Cientistas do mundo inteiro, de diversas áreas do conhecimento, estão, como nunca, dedicados a estudos para conter a pandemia, com especial foco em tratamentos e vacinas. Porém, o direito de propriedade e exploração comercial pelo criador, garantido por patentes, dificultaria o amplo acesso a esses medicamentos? Essa é a questão a ser discutida por Ken Shadlen, professor do Departamento de Desenvolvimento Internacional da London School of Economics and Political Science, na Inglaterra, nesta quinta-feira, 2, às 17h, do Critt Talks, conduzido pelo diretor de Inovação da UFJF, Ignácio Delgado. A palestra faz parte da 11ª semana de eventos virtuais realizados pelo Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (Critt), da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). A conversa acontece na plataforma da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RPN), as inscrições são gratuitas e devem ser realizadas no Sympla.

Preços mais altos em países em desenvolvimento

De acordo com Shadlen, no que diz respeito aos tratamentos, os problemas de acesso afetarão principalmente os países de renda média como o Brasil. “Enquanto os países de baixa renda provavelmente receberão medicamentos a preços reduzidos, com governos e doadores filantrópicos cobrindo os custos, os países de renda média enfrentarão preços mais altos”, afirma. Nos últimos anos, sua pesquisa foi concentrada amplamente na política internacional de Propriedade Intelectual (PI). O professor está interessado nas implicações que o novo regime global de PI apresenta para o desenvolvimento tardio e nas várias maneiras pelas quais as normas internacionais de PI afetam as práticas nacionais.

Para entender os próximos passos em relação à pandemia de Covid-19, o professor lembra que patentes são nacionais. “Uma patente de um medicamento no Reino Unido não concede direitos de exclusão fora do Reino Unido. As empresas precisam solicitar patentes em todos os países onde buscam controle exclusivo sobre a invenção”, esclarece. Com isso, antes da década de 1990, a maioria dos países em desenvolvimento proibiam patentes de produtos farmacêuticos. Shadlen explica que isso mudou com o acordo Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (Trips) da Organização Mundial do Comércio (OMC) que trata sobre aspectos relacionados aos direitos de propriedade intelectual. O acordo obriga todos os países a permitir que produtos farmacêuticos recebessem patentes. “A ‘globalização da patente farmacêutica’ produzida pelo Trips significa que os medicamentos podem obter patentes em todos os países da OMC, exceto 36 identificados como ‘menos desenvolvidos’”.

Possíveis saídas para o Brasil

Então, com o preço alto que patentes trazem consigo, o que devem fazer os países em desenvolvimento? Segundo Shadlen, existe uma brecha, mas pode não ser muito útil. O Trips permite que os países, sob certas condições, contornem as patentes e permitam que a produção e a distribuição ocorram sem a permissão do detentor da patente. No entanto, apesar de toda a atenção que essas “licenças compulsórias” estão recebendo no contexto da Covid-19, o professor explica que para gerar concorrência, elas precisam ser complementadas por recursos locais de produção ou fornecedores externos. “O Brasil possui disposições na lei de patentes para licenciamento compulsório, que significa a suspensão de direitos de monopólio de produção e comercialização para garantir o acesso a medicamentos essenciais por países que não possuem indústrias farmacêuticas capazes de fabricá-los e em situação de pandemia. Esse mecanismo foi utilizado com sucesso para medicamentos contra a Aids. Faz sentido revisar a lei, ver se ela é adequada para os desafios atuais e, se não for, revisá-la para torná-la mais útil”, aponta.

Ken Shadlen afirma que é impossível, neste momento, saber como as patentes afetarão os preços e o acesso. Pode ser que, quando os tratamentos se tornem disponíveis, os efeitos das patentes se mostrem sem importância em relação a outros fatores que afetam a produção e a distribuição. E a história com vacinas também pode ser diferente. “A razão pela preocupação de muitos de nós é a grande possibilidade de as patentes restringirem o acesso, e esses efeitos provavelmente serão sentidos de maneira diferente em todo o Sul global”, conclui.

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