Pela sétima vez, o pesquisador da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Artur Andriolo, é um dos brasileiros convidados para integrar o Comitê Científico da Comissão Internacional da Baleia (CIB). A reunião agrupa centenas de cientistas, especialistas e políticos de 88 países do mundo – e as discussões vão para muito além da conservação da vida dos cetáceos, refletindo na realidade política e econômica de todo o globo.

Artur Andriolo colabora com importantes instituições ambientais brasileiras (Foto: Carolina de Paula/UFJF)

Andriolo integra o Departamento de Zoologia e o Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Natureza do Instituto de Ciências Biológicas (ICB-UFJF), dialogando junto ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério de Relações Exteriores.

Como parte da reunião da CIB, Andriolo apresentará seus trabalhos desenvolvidos na UFJF na cidade de Bled, na Eslovênia, entre os dias 24 de abril e 7 de maio. Em entrevista ao portal da UFJF, o pesquisador compartilha sua participação no Comitê Científico e como sua experiência pode contribuir para a pesquisa e a formação de alunos na universidade. As respostas fornecidas foram adaptadas para o formato textual a fim de torná-las mais acessíveis aos leitores.

UFJF: Considerando sua experiência como pesquisador e membro da delegação brasileira no Comitê Científico da Comissão Internacional da Baleia, quais espécies estão em maior risco de extinção? Além disso, quais são os principais desafios para preservar essas espécies e seus habitats?

Andriolo: Estou envolvido com documentos sobre duas espécies com ocorrência em águas brasileiras: a Toninha e a Baleia Franca. As duas têm um grau de ameaça significativo e ambas ocorrem em áreas costeiras de diferentes localidades – o que as coloca em um ambiente de maior vulnerabilidade, porque estão expostas à maior poluição, ao maior tráfego de embarcações e às atividades de lazer e de pesca humanas; tudo isso são impactos em potencial para essas espécies.

Para Andriolo, um dos maiores desafios na preservação da Toninha envolve desenvolver mecanismos eficazes junto às comunidades pesqueiras locais (Foto: ((o))eco)

O grande desafio, no caso da Toninha, é construir, junto às comunidades de pescadores que estão próximas desses animais, mecanismos sólidos que preservem os indivíduos de Toninha e que evitem impactar a própria vida desses pescadores, sua tradição, seus hábitos e seus costumes. Compatibilizar isso é o grande desafio.

Eu acredito que há um grande esforço no plano de ação nacional para conservar essa espécie, envolvendo representantes das comunidades de pescadores, indústria e outros atores, de maneira a construir soluções efetivas por meio de debate, diálogo e um processo participativo. Ainda não temos uma solução clara, mas precisamos monitorar cientificamente as populações dessa espécie para entender o nível de declínio e quanto tempo temos para que as estratégias de conservação surtam efeito.

Com relação à Baleia Franca, ainda precisamos entender seu movimento, áreas ocupadas e os principais desafios na competição por espaço com atividades humanas, como fazendas de energia eólica. Essas iniciativas podem impactar o meio ambiente e há sobreposição de áreas de interesse com o uso das baleias – não só a Baleia Franca, mas sendo ela uma espécie ameaçada, a atenção tem que ser muito maior.

É crucial entender os padrões de movimento e habitat da Baleia Franca, bem como os desafios decorrentes da competição por espaço com atividades humanas (Foto: Gregory “Slobirdr” Smith, CC BY-SA 2.0, via Wikimedia Commons)

Que o processo comece com licenciamento adequado, mas de forma gradual, permitindo que possamos monitorar cientificamente e de perto os impactos e seus níveis, para tomar decisões sobre a expansão ou não. Certamente isso está dentro de um grande desafio pro Brasil, que é realizar um ordenamento da ocupação de costas e marítimo, definindo claramente áreas de conservação, espécies de importância e áreas para tráfego de embarcações e outras atividades, como exploração de petróleo e energia eólica.

UFJF: O que você espera ensinar e aprender nessa reunião?

Andriolo: Lá temos uma troca, apresentamos nosso trabalho; é diferente de ir para ensinar ou aprender, embora a gente sempre acabe aprendendo alguma coisa. O intuito é compilar informações apresentadas para criar um relatório que sirva de base para a atuação política dos governos nas relações internacionais; nosso exercício é a integração das informações relativas aos principais problemas e lacunas de conhecimento. Este relatório, geralmente com 700 a 800 páginas, é assinado por todos os países membros da comissão.

Ele é entregue para representantes governamentais e, na segunda reunião do ano, que será em setembro, acontecem discussões que abordam relações internacionais e aspectos econômicos, transcendendo a conservação de baleias e golfinhos. Por isso, o relatório orienta posicionamentos e decisões comerciais, de investimento e ações políticas nas relações internacionais, tendo em vista a importância do meio ambiente como protagonista da existência humana no planeta – a gente depende desse equilíbrio, senão não vai durar a vida no planeta. Não só a nossa, nenhuma vida vai durar. Temos que trabalhar para compatibilizar as nossas atividades com a conservação.

Nosso trabalho envolve colaborar com este processo, buscando compatibilizar nossas atividades com a conservação e melhorar a postura humana em relação às atividades que impactam a biodiversidade global. Assim, protegemos a qualidade do ambiente para as gerações futuras, o que é fundamental.

UFJF: Você acredita que, tendo essa visibilidade nacional, está abrindo portas para futuras colaborações aqui da UFJF com o comitê e com o cenário da biologia marinha mundial?

Andriolo: Sempre! Sempre que participo de eventos nacionais e internacionais, amplio as oportunidades de conhecer colegas e pessoas que atuam em temas semelhantes, criando sinergia e possibilitando orientar estudantes para ampliar suas colaborações. Essa participação também proporciona ganhos em trabalhos em rede e contatos, beneficiando não apenas minha atividade como pesquisador, mas também a possibilidade de receber pesquisadores interessados em nosso trabalho na UFJF.

Além disso, essas experiências enriquecem as atividades de docência, porque permitem compartilhar com os alunos o que acontece na prática na conservação e manejo de fauna. Ao sair da sala de aula e discutir problemas reais em reuniões, posso trazer informações atuais para meus alunos, mostrando como a conservação funciona na prática e enriquecendo nossas experiências.

UFJF: Como a experiência que você terá nesse evento tem potencial para contribuir para as pesquisas que seu grupo desenvolve na UFJF, sejam atuais ou futuras?

Andriolo: Participar desse evento me proporcionará a oportunidade de me atualizar com novidades na área e obter a validação de outros especialistas sobre o que desenvolvemos aqui. Na UFJF, nosso grupo de pesquisa conseguiu desenvolver uma abordagem original, inédita no mundo, para estimar a população de golfinhos e a tendência populacional deles, usando acústica e embarcações.

Apresentar esse trabalho no evento permitirá que os melhores especialistas do mundo avaliem e sugiram melhorias para o nosso método. Minha expectativa é de que eles façam críticas, sugestões, e vejam qual o nível de valor que isso tem – que eu penso ser grande, pelo potencial de trazer informações mais consistentes para espécies como a própria Toninha, que é tímida e difícil de se ver. Espero que, ao validar nosso método, ele esteja disponível para pesquisadores de outros países, como Argentina e Uruguai, que poderão replicá-lo e comparar resultados.

E, para o próprio Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade aqui na UFJF, essa experiência contribuirá de várias maneiras. Uma delas é por meio do próprio enriquecimento do meu conhecimento, que compartilho ao dar aulas e orientar alunos. Outra é a idealização de projetos, pois participar dessas reuniões nos ajuda a identificar temas prioritários e lacunas de conhecimento, permitindo aplicar isso em orientações de mestrado e doutorado. Estar próximo dessas discussões nos ajuda a encaixar nas perspectivas de uma necessidade de conhecimento mais abrangente, desenvolvendo projetos relevantes e necessários.

UFJF: Você quer deixar um recado pras pessoas que querem traçar seguir o caminho da pesquisa e também buscam reconhecimento na área científica?

Andriolo: A primeira coisa é confiar; apesar de não termos controle absoluto sobre nossas vidas, conseguimos direcioná-las. Estudar bastante e assumir responsabilidade pelos compromissos que fazemos são essenciais. A responsabilidade, às vezes, é até mais importante do que o conhecimento em si, já que é normal não saber algo. Se você confiar, se dedicar aos estudos e for responsável, haverá um caminho aberto para você.

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU

As ações de pesquisa da UFJF estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). A iniciativa citada nesta matéria se alinha aos ODS 12 (Consumo e produção responsáveis), 13 (Ação contra a mudança global do clima), 14 (Vida na água) e 17 (Parcerias e meios de implementação).

Confira a lista completa no site da ONU.

Outras informações:

Comissão Internacional da Baleia (CIB) / The International Whaling Commission (IWC)

Programa de Pós Graduação em Biodiversidade e Conservação da Natureza – UFJF

Instituto de Ciências Biológicas – UFJF