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Relato de experiência internacional

Giovanna apresentando sua pesquisa. VU Amsterdam, novembro de 2022. Acervo pessoal da pesquisadora

 Giovanna Sarto – VU-Amsterdam/PThU: Bridging Gaps 2022

Em agosto de 2022, iniciei uma jornada de três meses que significou a experiência mais intensa de toda a minha vida. Graças à formação sólida, pública e gratuita que tenho recebido da Universidade Federal de Juiz de Fora desde 2016, em especial do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião (PPCIR), e do apoio do meu orientador, prof. André Sidnei Musskopf, fui selecionada para representar o Brasil no Bridging Gaps Programme, uma parceria da Vrije Universiteit Amsterdam com a Protestantse Theologische Universiteit. O Bridging Gaps é um programa cuja proposta reúne pesquisadoras e pesquisadores envolvidos com temáticas que envolvem ofenômeno religioso, sobretudo de países emergentes. Essa experiência foi, para mim, uma experiência que exigiu que eu me desfizesse de todos os meus preconceitos, medos e inseguranças, e aprendesse a, de fato, vivenciar uma abordagem metodológica sobre religião de forma sincera e profunda. Sincera porque ali, na minha nudez epistemológica, aprendi a valorizar a beleza da simplicidade, aprendi que cada contexto é único e que, quando reconhecemos nossos lugares de poder e nossa alteridade, encontramos formas de construir uma pesquisa de maior rigor, diálogo, responsabilidade e compromisso social.
Após meu retorno, fui convidada pela Faculdade Unida de Vitória a compartilhar com os estudantes a minha experiência tanto de pesquisa interna no PPCIR e na UFJF, quanto também do recente contato com o Bridging Gaps. Além disso, memantive (e tenho me mantido) em contato com colegas de universidades de diferentes partes do mundo – como a professora que me supervisionou durante esses três meses em intercâmbio, profa. Charlene Van der Walt (Universidade de Kwazulu-Natal), colegas da King’s Cross, no Reino Unido, da Universidade de Cape Town, na África do Sul, e do próprio PThU, na Holanda.

Giovanna apresentando sua pesquisa. VU Amsterdam, novembro de 2022. Acervo pessoal da pesquisadora

Acredito que toda essa experiência proporcionou um saldo bastante positivo para o meu desenvolvimento pessoal e acadêmico porque ali, entre colegas de classe e pessoas que se tornaram grandes amigas, consegui finalmente compreender a potência que se forma quando desenvolvemos pesquisa em diálogo com uma comunidade científica. A partir dessas duas bases – teoria e prática – pude aprofundar minha investigação sobre a construção da feminilidade na Giovanna apresentando sua pesquisa. VU Amsterdam, novembro de 2023. Acervo pessoal da pesquisadora
devoção popular à Virgem Maria na América Latina com base na proposta de Marcella Althaus-Reid, em diálogo com outras fontes teóricas e estudos de diversidade sexual e de gênero das mais diversas partes do mundo, como a África do Sul, índia, Miamar, Ruanda, Zimbábue, Camarões, Reino Unido e Holanda. Isso foi incrível porque me permitiu criar redes e vínculos frutíferos, que continuaram a me instigar no desenvolvimento de minha tese. Sem dúvida, é também bastante significativo para a UFJF, de modo geral, e para o PPCIR, especificamente, porque oportunidades como essas ampliam nossa perspectiva de mundo, nos convocam a um olhar internacionalista e consequentemente melhoram a qualidade da produção discente, além de funcionar como meio de divulgar ao exterior o padrão de excelência do desenvolvimento científico no Brasil.

Bridging Gaps 2022. Acervo pessoal da pesquisadora

Entrevista para o PPCIR

Como você se sentiu ao receber a notícia de que ganhou a bolsa para estudar no exterior?

Quando recebi a notícia de que eu tinha sido aceita no programa Bridging Gaps, foi uma mistura de emoções: senti uma felicidade e gratidão enorme pela base de educação pública, gratuita e de qualidade que tenho recebido da UFJF. Ao mesmo tempo, senti insegurança por não saber se daria conta das demandas acadêmicas de lá e da diferença linguística. Eu fui a primeira da minha família a chegar em um doutorado e também a primeira a ter uma oportunidade dessa proporção… foi algo muito simbólico.

Qual é o país e a universidade em que você está estudando atualmente? O que motivou sua escolha?

Atualmente eu moro no Brasil e estudo na Universidade Federal de Juiz de Fora. Mas no último ano eu morei em Amsterdã, na Holanda, e estudei na Vrije Universiteit Amsterdam (VU-Amsterdam). Escolhi a VU-Amsterdam por causa do PThU, que é o departamento de Teologia e Ciência da Religião mais renomado e importante dos Países Baixos. Minha aposta foi de que ali eu conseguiria ampliar minhas perspectivas e referenciais teóricos, para aprofundar e melhorar a qualidade da minha tese de doutorado – que tem sido investigar a construção de feminilidade na devoção popular à Virgem Maria. Com a base da Teologia Protestante desenvolvida no PThU eu pude compreender meu objeto de uma forma muito diferente e mais internacionalista.

Quais foram os critérios de seleção para essa bolsa e como você se preparou para o processo seletivo?

A seleção foi bastante criteriosa e levou em conta desde desempenho acadêmico até proficiência de língua inglesa. Também foi necessário escrever um projeto de pesquisa específico para o Bridging Gaps, mas que tivesse relação e que aprofundasse, de alguma forma, minha pesquisa no Brasil. Para tanto, eu escolhi aprofundar minha temática de pesquisa com uma leitura contextual da devoção a Virgem Maria, a partir dos estudos de diversidade sexual e de gênero. Também fiz curso de inglês e cursos introdutórios livres de holandês.

Quais são os benefícios de estudar no exterior na sua área de estudo?

O principal benefício de estudar Ciência da Religião no exterior é que ali, entre colegas que eventualmente se tornam grandes amigas/os, a gente percebe a potência que se forma quando desenvolvemos pesquisa em diálogo com uma comunidade científica. A partir dessas duas bases – teoria e prática – eu pude, por exemplo, aprofundar minha investigação sobre a construção da feminilidade na devoção popular à Virgem Maria na América Latina com base na proposta de Marcella Althaus-Reid, em diálogo com outras fontes teóricas e estudos de diversidade sexual e de gênero das mais diversas partes do mundo, como a África do Sul, índia, Miamar, Ruanda, Zimbábue, Camarões, Reino Unido e Holanda. Isso foi incrível porque me permitiu criar redes e vínculos frutíferos, que continuaram a me instigar no desenvolvimento de minha tese. Sem dúvida, é também bastante significativo para a UFJF, de modo geral, e para o PPCIR, especificamente, porque oportunidades como essas ampliam nossa perspectiva de mundo, nos convocam a um olhar internacionalista e consequentemente melhoram a qualidade da produção discente, além de funcionar como meio de divulgar ao exterior o padrão de excelência do desenvolvimento científico no Brasil.

Quais são as principais diferenças que você encontrou entre o sistema educacional brasileiro e o do país em que está estudando?

Acho que no Brasil nós muitas vezes não temos dimensão do impacto global de nossas pesquisas acadêmicas. Lá fora, eu percebi que o modelo do nosso sistema educacional é padrão de referência e de excelência. Acho que a principal diferença é essa: a percepção da dimensão do impacto social, cultural, político e econômico da academia no mundo.

Como é a interação com outros estudantes estrangeiros e locais em seu programa de pós-graduação? Há alguma diferença cultural notável?

Tanto no PPCIR quanto na VU-Amsterdam a interação com estudantes estrangeiros sempre foi muito positiva, porque amplia nossas percepções de mundo e de nós mesmos. É normal que hajam choques culturais, mas mesmo as diferenças nos colocam no limite de nossos pré-conceitos e nos desafiam a construir e reconstruir nossas relações – seja com a academia, seja com a sociedade civil de modo geral. Para mim, esse é um ganho de todas/todos nós.

Quais são as oportunidades de pesquisa que você destaca? Você participou de alguma conferência ou evento relevante para a área?

O Bridging Gaps já foi uma oportunidade e tanto! Mas para além do programa, eu fui convidada a dar entrevistas à VU-Amsterdam (que podem ser acessadas através do link que deixei disponível ao final) e também fui convidada pela Faculdade Unida de Vitória para contar sobre minha experiência e minha pesquisa. Essas oportunidades fazem a diferença tanto para divulgação científica da minha tese, quanto para o aprofundamento de questionamentos e linhas de investigação do meu objeto de pesquisa.  Sem contar que a gente vai trocando referências e matérias científicos, o que ajuda muito também!

Como você avalia o suporte oferecido pela instituição de ensino e pelos programas de pós-graduação no exterior?

Não tenho do que reclamar. Foi tudo perfeito, me senti completamente acolhida e amparada.

Quais são os desafios que você enfrentou durante seu período de estudos no exterior e como os superou?

Acho que o maior desafio foi em relação à língua. Estar em um país que não fala português, e que também não tem inglês como língua materna não é fácil. Mas ainda assim, foi delicioso aprender a me comunicar e a ler o mundo a partir de outra base linguística. A gente aprende o valor da simplicidade.

Que conselho você daria para outros estudantes que estão considerando buscar oportunidades de estudo no exterior na área de Ciência da Religião?

Eu diria que se você tem a oportunidade de estudar fora, não pense duas vezes: vá! Delimite seus objetivos antes da viagem, escreva um bom projeto – preferencialmente um que tenha relação com seus interesses de pesquisa na universidade de origem, pratique um pouco o inglês e desfrute ao máximo! A Ciência da Religião é uma área que exige criatividade e interdisciplinaridade. Por isso mesmo, experimentar um intercâmbio é também um exercício político, que te desafia a se desfazer de todos os preconceitos, medos e inseguranças. É uma oportunidade de aprender a, de fato, vivenciar uma abordagem metodológica sobre religião de forma sincera e profunda. Sincera porque ali, despida/o das certezas, obrigada/o a aprender a falar de novo, a ler de novo, a caminhar por novos lugares, se apaixonar por novas cores, saborear gostos diferentes… você aprende a valorizar a beleza da simplicidade, aprende que cada contexto é único e que, quando reconhecemos nossos lugares de poder e nossa alteridade, encontramos formas de construir uma pesquisa de maior rigor, diálogo, responsabilidade e compromisso social.

Mais informações sobre o Programa “Bridging gaps” podem ser encontradas em: https://www.pthu.nl/en/education/bridging-gaps/

Veja também os vídeos em que a estudante aparece falando sobre sua experiência:

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