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A história do Brasil sob um olhar inusitado

O premiado Laurentino Gomes participa do projeto Grandes Escritores e lança o novo livro “1822” no Cine-Theatro Central

 

A grande aventura da história brasileira no século XIX será revisitada em Juiz de Fora no próximo dia 21, às 19h30, com o Cine-Theatro Central abrindo suas portas para um bate-papo com o jornalista Laurentino Gomes, autor do best seller “1808”. Com entrada gratuita mediante apresentação de convites retirados na bilheteria do teatro, o evento integra o Programa ALE Grandes Escritores e tem o apoio da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), por meio da Pró-Reitoria de Cultura (ProCult).

Em turnê para o lançamento de seu novo livro, “1822”, o escritor paranaense brinda o público com um inusitado olhar sobre uma época que acabou por definir a estrutura política e social do Brasil de hoje. A chegada da família real portuguesa ao País e a Independência proclamada por Dom Pedro I são temas da palestra baseada nos dois primeiros livros de uma trilogia histórica.

Para aguçar a curiosidade dos leitores desde já, Laurentino Gomes adianta que encerrará sua trilogia com “1889”, obra ainda em fase de concepção, com foco sobre os fatos que resultaram na proclamação da República por Dom Pedro II. O século XIX, porém, poderá ainda ser explorado pelo autor, uma vez que a Guerra do Paraguai e a escravidão são temas que o instigam a um trabalho de investigação mais detalhado, que deverá ser transformado em livros de reportagem.

 

Divisor de águas

 

A partir de sua visão jornalística da história, Laurentino Gomes abalou algumas das certezas do mercado editorial, contradizendo o mito de que o romance histórico não seria vendável no País. Premiado com o Jabuti na Categoria Livro de Reportagem e pela Academia Brasileira de Letras como melhor Ensaio, Crítica e História Literária, “1808” inaugurou uma nova corrente historiográfica no País.

Em seu primeiro livro, o jornalista detalha “como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a história de Portugal e do Brasil”. Em seu segundo trabalho, demonstra “como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram Dom Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado, e que, no entanto, deu certo”.

 

O Brasil de hoje

Em suas andanças para divulgar seus livros, Laurentino Gomes chegou a analisar o Brasil atual, declarando que “a grande novidade é o exercício continuado da prática democrática por tanto tempo: 25 anos em cinco séculos”. Provavelmente uma reflexão capaz de inspirar o autor a um novo livro, mas não de imediato, uma vez que o autor prefere se especializar no século XIX, se aprofundando naquele período, com o objetivo de fornecer respostas às pessoas que estão em busca de explicações para o Brasil atual.

O grande sucesso de seus livros talvez se justifique pelo público ávido por explicações para o atual momento político. “A minha impressão é a de que, depois do fim do regime militar, nós alimentamos algumas ilusões a respeito do Brasil, como a de que o mero exercício da democracia nos levaria ao primeiro mundo”. Certo de que o livro é um poderoso elemento transformador da sociedade, Laurentino Gomes diz que a consciência dessa importância lhe dá a exata medida da seriedade de sua missão.

“Meu sonho era que o brasileiro começasse a ter gosto pela história do Brasil”

Pela segunda vez no Cine-Theatro Central, o jornalista Laurentino Gomes traz aos leitores uma inusitada e prazerosa forma de contar a história do Brasil, aguçando o interesse dos brasileiros pela sua própria história. Com seu jeito simples e sem abandonar a visão jornalística dos fatos, ele se debruça sobre as datas fundadoras do estado brasileiro, no século XIX, para oferecer a compreensão do Brasil na atualidade.  Nesta entrevista, ele fala da importância de despertar nos jovens o interesse pela literatura e diz que se encanta com a relação visceral que é possível estabelecer com o livro. “Primeiro é preciso incutir nos adolescentes o prazer da leitura para depois levá-los a um mergulho mais profundo. Se for o contrário, a leitura vai ser associada a uma coisa desagradável, difícil de entender e atravessar”, alerta.

ProCult: Depois do sucesso de “1808” e do lançamento de “1822”, que você realiza no Cine-Theatro Central, “1889”, o livro que fecha a trilogia sobre o Brasil no século XIX, será mesmo escrito na cidade do Porto, em Portugal?

Laurentino Gomes: Preciso avaliar se isso é conveniente do ponto de vista da pesquisa, porque na hora de escrever o livro eu preciso estar perto das fontes. Por mais que eu leve a minha biblioteca para Portugal, sobre o segundo reinado e a proclamação da República, tem coisas, tem pendências que você precisa consultar de última hora. É um desejo, um sonho pessoal ir para Portugal escrever um livro, mas é preciso avaliar direitinho se isso não é uma opção temerária do ponto de vista da pesquisa. Mas acho que não, porque se eu me organizar bem, se fizer a pesquisa  direito aqui no Brasil, onde estão todos os livros e os documentos, eu consigo me isolar no Porto. Dentro de um ano e meio eu terei certeza se isso é viável ou não.

ProCult: Indo um pouco mais à frente, você pretende escrever sobre os séculos XX e XXI, até porque se trata de um período que pode ser explicado com base nos acontecimentos que inspiraram sua trilogia?

Laurentino Gomes: Acho que a minha contribuição maior é continuar pesquisando e iluminando o século XIX numa tentativa de explicar o Brasil de hoje, porque ali estão as datas fundadoras do estado brasileiro, ou seja, “1808”, quando chega a Corte ao Rio de Janeiro; “1822”, que é o Grito do Ipiranga, consequência direta da vinda de Dom João ao Brasil, e “1889”, fim do Segundo Reinado e começo da República. Acho que muito das características, a favor e contra, do Brasil de hoje, estão lá nesse período de fundação do estado brasileiro. Então, ao invés de vir para cá, e fazer um livro-reportagem sobre a atualidade, eu prefiro me especializar no século XIX, me aprofundar naquele período, numa tentativa de fornecer respostas para as pessoas que estão em busca de explicações para este Brasil atual.

Em meu próximo livro, “1889”, vou falar sobre o período da regência, sobre a Guerra do Paraguai, a abolição da escravatura e Dom Pedro II, que vai ser uma grande personagem, e, por fim, a proclamação da República. Depois, eu gostaria de fazer um livro especificamente sobre a história da escravidão no Brasil, porque tem muita novidade nas pesquisas acadêmicas que talvez merecessem ser divulgadas num livro de reportagem. E gostaria de fazer também um livro sobre a Guerra do Paraguai, porque acho que também merece uma boa reportagem em formato de livro.

ProCult: De onde vem a base de seus escritos? Você adere a alguma corrente historiográfica? Existem clássicos nacionais que ainda são referências fundamentais. É o caso de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Júnior. Como você vê sua obra em relação a esses autores referenciais?

Laurentino Gomes: Ela se soma a eles. Na verdade, o que faço é divulgar as obras desses grandes historiadores, ou seja, eu não estou reescrevendo a história do Brasil, contando uma outra história. É a  história que já estava aí, bem contada por um Oliveira Lima, por um Otávio Tarquínio de Souza, Sérgio Buarque de Holanda,  José Honório Rodrigues, Gilberto Freyre e Caio Prado Júnior. Há uma galeria enorme de excelentes historiadores que o Brasil teve até hoje, mas que, até por um problema de falta de escolaridade, o brasileiro não tinha conhecimento. O brasileiro lia muito pouco. O índice de escolaridade no Brasil era muito baixo até recentemente. Então, acho que chegou a hora de divulgar esse trabalho. O que eu faço é um trabalho jornalístico de divulgação científica na área de história do Brasil. Eu não estou nem progredindo nem trazendo elementos novos para a história, porque eu não tenho nem treinamento específico para isso. O que eu faço é divulgar o que os historiadores já descobriram nas novas interpretações que eles trouxeram à tona nessas obras de referência, obras clássicas sobre a história do Brasil.

ProCult: Você, então, estaria aguçando o interesse dos brasileiros pela sua própria história?

Laurentino Gomes: É isso mesmo. Meu sonho era que o brasileiro começasse a ter gosto pela história do Brasil, lendo o “1808”, o “1822”, de tal forma que daqui a algum tempo ele se animasse a ler um “Casa Grande & Senzala”, do Gilberto Freyre, e um “Raízes do Brasil”, do Sérgio Buarque de Holanda. Porque acho que é assim que começa, ou seja, é preciso desenvolver nas pessoas o prazer da leitura. Eu defendo, por exemplo, que crianças e adolescentes deveriam começar a ler por “Harry Potter” e não pelas obras de Machado de Assis. Primeiro, é preciso incutir neles o prazer da leitura e, depois, levá-los a um mergulho mais profundo. Porque, se for o contrário, a leitura vai ser associada a uma coisa desagradável, difícil de entender e atravessar. O mesmo acontece com a história do Brasil. Se você começar por “Raízes do Brasil” ou por “Casa Grande & Senzala”, certamente vai afugentar o leitor.

ProCult: Como é conviver com o assédio da mídia agora que você é um autor famoso? Como é sua relação com seus leitores no Brasil e lá fora? Autografar é um peso ou uma alegria?

É uma grande alegria. Eu fui jornalista de redação de jornal e revistas por mais de 30 anos e, quando se é esse tipo de jornalista, seu trabalho chega ao público em uma relação mais distante. Só depois que escrevi meus livros é que comecei a ter mais contato com os leitores, a ter uma agenda mais agitada, com palestras, aulas. É encantador saber que as pessoas têm uma paixão, uma relação tão visceral com o livro. E tiro foto de celular, autografo caderno cheio de abelhinhas. E acabo por ouvir coisas muito sérias. Às vezes dou aulas para adolescentes que vêm falar assim: “Olha, por sua causa, vou virar historiador”. Ou: “Por sua causa, vou fazer jornalismo”. O livro é um elemento muito transformador. Ele mexe na sociedade, mexe com os leitores, muda a vida das pessoas. Isso me traz a consciência de que tenho uma missão muito séria.

 

Serviço:

Palestra: Laurentino Gomes sobre o livro “1822”.

Local: Cine-Theatro Central (Praça João Pessoa, s/n), fone (32) 3215-1400.

Data: 21-10-2010, quinta-feira, às 19h30.

Entrada: Gratuita, mediante convite retirado na bilheteria do teatro.