Fechar menu lateral

Riscos de cores e sensações em leitura contemporânea

MAMM abre no dia 24, às 20h, exposição Réquiem 22, que homenageia a Semana de Arte Moderna de 1922

 

“Eu tinha 13 anos, e sofria porque não sabia que rumo tomar na vida. Nada ainda me revelara o fundo da minha sensibilidade […]. Um dia saí de casa, amarrei fortemente as minhas tranças de menina, deitei-me debaixo dos dormentes e esperei o trem passar por cima de mim. […] E eu via cores, cores e cores riscando o espaço, cores que eu desejaria fixar para sempre na retina assombrada”. Assim descreveu a artista plástica Anita Malfatti ao jornalista e crítico de arte Luis Martins, em 1939, sobre o acontecimento que a fez escolher a pintura como profissão. Passados 20 anos de sua decisão, Anita se tornaria um dos principais nomes da Semana de Arte Moderna de 1922, a qual propunha uma renovação de linguagem da pintura, da escultura, da poesia, da literatura e da música. Reverenciando o evento, que marcou a história das artes no país, o Museu de Arte Murilo Mendes (MAMM) inaugura, no próximo dia 24, às 20h, na Galeria Poliedro, a exposição Réquiem 22, elaborada de modo colaborativo pela artista Valéria Faria, pela produtora visual Daniela Brito e pela fotógrafa Gleice Lisboa.

A exposição apresenta uma série de 12 retratos alegóricos, concebidos de modo teatral, nos quais uma personagem incorpora, em livres releituras, algumas das mais importantes pinturas realizadas por Anita Malfatti e Di Cavalcanti, dois dos maiores expoentes da Semana de 22. Entre as imagens homenageadas estão O homem de sete cores e A mulher do cabelo verde, de Anita Malfatti, e Arlequim e As mulatas, de Di Cavalcanti. Segundo Valéria Faria, a concepção das imagens não se pautou apenas na construção formal das pinturas, mas, sobretudo, no conteúdo provocativo das imagens. “Uma das fotos diz respeito ao episódio da biografia de Anita, em que ela se deita sob os dormentes de uma linha de trem”, comenta a artista, referindo-se à experiência almejada por Anita.

 

Sob a luz do contemporâneo

Um dos motivos pelos quais as pinturas da Semana de 22 causaram uma revolução nas artes plásticas foi pelo uso intenso de cores e pelas fortes pinceladas. Assim, Valéria Faria e Daniela Brito foram em busca de materiais, entre tecidos e maquiagens, a fim de criar combinações de cores e texturas com a mesma intenção de causar impactos visuais. “Na fotografia que faz referência ao quadro O homem das sete cores, não achávamos perucas masculinas para a Valéria usar. Tivemos que desenhar um penteado a partir de uma peruca feminina e trabalhamos também com pintura facial. Tudo o que utilizamos sofreu transformações de alguma forma, nada foi colocado do modo como comprado”, descreve Daniela. Com o objetivo de tornar reais os personagens criados, a fotógrafa Gleice Lisboa optou pela iluminação natural. “Tiramos os personagens dos quadros e os trouxemos para a realidade, os tornamos vivos”, comenta Gleice, enfatizando a ausência de manipulação digital nos trabalhos.

Colocando-se à prova, Valéria teve de escurecer a pele e testar posições que simulassem uma cena natural para homenagear o quadro As mulatas. “Sempre gostei de retratos, mas nunca tinha trabalhado como objeto retratado. Se a Semana de Arte Moderna trouxe uma busca pela experimentação, resolvi também experimentar e me inserir no contexto das imagens”, comenta a artista. Desse modo, a exposição Réquiem 22 faz-se como uma oração de homenagem a esses dois vultos da Semana de 22. “Eles muito contribuíram para a ampliação da percepção e do fazer artístico no Brasil, bem como para formação de uma distinta cultura nacional”, conclui Valéria.