O Laboratório Afrikas de Audiovisual (LabAfrikas) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) realiza nesta sexta-feira, 5, às 18h, mais uma transmissão ao vivo nas redes sociais. Na atividade, que integra o conjunto de ações para divulgação da websérie “Reflexo Reverso”,  serão debatidos os referenciais teóricos e estéticos adotados na produção.  A live contará com tradução para Língua Brasileira de Sinais (Libras).

O LabAfrikas  é interdisciplinar, e conta com graduandos dos bacharelados em Ciências Sociais, História, Jornalismo, Rádio, TV e Internet, Artes e Design e Cinema. Tem ainda a colaboração de uma mestranda em História. Sob coordenação da professora de História da África da UFJF, Fernanda Thomaz, o grupo dedica-se aos estudos das africanidades, das relações raciais e do racismo. 

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Reflexo Reverso: o outro em branco

O primeiro episódio da websérie “Reflexo Reverso” foi lançado em 22 de maio, e já teve mais de 1300 visualizações. “O outro em branco” tem como temática a branquitude, a pertença étnico-racial atribuída às pessoas brancas.  o objetivo da iniciativa, que conjuga ensino, pesquisa e extensão, é disseminar o conhecimento acadêmico em linguagem mais acessível para todos os públicos. 

“A escolha do primeiro tema foi um ponto fundamental. Não temos como pensar a sociedade sem fazer o debate da branquitude. Por outro lado, esse projeto é elaborado dentro da Universidade, que ainda é um espaço extremamente branco, no qual a performance da branquitude é constantemente reproduzida.  Então, tentamos desconstruir isso”, explica a professora Fernanda Thomaz.

“Não temos como pensar a sociedade sem fazer o debate da branquitude” – Professora Fernanda Thomaz

Em virtude da pandemia provocada pelo novo coronavírus,  o lançamento da websérie foi exclusivamente virtual. No entanto, de acordo com a docente, a intenção é que sejam lançados periodicamente conteúdos em audiovisual e, em seguida, realizados debates nas escolas públicas de níveis médio e fundamental de Juiz de Fora. 

Dentre os referenciais teóricos utilizados para a elaboração da websérie estão as obras de W.E.B Du Bois, Frantz Fanon, Guerreiro Ramos,  Grada Kilomba e Lia Vainer Schucman.

Frantz Fanon

“Fanon, como psiquiatra e filósofo, traz um ponto de vista único sobre a colonização e suas consequências. Ele compreende como a dimensão psicológica dos sujeitos criados pelo mundo colonizado rompe com o individual e se lança para a dimensão coletiva. Longe de ser uma questão puramente subjetiva, os impactos subjetivos da divisão racializada e dualista do mundo colonial se transformam em formas concretas de moldar tanto os sujeitos quanto o próprio funcionamento das sociedades colonizadas”, explica a estudante do bacharelado em Ciências Sociais da UFJF e integrante do LabAfrikas, Ana Emília Carvalho.

Guerreiro Ramos

A avaliação é compartilhada pela mestranda em História na UFJF e integrante do LabAfrikas, Estela Gonçalves. A pós-graduanda acrescenta como o estudo da obra do sociólogo brasileiro Guerreiro Ramos também contribuiu para a elaboração do episódio “O outro em branco”.

“Foi importante no sentido de refletirmos sobre o modo que a branquitude é construída e pensada como local de privilégio. Guerreiro Ramos, ao expor em seu texto como é patológico se afirmar enquanto branco na sociedade brasileira, demonstra o quanto pessoas que não estão inseridas na lógica de privilégios tentam se sentir integradas e pertencentes a um grupo que não é visto com estigmas negativos. Desse modo, ao tornar o negro tema central de discussões de valores, principalmente estéticos, evita-se o questionamento, além de não colocar em xeque os privilégios adquiridos com a afirmação da branquitude”, avalia. 

Lia Schucman

As pesquisas de Lia Vainer Schucman, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) também fundamentam a produção do LabAfrikas, conforme aponta um dos integrantes do grupo e graduando em História na UFJF, Vinícius Oliveira.

“Apesar de ter sido publicada em 2012,  o livro ‘Entre o encardido, o branco e o branquíssimo’, de Lia Schucman, nos apresenta um retrato até de certa forma cruel da realidade brasileira atualmente. Em seu estudo, ela faz uma retomada do conceito de raça produzido dentro das academias europeias no século XIX para compreendermos que, em sociedades estruturadas a partir do racismo, os sujeitos brancos adquirem privilégios simbólicos e materiais”, aponta.

Grada Kilomba

Para a graduanda em Cinema e Audiovisual na UFJF e integrante do LabAfrikas, Renata Dorea, outro referencial teórico fundamental para elaboração de “O outro em branco” foi o livro Memórias da Plantação, de Grada Kilomba,  pesquisadora, escritora, psicóloga e artista interdisciplinar portuguesa.  

“Essa leitura foi muito importante para refletirmos o que seria e quem seria o outro. Assumir a existência de uma branquitude é assumir os privilégios de um pacto narcísico, deslocando esse sujeito antes universal para o lugar de racializado. Desmascarando o sujeito branco universal como reflexo obrigatório e inconsciente da humanidade. Grada, tal como Fanon, aborda temas da Psicologia e o audiovisual é uma importante ferramenta para descolonizar o imaginário coletivo, que perpetua o racismo estrutural”, ressalta.

Conhecimentos etnicamente diversos

O estudante de Jornalismo da UFJF e integrante do LabAfrikas, Gustavo Luiz Ribeiro, ressalta que matrizes do conhecimento científico ainda pouco abordadas podem potencializar reflexões acerca da comunicação no século XXI. “A participação no LabAfrikas me fez compreender que a comunicação é uma ciência do tempo. Além de ter a limitação linear do tempo, ainda há temporalidades para falar, agir, pensar, descansar, da forma mais adequada para cada meio, sem desconsiderar a potência do outro. Assim, cada palavra do roteiro deste projeto, que foi articulada e revisada por realidades negras científicas diversas, em temporalidades diferentes, é pensada para criar incômodos e possibilidades intertextuais entre referenciais de negritudes e branquitudes. Isso é comunicar.”

“Cada palavra deste roteiro é pensada para criar incômodos e possibilidades intertextuais entre referenciais de negritudes e branquitudes” – Gustavo Rbeiro

A edição de texto e imagens do episódio  “O outro em branco” também foi uma experiência partilhada e coletiva, conforme salienta a estudante de Rádio, TV e Internet da UFJF e integrante do LabAfrikas, Ana Júlia Silvino. “Usamos elementos midiáticos e artísticos que, historicamente, estabeleceram o lugar da branquitude e dos negros na nossa sociedade. Usamos filmes como ‘O Nascimento de uma Nação’, de D. W. Griffith. Esse longa criou estereótipos racistas acerca da população negra, e é tratado, na universidade, apenas como um clássico do cinema, sem ser questionado em nenhum momento. Questionamos também obras de artistas renomados, como Jean-Baptiste Debret e Modesto Brocos, diversas propagandas que reproduzem a lógica racista, e pinturas clássicas que estabelecem o lugar da branquitude como bela, angelical e detentora de todos os saberes”, conclui.

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