Assunto continuará a ser discutido no Conselho Superior (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

Assunto continuará a ser discutido no Conselho Superior (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

Em reunião com a comunidade acadêmica, representantes da Administração Superior da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) prestaram esclarecimentos sobre o programa Future-se. No encontro, decidiu-se pela continuação das discussões sobre o programa no Conselho Superior (Consu) e que a Instituição só terá um posicionamento oficial sobre o Future-se, após a aprovação ou desaprovação da matéria no Congresso Nacional. Porém, o reitor da UFJF, Marcus David, afirmou que a Universidade não abrirá mão da autonomia própria, do financiamento público e do caráter de instituição de Estado com função social. O evento ocorreu nesta sexta-feira, 23, no Anfiteatro de Estudos Sociais, da Faculdade de Direito.

O reitor da UFJF, Marcus Vinicius David, explicou como o programa foi apresentado aos reitores das 68 universidades federais, mas destacou a não participação dos mesmos na estruturação da proposta. “No meu conhecimento, 11 universidades já manifestaram rejeição ao programa. Percebemos ameaças aos princípios que norteiam as instituições. A discussão do financiamento, por meio dos fundos extras, só viabiliza projetos rentáveis, sendo que este é apenas um dos eixos das instituições federais. A universidade precisa cumprir outras funções que não encontram fundamento nessa lógica. Além disso, o projeto tem muitos erros técnicos.”

David acredita que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, apresenta o projeto, acreditando que as Universidades são sistemas malsucedidos. “O nosso sistema não é falido. Possui as melhores formações de graduação do país, tem destaque nas pesquisas, inovação, extensão e cultura. Independente de qual for o posicionamento do Congresso Nacional, não abriremos mão da nossa autonomia, do financiamento público e do caráter de instituição de Estado com função social. Pedimos a todos que levem essa discussão às unidades acadêmicas e administrativas da UFJF”, disse aos presentes no debate.

Governança e orçamento

"Uma das grandes dúvidas é a ausência da definição das pessoas que compõem o comitê gestor", considera Condé (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

“Uma das grandes dúvidas é a ausência da definição das pessoas que compõem o comitê gestor”, considera Condé (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

O pró-reitor de Planejamento (Proplan), Eduardo Condé, fez uma apresentação da lógica do Future-se sobre os tópicos que traçam a governança universitária e os elementos gerais estruturantes. Tratou sobre a operacionalização dos contratos de gestão a serem firmados pela União juntos as universidades federais, sendo geridos por organizações sociais, as quais teriam poder de intercessão nos campos de ensino, pesquisa, extensão e atividades culturais. “Se esses contratos tiverem metas estipuladas, elas serão passadas para o controle externo, reduzindo a  discricionariedade de gestão e a autonomia da universidade.”

Condé apontou as incertezas sobre a forma como o fundo financeiro será construído e gerido, considerando que as universidades federais estarão submetidas a comercialização, alienação de bens e direitos, exploração do direito de propriedade intelectual e da cobrança de matrículas e mensalidades na pós-graduação. “Uma das grandes dúvidas é a ausência da definição das pessoas que compõem o comitê gestor. Não está claro o quanto a nossa autonomia será perdida. O comitê definirá como os recursos serão usados, podendo haver  investimentos no mercado financeiro, que não seguros.”

Na visão de Condé, a adesão ao Future-se faz com que a autonomia universitária seja pequena e não há certezas de como a manutenção dos recursos será mantida. “O projeto não deixa claras as estratégias a serem utilizadas. Sabemos que haverá mudanças em 17 leis. Não sabemos se os institutos federais deixarão de ser autárquicos, como ficarão as contratações de técnico-administrativos em educação (Taes), de docentes e a utilização dos mesmos. Se aceitarmos participar do programa, perderemos a autonomia universitária e teremos incertezas para o futuro.”

Política de inovação 

"Sem financiamento público não há inovação, pois gera incertezas e riscos", acredita Delgado (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

“Sem financiamento público não há inovação, pois gera incertezas e riscos”, acredita Delgado (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

Trazendo um ponto de vista sobre as propostas do programa para os campos das ciências, tecnologia e inovação, o diretor de Inovação, Ignácio Delgado, explicou que nas propagandas do governo, o Future-se, apresenta-se como algo dinamizado, mas, na verdade, não traz inovação tecnológica. As propostas novas dificultariam o desenvolvimento de inovação na universidade.

O diretor fez um apanhado histórico sobre a aproximação da Universidade com as empresas privadas, abordou o Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação e o sucesso brasileiro na produção de tecnologia desde o surgimento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Cnpq). “É preciso que os setores se aproximem em busca de gerar desenvolvimento. Porém, é uma ignorância acreditar que a maioria dos investimentos, sendo realizados pelo meio empresarial, trarão resultados de sucesso. Nos Estados Unidos, 60% do investimento é governamental. Sem financiamento público não há inovação, pois gera incertezas e riscos.” 

Na percepção de Delgado, o programa não apresenta instrumento de estímulo à inovação que já não esteja garantido no Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. “Ao contrário foi apresentado de forma avoada e sem envolvimento com a comunidade acadêmica e científica. Não favorece e estimula a aproximação entre universidades e empresas para o bem estar do povo e do desenvolvimento nacional.”

Internacionalização

"O que nos foi apresentado é uma carta de intenções, onde não há nada de concreto", avalia Bárbara (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

“O que nos foi apresentado é uma carta de intenções, onde não há nada de concreto”, avalia Bárbara (Foto: Gustavo Tempone/UFJF)

No eixo sobre internacionalização, a diretora de Relações Internacionais, Bárbara Daibert, afirma que o Future-se tem desconhecimento das práticas desenvolvidas pelas universidades relacionada ao tema. Além disso, apresenta falta de consideração com os planos de internacionalização em funcionamento, problemas conceituais graves, falta de soluções práticas e ameaça à autonomia universitária.

Durante a apresentação dos artigos 20 e 21 do programa, Bárbara, relatou a inconstância em diversos pontos, entre eles, a aproximação de cursos particulares de aprendizado de línguas estrangeiras para fomentar a produção intelectual internacional, a vinda de professores estrangeiros renomados para as universidades brasileiras e a oferta de bolsas de intercâmbios para estudantes com alto desempenho acadêmico e/ou atlético. “Nas universidades federais, temos os melhores linguistas e professores. Na UFJF, os alunos conseguem bolsas para intercâmbio por meio do mérito acadêmico e das condições socioeconômicas. Além disso, só em julho, a instituição recebeu 29 professores de outros países. O que falta para nossa melhor internacionalização são investimentos.”

Bárbara finaliza fazendo uma interpretação sobre o Future-se. “O que nos foi apresentado é uma carta de intenções, onde não há nada de concreto. Além de desconsiderar tudo o que é feito pelas Universidades, há graves problemas conceituais e ameaça a perda da autonomia universitária.”

Future-se 

De acordo com o MEC, o programa foi lançado para promover maior autonomia financeira nas universidades e institutos federais por meio de incentivo à captação de recursos próprios e ao empreendedorismo. A adesão ao Future-se é voluntária e, segundo o Ministério, a União manterá os recursos destinados às instituições, sendo os recursos adquiridos serão considerados rendas extras para as instituições.