Infectologista reforça que não existem tratamentos ou medicamentos específicos para Covid-19

Com o aumento alarmante de casos confirmados e vidas perdidas devido à Covid-19 na cidade, pesquisadores e profissionais de saúde vinculados à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) expressam preocupação com os índices elevados de ocupação de leitos, transmissão do coronavírus entre a população e declínio da adesão às medidas de segurança. Em entrevista exclusiva para o portal da UFJF, o médico infectologista do Hospital Universitário (HU), Rodrigo Souza, explica a gravidade do momento e caminhos para evitar o avanço ainda maior da pandemia.

UFJF: É acertado dizer que Juiz de Fora está passando pelo pior momento, em termos de casos confirmados e leitos ocupados, desde o início da pandemia?
Rodrigo Souza: Sim. Mesmo em momentos ruins (como em julho, quando tivemos uma maior concentração de casos), os leitos ocupados, principalmente de UTI, não chegaram ao ponto que está atualmente. E ainda temos a incerteza do que pode vir a acontecer. Então, estamos, sim, no pior momento da pandemia.

UFJF: A perspectiva é de melhora ou de piora deste cenário atual? Por quê?
RS: É muito difícil prever porque não sabemos quantas pessoas já tiveram Covid-19, já que muitas não fizeram exames, principalmente no início da pandemia, quando faziam apenas os pacientes com casos graves. Se tivermos uma população ainda muito suscetível, a tendência do cenário é piorar dia após dia. Se muitas pessoas já foram infectadas e agora o ataque é sentido por aquelas que não tinham sido expostas, a tendência seria de melhora. Como não temos como dizer, precisamos nos prevenir e tomar atitudes como se esperássemos uma piora – já que, na incerteza, é melhor pecar por excesso. 

UFJF: Houve alguma mudança entre o perfil dos pacientes atendidos no início da pandemia e os que são diagnosticados mais recentemente? É possível constatar se as medidas de segurança estão (ou não estão) sendo utilizadas com mais frequência agora, por exemplo?
RS: No SUS, continuamos tendo pacientes ainda muito acometidos. Aparentemente, o que tem acontecido agora é que o número de casos vêm aumentando em pacientes que não foram afetados em um primeiro momento – principalmente aqueles de classe média e classe média alta, que conseguiram fazer isolamento. À medida que voltaram a trabalhar e a se expor – e alguns voltaram, até mesmo, a participar de atividades recreativas –, o número de casos aumenta. Notamos, por exemplo, que a ocupação de hospitais privados é cada vez maior.

UFJF: Falando sobre elas, as medidas de proteção são infalíveis ou dão pouca margem para erros? Ser contaminado pelo coronavírus enquanto utiliza máscara, por exemplo, é possível? Se sim, a Covid-19 seria mais “branda”?
RS: Até mesmo as máscaras utilizadas pelos profissionais de saúde, nas UTIs e atendimentos especializados, não são capazes de proteger de forma absoluta; elas filtram as pequenas partículas em 95% das vezes, por exemplo. O importante é utilizar mais de uma medida de proteção, sempre aliando uma à outra: a melhor prevenção para a Covid-19 que temos até agora são o distanciamento social, o uso de máscara e a higiene das mãos. Agora, sobre a Covid-19 ser mais branda ou não, nós temos duas variáveis em relação à doenças infecciosas: a quantidade de vírus que entra e o comportamento do hospedeiro. São ambas que determinam como vai ser a evolução da doença. (confira, ao final da matéria, um vídeo sobre o uso adequado de máscaras)

UFJF: De tempos em tempos, informações são disseminadas pelas redes sociais que, caso fossem verdadeiras, seriam boas notícias. Uma delas é que, atualmente, nós já desenvolvemos um tratamento específico para a Covid-19. É seguro afirmar isso, ou o que temos disponíveis são tratamentos que “seguram” o avanço do doença, mas ainda não tratam a causa direta dela – ou seja, o coronavírus?
RS: Ainda não temos um tratamento específico para a Covid-19 com segurança. Existem alguns medicamentos que podem alterar um pouco o avanço da doença e eles são indicados de formas específicas, mas não existe nenhuma segurança ou relaxamento em relação a isso. Não devemos confiar nas informações que afirmam que já existem tratamentos eficazes contra o coronavírus.

UFJF: Outra coisa que chama atenção é o uso de medicamentos profiláticos. Há quem se automedique ou que receite, seja por vontade própria ou por insistência do paciente, substâncias que supostamente combatem o coronavírus ou aumentam a imunidade. Existem medicamentos que, de fato, atuam na prevenção ou no combate à Covid-19?
RS: Não existem medicamentos ou vitaminas que tenham comprovada ação para a prevenção da Covid-19. Muitas pessoas estão recorrendo a isso porque, às vezes, julgam-se na necessidade de fazer alguma coisa. Alguns medicamentos, principalmente algumas vitaminas ou minerais, não causam grandes problemas, mas só devem ser tomados se um médico realmente acredita que a utilização deles é necessária e, por fim, e indique isso. Já a automedicação ou a utilização de vitaminas sem orientação pode causar danos.

UFJF: Quais seriam as medidas necessárias para conter o atual avanço da Covid-19 em Juiz de Fora? E, na impossibilidade de atendê-las, quais são os protocolos mais seguros para seguir
RS: O ideal seria que, hoje, estivéssemos na onda vermelha na cidade, suspendendo todas as atividades não essenciais, para que, com isso, aumentasse o distanciamento entre as pessoas – pelo menos, até onde a ordem pública pode determinar. Além disso, devemos fazer com que as pessoas também façam sua parte. Não adianta ter normas se o município não vai conseguir cobrar de todos isso. Então, cada um deve se esforçar para fazer a sua parte.