Exposição de Yara Tupynambá, inspirada em poema de Carlos Drummond de Andrade, chega ao MAMM, dia 22
Os 340 versos da estrofe única de A mesa, de Carlos Drummond de Andrade, contam a vida familiar do poeta mineiro. Os 19 painéis que a artista Yara Tupynambá criou inspirados nessa poesia conferem cor e corpo às palavras de Drummond. Unidas, literatura e artes plásticas compõem a exposição A mesa, aberta no próximo dia 22, às 20h, na Galeria Retratos-relâmpago, no Museu de Arte Murilo Mendes (MAMM). A abertura contará com a presença de Yara Tupynambá, que ministrará, às 19h, palestra sobre sua concepção artística das imagens para a série em homenagem a Drummond. Na mesma noite, a professora de literatura da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), Márcia Marques de Morais, analisa criticamente o poema de Drummond, situando-o na linha do tempo da literatura brasileira.
O preciosismo poético de Drummond encontra um porto seguro na obra sensível de Yara Tupynambá – mineira por excelência –, que criou, sob o aval do poeta, imagens para traduzir sua história de vida. “Em 1976, fui expor no Rio uma série de arcas, pintadas com uma releitura que fiz dos desenhos decorativos de Minas do séc. XVIII, mostra esta que Drummond visitou, sem que eu o soubesse. No domingo seguinte à abertura da exposição, ao abrir o Jornal do Brasil, então o mais importante do país, encontro publicado na primeira página do caderno de cultura um poema em que ele falava de minha exposição”, relembra Yara.
Publicado como livro em 1951, o poema foi escrito em memória ao pai do autor, que completaria então 90 anos. A festa narrada no poema reúne o clã familiar. Todos estão lá: pai, mãe, irmãos, tios, amigos, primos e seus antepassados. Entre torresmo, farofa e cachaça, os 14 filhos de Carlos de Paula Andrade e Julieta Augusta Drummond de Andrade se reúnem em torno do móvel de madeira mais de lei que qualquer lei da república.
De acordo com Ozório Couto, coautor, ao lado de Yara Tupynambá, do livro A mesa de Carlos Drummond de Andrade, o que não falta a esta obra do poeta mineiro é musicalidade. “Muita coisa no poema encontra-se escondida, mas clara nas entrelinhas e na poesia penetrante do seu português e da sua criatividade plena. Percebe-se que há no poema uma ponta de vaidade, somada à criativa percepção de seu pensamento.”
Criadas entre 1981 e 1987 em carvão sobre papel preparado e colado no eucatex, cada obra mede 1,5 x 1,0m. De posse de fotografias antigas do autor, Yara produziu 19 grandes quadros que, juntos, dão forma a um painel que personifica a ficção drummondiana e que hoje pertencem à Fundação Cultural de Itabira, cidade onde residem as memórias de Drummond. Em carta a Yara, Drummond escreve, em 4 de dezembro de 1982, que a artista captou muito bem a essência de sua obra. “Esplêndido, cheio de finas percepções, assimilando o espírito de tempos passados, tão fundamente mineiro, tão integrado no mistério das famílias e das almas!”
Linha a linha, descobrimos não somente a família de Drummond, mas o próprio retrato da mineiridade: referências a Minas Gerais que Yara transpôs para sua obra, como a mesa farta, a religiosidade, a casa, as tradições e, enfim, as cores. Essencialmente voltadas para a terra, para o minério e para o ouro, as cores sintetizam a materialidade da obra de Drummond. “O poeta acompanhou meu trabalho até o 4º módulo, através das fotos que lhe mandava, quando então faleceu. Continuei o que vinha fazendo e, mais tarde, já pronto, viajei com o projeto por oito cidades”, afirma Yara.