Mariana Vitória Costa Santos
Victória Angélica Diniz Teixeira

Através desse texto e dos filmes propostos para sessão, buscamos trazer o debate sobre as semelhanças e diferenças de dois tipos de “cinema popular”, que são separados pelo tempo, distância e principalmente pela cultura. Na maioria das vezes esse estilo de cinema com apelo popular não tem uma boa recepção dos críticos, mas são aclamados pelo público.
Na comédia romântica Salaam-E-Ishq de 2007 dirigida por Nikkhil Advani e produzida na Índia, acompanhamos a história de seis casais que acabam se conectando de alguma forma durante o filme, já que o tema principal da trama é “saudações ao amor”.
Já o longa-metragem Aviso aos navegantes, 1950 de Watson Macedo, é uma chanchada da produtora Atlântida em conjunto com a União Cinematográfica Brasileira S.A. que conta a história de um luxuoso transatlântico, que parte de Buenos Aires rumo ao Rio de Janeiro. A bordo se encontra uma companhia teatral brasileira, que tem como artista a dançarina Cléia (Eliana Macedo), cortejada pelo comandante do navio Alberto (Anselmo Duarte). Em um outro ramo da história temos Frederico (Oscarito) um clandestino que é descoberto pelo cozinheiro Azulão (Grande Otelo), então passa a servi-lo para que não seja denunciado; porém o comandante do navio, recebe um aviso que um perigoso espião internacional encontra-se a bordo. Entre os vários números musicais vemos as trapalhadas e confusões de Frederico e Azulão, tentando juntar provas para desmascarar o espião.
A chanchada foi um gênero do cinema brasileiro, que ocorreu por volta da década de 30 a 60 no país. Sua definição literal vem de “chancho”, palavra espanhola, se desenvolveu para chanchada que quer dizer “porcaria” e era assim que os críticos da época a definiam, por não enxergar algo de caráter social profundo ou relevante. Os filmes que eram produzidos dentro desse gênero eram muito exagerados, previsíveis e vistos como cópias dos filmes estrangeiros, porém o público consumia muito e gostava desse conteúdo, mas foram feitos tantos filmes de chanchada que logo a fórmula saturou e com a chegada da TV no início da década de 50, as empresas, como as produtoras Cinédia, Atlântida e Vera Cruz, que produziam esses filmes, acabaram falindo.
A chanchada foi muito assemelhada aos musicais, uma das principais similaridades que podemos encontrar entre os filmes é a presença da música cantada por diferentes personagens durante os longas-metragens.  No filme indiano Salaam-E-Ishq podemos observar que a música entra como um complemento narrativo, durante o decorrer da história, porém isso não é uma exclusividade apenas desse filme na Índia. A característica de sequências musicais se estabeleceu nos filmes de bollywood nos anos 60, quando os musicais de Hollywood se popularizaram no mundo. Já em Aviso aos navegantes vemos várias marchinhas de carnaval com temas diferentes, entrando muitas vezes aleatoriamente durante o filme. Porém em ambas as produções ou até mesmo na maior parte das chanchadas e no cinema indiano, a música carrega uma questão popular e cultural de seus respectivos países.  É comum na índia lançar as músicas dos filmes antes dos próprios longas, para atrair os espectadores ao cinema. Já nas chanchadas era comum lançar o filme antes do carnaval para propagar as marchinhas que estariam na boca dos foliões; além dos diretores, às vezes, contratavam cantores da época para cantar em alguma cena de apresentação do filme, o que gerava grande sucesso popular.

 

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Imagem de cena de musical do filme Aviso aos navegantes, 1950 – Watson Macedo

 

 

 

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Imagem de cena de musical do filme Salaam-E-Ishq, 2007 – Nikkhil Advani

 

 

Para termos um filme indiano, precisamos de alguns ingredientes, entre eles estão romance, comédia, drama, suspense, violência, valores familiares, dança e muita música; isso tudo junto e misturado em geralmente três horas e meia na sala de cinema, com um intervalo, e são chamados de filmes Masala. Um termo genérico que a culinária indiana usa para denominar quando há duas ou mais ervas, formando um tempero. Os filmes Masala são chamados assim por causa desse mix de gêneros. Nos dois filmes podemos observar também uma mistura de tudo, um pouco de música, um pouco de drama, um pouco de comédia, um pouco de aventura. Dessa forma os filmes têm mais chances de agradar um número maior de pessoas.
Nas atuações é perceptível, nas partes musicais um tom teatral através da atuação. Além do uso contínuo dos mesmos atores em papéis parecidos ou idênticos em outros filmes do mesmo gênero. Em Aviso aos navegantes não foi diferente, podemos ver o Oscarito e Grande Otelo trazem o alívio cômico, já que são figuras humorísticas das chanchadas. Fugindo da realidade com seu humor, trazendo a ideia de afastamento do real, se tornando caricato, as chanchadas criaram seu jeito de conquistar o público.
O tipo de humor ingênuo e às vezes malicioso de ambos os filmes, com problemas de cotidiano (uma comédia de costumes) também são muito semelhantes, além da linguagem de fácil compreensão que é uma característica dos filmes de massa.

 

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Imagem de cena de humor do filme Aviso aos navegantes, 1950 – Watson Macedo

 

 

 

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Imagem de cena de humor do filme Salaam-E-Ishq, 2007 – Nikkhil Advani

 

 

 

Se a indústria de produção em grande escala das chanchadas chegou ao fim no Brasil nos anos 60, em 90 Bollywood se consolida como indústria cinematográfica e a Índia começa sua reforma econômica, o governo começa a colaborar no financiamento dos filmes, a classe média começa a ascender e os filmes ganham um rumo mais próximo do cinema bollywoodiano que conhecemos hoje, com suas danças, músicas, enredos de amor, aventura e heroísmo. É bom lembrar que Bollywood produz apenas um quarto dos quase mil filmes realizados anualmente no país, as indústrias cinematográficas do sul da índia respondem por 75% dos faturamentos atualmente. Bollywood continua sendo a maior exportadora de filmes, porém está longe de representar o cinema indiano como um todo.
A Índia já ultrapassou Hollywood em suas produções cinematográficas, tornando-se a maior potência de produção de filmes do mundo. Os filmes indianos ganham força dentro da Índia com os espectadores nacionalistas, que preferem ir ao cinema para assistir a sua realidade e não se interessar primordialmente pela cultura estrangeira. Alguns roteiros ainda são comprados de Hollywood para fazer adaptações para sua própria realidade. Em 2013 o centenário desse cinema chegou com orgulho, não foi à toa que suas produções deram uma bombada, estas obras começaram a debater causas sociais como: divisão de castas, que ainda é muito presente, participação LGBT ganha espaço, e as mulheres ganham força.
Com esse conjunto de ideias, muita história, um público nacionalista e muito fiel o cinema indiano conquistou um belo lugar sob o sol e hoje, a indústria cinematográfica da Índia se tornou uma indústria que se autossustenta. Poucas indústrias têm esse poder, infelizmente ao contrário da chanchada, que teve seu fim nos anos sessenta. Mesmo esta palavra não denominando o cinema brasileiro da atualidade que é muito diverso, vê-se que o que mais faz sucesso entre o público brasileiro é a comédia e estas também tem um “q” de que drama e a mistura de outros gêneros, apagou-se um pouco a musicalidade mas vemos claramente que este gênero atual bebeu muito da fonte da chanchada arrastando milhões de brasileiros para assistir Os trapalhões (anos 90), Xuxa Requebra (1999), Xuxa Popstar (2000), Xuxa e os duendes (2001), Um show de verão (2004) e até mesmo Minha mãe é uma peça (2013).
Por fim, podemos concluir que as “porcarias” tem seu valor histórico e cultural dentro da arte cinematográfica de seus respectivos países. Se olharmos para o cinema brasileiro como uma forma de “resistência”, que sempre lutou para existir no meio de uma invasão de filmes estrangeiros e a própria Chanchada, chegou a usar isso muitas vezes como forma de paródia, para se manter viva dentro das salas de cinema nacional. Podemos então ver o cinema indiano como algo que “resistiu” ao estrangeiro, se adaptando de alguma forma ao que vinha de fora do país.  

REFERÊNCIAS:
ARAUJO, T. R. História Do Cinema Indiano. Google Books. Disponível em: <https://books.google.com.br/books/about/Hist%C3%B3ria_Do_Cinema_Indiano.html?id=2uT0DwAAQBAJ&printsec=frontcover&source=kp_read_button&redir_esc=y#v=onepage&q&f=false>. Acesso em: 5 Mar. 2021.
KEMP, P.; FRAYLING, S. C. Tudo Sobre Cinema. LOCAL DE PUBLICAÇÃO: Sextante, 2011. NÚMERO DE PÁGINAS p 576.
KREUTZ, K. Bollywood: A Hollywood Indiana. Academia Internacional de Cinema (AIC) | Cursos de Cinema. Disponível em: <https://www.aicinema.com.br/bollywood-a-hollywood-indiana/>. Acesso em: 5 Mar. 2021.
REDAÇÃO MUNDO ESTRANHO. O que eram as chanchadas?. Super Interessante. Disponível em: <https://mundoestranho.abril.com.br/materia/o-que-eram-as-chanchadas>. Acesso em: 5 Mar. 2021.
SERVANO, M. Bollywood e seu jeito lucrativo de fazer cinema. Instituto de Cinema. Disponível em: <https://www.institutodecinema.com.br/mais/conteudo/bollywood-e-seu-jeito-lucrativo-de-fazer-cinema->. Acesso em: 5 Mar. 2021.