Leonardo Carneiro:

Leonardo Carneiro: “Dentre as experiências marcantes que tive com as comunidades quilombolas, destaco a agroecológica. Através deste projeto, elaboramos diagnósticos em seis diferentes comunidades”

Dando continuidade à série de entrevistas com a equipe administrativa que compõe a nova estrutura da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), serão apresentadas a seguir algumas propostas do pró-reitor de Extensão, Leonardo de Oliveira Carneiro. A equipe de Comunicação da UFJF conversou com ele sobre os principais desafios do cargo e as primeiras diretrizes definidas para a pasta. O objetivo da série é mostrar de forma transparente a toda comunidade universitária o que pensa e como pretende atuar cada integrante da equipe indicada pelo reitor Júlio Chebli e pelo vice Marcos Chein. Carneiro é graduado em Geografia pela PUC-Rio, mestre em Geografia pela UFRJ e doutor em Geografia pela UFF. É professor adjunto da UFJF e pesquisador do Núcleo de Pesquisa Geografia, Espaço e Ação (NuGea). Confira trechos da entrevista.

– Entre os desafios listados pelo reitor Júlio Chebli, está o de ampliar ações de extensão nas regiões de Juiz de Fora e Governador Valadares, com atenção especial às comunidades locais. Como o senhor pretende conduzir essa ampliação?

Para ampliar o diálogo entre a Universidade e estas comunidades é preciso buscar os movimentos sociais, as instituições, as organizações sociais, para que a gente possa estar, junto com elas, criando um espaço de troca, e, a partir daí, conseguir pensar em diretrizes, em possíveis ações. Pensar em potencializar a extensão, mas sempre de forma integrada à pesquisa e ao ensino. Os discentes têm que estar também inseridos nesta troca da Universidade com o entorno, assim como as pesquisas e o conhecimento acadêmico. A potencialização deve acontecer naturalmente a partir da sensibilização do corpo docente. A extensão cresceu muito nos últimos anos, o que é ótimo. Mesmo assim, precisamos trazer ainda mais pessoas e investir no crescimento qualitativo, junto à pesquisa e ao ensino. Isso só pode acontecer a partir dessa maior integração.

 – O senhor atua em pesquisas e programas de extensão ligados à Geografia Agrária, Comunidades Tradicionais e Territorialidades Afrobrasileiras. Conte um pouco dessa experiência e como ela pode ajudar em sua gestão.

Essas experiências são importantíssimas e, a partir delas, penso em algumas diretrizes para a extensão, não no sentido de fechar para um determinado caminho, mas de criar um espaço de diálogo entre a Universidade e as comunidades. Dentre as experiências marcantes que tive com as comunidades quilombolas, destaco a proveniente junto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, que é uma transição agroecológica. Através deste projeto, que começou em 2011, elaboramos diagnósticos em seis diferentes comunidades, diagnósticos participativos, ou seja, não é o técnico que chega à comunidade para dizer o que ela precisa, mas chegamos para dialogar e, com a participação de todos, pensamos juntos as estratégias para a resolução dos problemas. Algumas comunidades, por exemplo, produziam alimentos utilizando venenos. Então, tentamos criar alternativas. Outras produzem, mas não têm como comercializar o produto; então, fomentamos uma rede de economia solidária. Essas experiências são interessantes porque geram transformações nas comunidades e também a qualificação dos nossos estudantes envolvidos. Dos quatro alunos que ingressaram em 2011, três estão fazendo mestrado, pesquisando questões que surgiram a partir da participação deles nos projetos de extensão. Isto nos dá um direcionamento, uma experiência que é pensar isso. Como é que a extensão pode provocar questões, pesquisas, retroagir para a sala de aula? Pensar não apenas como atividades mecânicas ou assistencialistas, mas como geradora de contato, de diálogo. Quando os estudantes conseguem dialogar com a comunidade, voltam repletos de questões porque o campo tem essa potencialidade. É aí que acredito no potencial educativo da extensão. Esse caminho deve ser divulgado, conhecido, debatido na Universidade.

– Nos últimos oito anos, a UFJF conseguiu avanços históricos na extensão. Para a sua gestão, abrem-se novos desafios, entre os quais, como aliar a extensão ao ensino a distância e como instituir um modelo transparente de avaliação de resultados. O que o senhor pensa a respeito desses temas?

As soluções não estão prontas. A educação a distancia nos coloca desafios, embora bem consolidada na UFJF. Eu não tenho dúvida de que a extensão na educação a distância deve começar a ser feita a partir dos polos. Então, devemos pensar junto com os polos quais medidas, características e projetos podem ser desenvolvidos ali, integrando os estudantes nessas atividades, que podem ser monitoradas a distancia, mas que devem acontecer nas suas regiões. A perspectiva de elaborar os diagnósticos dos lugares deve ser sempre o primeiro passo, conhecer a realidade dos polos, as necessidades, para começar a pensar em projetos. O desafio é juntar pessoas da extensão com pessoas da educação a distância e cruzar este diálogo para que a gente possa pensar melhor e, aí sim, definir políticas. Eu já trabalhei em projetos de educação a distância e a gente percebe, quando vai aos polos, que muitas vezes são alunos que não teriam outra oportunidade. É uma ferramenta, uma possibilidade de educação indispensável, mas temos que pensar de fato nessa inserção da pesquisa.

– E quanto a um modelo de avaliação transparente dos resultados?

Antes de apresentar uma proposta, convidaremos professores para dialogar sobre o tema. Como avaliar os projetos de extensão de uma forma mais satisfatória? Vou dar aqui um exemplo que já comentei anteriormente. Alunos que voltaram da extensão e estão hoje no mestrado. Isso é um dado qualitativo que hoje, nos atuais moldes, a gente não tem muito como avaliar. Onde estão os alunos que participaram de projetos de extensão, o que desenvolveram a partir dessa experiência? E quais os resultados percebidos pelas próprias comunidades? Como a gente traz estes dados para a avaliação? Queremos ouvir todos. A transparência há de vir pela própria divulgação. É preciso divulgar mais, ainda mais. Muito embora haja um trabalho extremamente sério da divulgação da extensão, precisamos criar mecanismos de maior divulgação, inclusive entre nós. Talvez uma proposta de seminário da qual venhamos a nos encontrar, falar de nossos projetos não só para professores e estudantes da extensão, mas para toda a Universidade e, por que não, para as regiões que abrigam os projetos de extensão da UFJF.

– Como o senhor avalia as atividades de extensão existentes hoje no país. O que funciona e o que não funciona? Existem programas que o senhor tem como referência e que podem ser incentivados na UFJF?

É difícil fazer uma avaliação da extensão no país como um todo, mas podemos pensar em algumas tendências que hoje ganham muita força. Pensar hoje extensão universitária enquanto ação assistencialista não cabe mais. Vemos hoje uma tendência de extensão que crie espaços de diálogos contínuos e que zele pela emancipação das comunidades envolvidas. Não interessa tanto, nessa perspectiva da transformação da própria extensão, manter um modelo assistencialista, mas programas que sejam realmente capazes de transformar as comunidades, a cidadania, tornar a cidadania efetiva, programas em que, a partir deles, as pessoas conheçam seus direitos, seu corpo, sua saúde, a sociedade como um todo, e passem a lutar por conquistas sem se tornarem reféns de assistencialismo. Uma segunda questão é pensar a extensão como momento de troca. Durante muito tempo, a extensão foi pensada como a universidade com saber predominante. Este saber era levado a comunidades vistas apenas como receptoras, desprovidas de conhecimento. Desde pelo menos Orlando Falz Borda, Paulo Freire e, hoje, Henrique Leff, há uma ruptura com este pensamento, há outro modelo, do qual os conhecimentos das comunidades são vistos como absolutamente relevantes, importantes para o crescimento dos projetos de extensão e das próprias comunidades. Ao mesmo tempo, essa troca é benéfica para a universidade, pois estes conhecimentos transformam o próprio conhecimento acadêmico e ampliam espaços de troca.

– Como estimular a participação de alunos, docentes e técnicos em projetos e programas voltados para a comunidade externa?

Questão importantíssima, inclusive a participação dos técnicos. Acredito que a partir do crescimento qualitativo da extensão, pensar que ela tem um papel fundamental no processo do ensino superior. Não dá para pensar a extensão como aquele lugar onde o aluno vai cumprir funções mecânicas, fazer um assistencialismo pontual, sem trazer questionamentos nem estudar essas realidades. É preciso articular mais uma vez a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Não dá para pensar a extensão como um corpo estanque, separado dos outros campos da Universidade, senão ela se torna desinteressante, pois o próprio estudante perde o interesse se for cumprir apenas uma função mecânica. Se a extensão levar o aluno a questionar, a estudar, a debater em sala, aí a gente tem o aluno interessado. Essa dimensão deve ser trabalhada. Pensar a extensão como um potencializador de crescimento do ensino superior, numa perspectiva enriquecida, produtiva, fértil. Se a gente conseguir chegar lá, a gente consegue fazer com que a extensão chegue a caminhos que talvez ainda nem percebemos.

– Como o senhor deseja que a Pró-Reitoria de Extensão seja vista daqui a quatro anos?

– A principal marca é o diálogo. Pretendo que esses quatro anos sejam de um profundo e profícuo diálogo com a comunidade acadêmica, com os corpos docente e discente, com técnicos, prefeituras, comunidades, associações, todos os sujeitos envolvidos, na UFJF e em seu entorno. Uma Pró-Reitoria de diálogo, que escute e que, a partir daí, crie suas diretrizes. Não dá pra pensar numa Pró-Reitoria que tem a sua diretriz já preparada e que vá implementar esse modelo. Claro que pensamos alguma coisa. A proposta do diálogo é uma diretriz, mas uma diretriz para dela saírem diretrizes. Além disso, outra marca que eu gostaria que fosse deixada seria de muito trabalho. Não dá para pensar em transformar a educação superior, a extensão, em algo ainda melhor, se não houver muito trabalho, muito suor. Faço um convite, um apelo àqueles dispostos a dialogar. Estamos precisando de pessoas, ideias, ação, integração. Ninguém faz projetos de extensão sozinho. Eu diria que uma Pró-Reitoria de portas abertas.

Outras informações: (32) 2102-3961 (Pró-reitoria de Extensão)

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