‘Raízes para o Futuro’ visa o reflorestamento da Mata Atlântica em 23 hectares no entorno da represa de Chapéu D’Uvas (Foto: Leandro Mockdece)

Desde a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, em 1972, já se passaram seis décadas de ação ambiental. Apesar dos avanços na área, muitos desafios de conscientização sobre preservação dos recursos naturais persistem. Com a temática “Uma Só Terra”, o foco do Dia Mundial do Meio Ambiente em 2022, comemorado em 5 de junho, é “vida sustentável em harmonia com a natureza”. 

A contribuição das florestas para o planeta é incalculável, os benefícios mais citados são a regulação do clima, o equilíbrio ecológico, a preservação das nascentes e o abastecimento de reservas subterrâneas. A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) é uma das instituições pioneiras no reflorestamento da Mata Atlântica. Em março deste ano, foram plantadas 40 mil mudas em uma área de 23 hectares na Fazenda Experimental da Universidade, localizada no entorno da represa de Chapéu D’ Uvas. 

Protagonizada pelo projeto Raízes para o Futuro, a iniciativa é desenvolvida pelo Núcleo de Integração Acadêmica para Sustentabilidade Socioambiental (Niassa), em parceria com a concessionária Via 040 e o projeto BEF-Atlantic. À frente desde 2012, quando foi adquirida, o professor do Instituto de Ciências Biológicas (ICB), Fábio Roland, considera que durante esses 10 anos, além da preparação do terreno, inclusive no sentido literal, houve muito investimento nos aspectos acadêmico e científico. 

A Fazenda é um espaço de integração acadêmica para a sustentabilidade socioambiental. A Mata Atlântica é um hotspot mundial de alta diversidade biológica, não apenas pela riqueza de espécies como também pelas conectividades entre a fauna e a flora”, reflete. Os hotspots representam as áreas naturais do planeta que possuem grande diversidade ecológica e que estão em risco de extinção, sendo prioridade em níveis mundiais. 

Para Fábio Roland, a água é um dos bens da Fazenda Experimental, com a capacidade de regular o clima, atuar como depositário de biodiversidade e ainda gerar lazer e exploração imobiliária (Foto: Carolina de Paula)

“Cada vez que a gente conversa com algum pesquisador, o sentimento é de empolgação. A gente precisa de mais pessoas trabalhando em prol para criar uma comunidade autossustentável” (Fábio Roland)

“Nenhuma organização tem tantas mentes, de múltiplas áreas. A Universidade é criadora de conceitos e ideias transformadoras capazes de fazer o equipamento funcionar para integrar a área da Fazenda, reconstruir a paisagem e resgatar os valores ambientais, históricos, culturais e sociais. Vislumbro, por exemplo, a implantação de um museu mostrando a história da Fazenda, hortas comunitárias para produção de alimentos e ervas medicinais, ou uma composteira para tratar os resíduos orgânicos produzidos no Restaurante Universitário”, aponta. Em sua opinião, a ideia tem que ser colegiada, é um movimento plural de toda a Instituição: “cada vez que a gente conversa com algum pesquisador, o sentimento é de empolgação. A gente precisa de mais pessoas trabalhando em prol para criar uma comunidade autossustentável”. 

Ciência de impacto

Vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Natureza, o professor Nathan Barros orienta diversos trabalhos desenvolvidos na Fazenda. “Em um deles estamos avaliando o efeito de reflorestamento no aumento da recarga hídrica na área; em outras palavras, investigar qual é o efeito do plantio no aumento da reserva de água no solo e por consequência no reservatório”, menciona.

“A iniciativa possui um papel chave para o entendimento dos efeitos práticos da restauração. Ter a possibilidade de utilizar o Niassa para as pesquisas de restauração é algo raro, a comunidade da UFJF tem que se orgulhar muito disso. No futuro, esse equipamento será ainda mais agregador de cientistas, professores, estudantes e técnicos em prol da sustentabilidade. Trabalhamos para que o Niassa seja referência mundial como sustentabilidade e restauração ambiental”, defende Barros. 

“São ações pontuais de reflorestamento que vão somar no todo para que tenhamos uma efetiva restauração dos ecossistemas florestais na paisagem”, frisa Fabrício Carvalho (Foto: Reprodução)

Esse entusiasmo é também compartilhado pelo professor do ICB Fabrício Carvalho que afirma desconhecer uma unidade experimental com o escopo que o Niassa tem em termos de inserção socioambiental e aplicabilidade para educação, inclusive para a população do entorno. Em referência às metas que o Brasil se prontificou a cumprir, relativas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), o pesquisador comenta que o Niassa tem ampla aderência e atua em praticamente todos os objetivos. “Estamos numa escala local atendendo um acordo global de crescimento ambientalmente sustentável e socialmente justo.” 

O docente informa que o Niassa teve quatro projetos de financiamento aprovados em 2021, sendo três pela Fapemig e um pelo CNPq, que juntos somam cerca de R$ 550 mil para a execução das pesquisas de campo. Eles aguardam resultado de outras duas propostas submetidas à Finep e à Capes, além de estarem desenvolvendo dois projetos de financiamento bilaterais Brasil-Alemanha para financiar o intercâmbio de estudantes. 

Experiência com a terra

Doutoranda do PPG em Biodiversidade, a bióloga Lorena Fernandes participou ativamente do plantio de mudas na Fazenda, tendo atuado no processo de planejamento, na escolha das espécies e no gerenciamento das atividades de campo. Em função da participação em redes de colaboração internacional, com pesquisadores de diversos países, ela considera que o BEF-Atlantic representa oportunidade de aprendizado pessoal e acadêmico. 

“Em nossa equipe temos pesquisadores, alunos e professores, todos engajados e trabalhando juntos na execução de um projeto dessa magnitude. Ver a iniciativa promovendo diálogos, interação entre gerações, superação de desafios, culminando na ação concreta, serve de inspiração para todos os envolvidos”, compartilha.

O projeto de pesquisa de Lorena é avaliar o papel da diversidade de espécies arbóreas na produtividade de uma floresta em restauração

“Por si só a experiência de plantar milhares de mudas é enriquecedora”, assegura Lorena Fernandes (Foto: Carolina de Paula)

Sob a orientação de André Amado, o projeto de pesquisa de Lorena é avaliar o papel da diversidade de espécies arbóreas na produtividade de uma floresta em restauração. “No estudo, estamos testando a hipótese de que quanto maior a diversidade das espécies utilizadas no plantio, maior será a produtividade da comunidade restaurada.” A doutoranda  conta que serão monitorados o diâmetro do caule, a altura e a sobrevivência das mudas para “entender melhor como comunidades com diferentes composições afetam o crescimento e a produtividade das árvores”.

Internacionalização 

Planejado há cerca de três anos, o BEF-Atlantic consolida parceria internacional com a Universidade Técnica de Munique (TUM), da Alemanha, de restauração florestal por cinco anos, com possibilidade de renovação por igual período. Na visão do professor da TUM, Leonardo Teixeira, esse contato inicial foi motivado por ter tido experiências prévias com o design e implementação de projetos desse tipo, uma vez que concluiu o doutorado em Ecologia trabalhando com restauração florestal. 

Além da colaboração internacional em iniciativas de pesquisa, a parceria oficial entre a Universidade Técnica de Munique e a UFJF permite a realização de cursos em conjunto, além do intercâmbio de estudantes e pesquisadores entre Brasil e Alemanha. “Devido ao grande apelo da Mata Atlântica como um hotspot de biodiversidade, há uma possibilidade real de atração de investimentos internacionais que pode facilitar o estabelecimento de pesquisas científicas de longa duração com grande potencial para gerar resultados de impacto”, frisa Teixeira. 

O Niassa vai colocar a UFJF como uma das universidades brasileiras a liderar o desenvolvimento de tecnologias e soluções baseadas na natureza (Leonardo Teixeira)

Percebemos que o Niassa vai colocar a UFJF como uma das universidades brasileiras a liderar o desenvolvimento de tecnologias e soluções baseadas na natureza (do termo em inglês Nature-based solutions)”, afirma o pesquisador que faz parte da Cátedra de Ecologia da Restauração. Atualmente, são desenvolvidas pesquisas em muitas vertentes, como manejo e restauração florestal e de outros ecossistemas terrestres; conservação da biodiversidade; mudanças climáticas; uso sustentável da água e outros recursos naturais; energias renováveis; efeitos da biodiversidade no funcionamento de ecossistemas; bioeconomia; ecologia urbana. 

Educação ambiental à vista

Para o professor André Amado, as oportunidades de extensão e difusão científica que o Niassa apresenta são diretamente aplicáveis às necessidades ambientais da região da Zona da Mata Mineira. Já estão realizando difusão científica junto à sociedade de pesquisas e processos de restauração florestal em andamento na Fazenda. 

“Desde novembro de 2021 fizemos postagens sistemáticas nas redes sociais do Niassa e do projeto BEF-Atlantic, com grande visibilidade entre a comunidade acadêmica da UFJF, de outras universidades no Brasil e no exterior e, com boa inserção da comunidade local. As pessoas que frequentam a região no dia a dia ou nos finais de semana já estão tomando conhecimento das ações de recuperação ambiental realizadas por ali”, relata. 

André Amado espera ver a Fazenda pulsando de vida: “fauna, flora e água se restabelecendo, pessoas trabalhando e estudando, e uma comunidade envolvida e atuante” (Foto: Reprodução)

A proposta é atuar, em um segundo momento, mais diretamente com atividades de formação de pessoal e subsídio a novas ações de restauração da Mata Atlântica. “Estamos planejando cursos de capacitação para atuação na produção de mudas nativas de Mata Atlântica, cursos de capacitação para a restauração de áreas de preservação permanente (APP) das propriedades privadas do entorno de Chapéu D’uvas e, possivelmente, o fornecimento de mudas nativas para essa finalidade.”

O docente reforça que a educação ambiental e a educação científica são fundamentais para a nossa sociedade, no sentido de formar pessoas com senso crítico sob vários aspectos e também do ponto de vista ambiental. Uma possibilidade de parceria é com o Corpo de Bombeiros, visando a oferta de capacitações para a população de técnicas de manejo e restauração, por exemplo. A ideia é atuar em duas frentes com a educação ambiental: uma voltada para o público adulto e outra específica com crianças por meio da atuação junto às escolas da região e de Juiz de Fora. 

A expectativa é que, em alguns anos, áreas importantes de recarga hídrica para o reservatório sejam restabelecidas. Em paralelo, está sendo produzido um Atlas da bacia da represa, contando o histórico de uso e ocupação do solo da região. “Com o projeto, estamos capacitando pessoas e estudos como esse, quando integrados a outros realizados em várias partes do mundo, geram informação e transferência de conhecimento para tomadas de ação política e de gestão florestal”, enfatiza a pós-graduanda Lorena Fernandes. 

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU

A Coordenação de Divulgação Científica da Diretoria de Imagem Institucional, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), está promovendo uma estratégia de fortalecimento das ações de pesquisa da Universidade, mostrando que estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. 

As pesquisas ligadas à Fazenda Experimental da UFJF estão alinhadas a diferentes objetivos, sobretudo aos ODS 6 (Água Potável e Saneamento), 13 (Ação contra a Mudança Global do Clima), 15 (Vida Terrestre) e 17 (Parcerias e Meios de Implementação). O professor Fabrício Carvalho lembra que o reflorestamento ambiental traz impactos positivos em praticamente todas as áreas, não se limitando a esses objetivos. 

 

Outras informações:

https://www.ufjf.br/niassa/ | e-mail: coord.niassa@ufjf.edu.br

BEF-Atlantic | @bef.atlantic

Relembre: 
Raízes para o futuro: 40 mil mudas são plantadas na Fazenda Experimental da UFJF