O Laboratório Afrikas de Audiovisual (LabAfrikas) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) irá lançar nesta sexta-feira, dia 22, às 19h, o vídeo “Reflexo Reverso: o outro em branco”, primeiro episódio de uma websérie. O objetivo é fomentar o debate acerca das epistemologias e disseminar o conhecimento científico sobre as africanidades, as relações raciais e o racismo em linguagem mais acessível para todos os públicos.
Confira o teaser:
O tema deste episódio piloto é a branquitude, a pertença étnico-racial atribuída às pessoas brancas. O lançamento pode ser conferido nas redes sociais do grupo, no YouTube, Instagram e Facebook. A iniciativa, que conjuga ensino, pesquisa e extensão, tem coordenação da professora do Departamento de História da UFJF e líder do LabAfrikas, Fernanda Thomaz.
Branquitude e coronavírus
Em virtude da pandemia provocada pelo novo coronavírus, o lançamento da websérie será exclusivamente virtual. No entanto, após o período de isolamento social recomendado pelas autoridades sanitárias, a intenção é realizar debates nas escolas públicas de Juiz de Fora.
“É fundamental falar de branquitude. O curioso é que pouco sabemos sobre o seu significado. Por isso, é preciso, incansavelmente, enfatizar que a nossa sociedade é estruturada por ela, pelos privilégios dotados às pessoas brancas. Historicamente, é essa parcela da população que recebe diferentes formas de benefícios. Não tem como pensar um aspecto de nossa sociedade sem perceber a existência do racismo e, consequentemente, da manifestação da branquitude”, aponta a professora Fernanda Thomaz.
No atual contexto de excepcionalidade, alerta a pesquisadora, as desigualdades raciais tornam-se ainda mais evidentes. “Vivemos uma pandemia. É um momento drástico, mas quem é mais afetado? Quem tem menos visibilidade diante dos desastres físicos que essa doença pode causar? Quem é visto como menos capaz para conter ou descobrir a vacina contra o vírus? No Brasil, sabemos que isso acontece, majoritariamente, com a população negra. Já no contexto internacional é o continente africano que costuma ser o alvo dessas questões. Estamos falando aqui de desigualdade racial, de como os brancos se veem e são vistos como superiores, mais capazes e merecedores de atenção.”
Referenciais teóricos
Fernanda Thomaz explica que as produções acadêmicas sobre a identidade racial branca ganharam destaque, especialmente, a partir dos anos 1990, nos Estados Unidos, com a emergência dos estudos críticos da branquitude. Também são desenvolvidas pesquisas sobre a temática na África do Sul, na Austrália e no Brasil.
As pesquisas de W.E.B Du Bois, Frantz Fanon, Guerreiro Ramos, Grada Kilomba e Lia Vainer Schucman são algumas das produções acadêmicas que fundamentam o vídeo “O outro em branco”
Por outro lado, destaca a docente, a pertença étnico-racial dos brancos já era tema dos estudos de W.E.B Du Bois e Frantz Fanon na primeira metade do século XX. As obras de ambos os pesquisadores, além das pesquisas de Guerreiro Ramos, Grada Kilomba e Lia Vainer Schucman, foram fontes utilizadas para elaboração do vídeo “O outro em branco”.
Conhecimentos etnicamente diversos
O estudante de Jornalismo da UFJF e integrante do LabAfrikas, Gustavo Luiz Ribeiro, ressalta que matrizes do conhecimento científico ainda pouco abordadas podem potencializar reflexões acerca da comunicação no século XXI.
“No meu caso, o pensamento de Amadou H. Bâ sobre Griot [agente de comunicação] é um guia interessante. No momento em que me debrucei e me apropriei da ideia de que ‘é permitido a um Griot ter duas línguas na boca’ a minha trajetória pessoal e as minhas produções acadêmicas ganharam um novo jeito de ser.”
Ribeiro relata a possibilidade, aberta pela participação no LabAfrikas, de troca de vivências e conhecimentos etnicamente diversos. “Isso me fez compreender que a comunicação é uma ciência do tempo. Além de ter a limitação linear do tempo, ainda há temporalidades para falar, agir, pensar, descansar, da forma mais adequada para cada meio, sem desconsiderar a potência do outro. Assim, cada palavra do roteiro deste projeto, que foi articulada e revisada por realidades negras científicas diversas, em temporalidades diferentes, é pensada para criar incômodos e possibilidades intertextuais entre referenciais de negritudes e branquitudes. Isso é comunicar.”
A edição de texto e imagens do episódio “O outro em branco” também foi uma experiência partilhada e coletiva, conforme salienta a estudante de Rádio, TV e Internet da UFJF e integrante do LabAfrikas, Ana Júlia Silvino.
“Usamos elementos midiáticos e artísticos que, historicamente, estabeleceram o lugar da branquitude e dos negros na nossa sociedade. Usamos filmes como ‘O Nascimento de uma Nação’, de D. W. Griffith. Esse longa criou estereótipos racistas acerca da população negra, e é tratado, na universidade, apenas como um clássico do cinema, sem ser questionado em nenhum momento. Questionamos também obras de artistas renomados, como Jean-Baptiste Debret e Modesto Brocos, diversas propagandas que reproduzem a lógica racista, e pinturas clássicas que estabelecem o lugar da branquitude como bela, angelical e detentora de todos os saberes.”
Lives sobre a branquitude
Além do lançamento virtual do vídeo “Reflexo Reverso: o outro em branco”, o LabAfrikas vai organizar lives (transmissões ao vivo via redes sociais). A primeira transmissão será realizada no próximo domingo, dia 24, às 17h, para a apresentação da equipe e conversa com o público sobre os objetivos do projeto. A programação completa será divulgada nos próximos dias nas redes sociais do LabAfrikas e nos canais da UFJF.
O Laboratório Afrikas de Audiovisual é interdisciplinar, e conta com graduandos dos bacharelados em Ciências Sociais; História; Jornalismo; Rádio, TV e Internet; Artes e Design; e Cinema. Tem ainda a colaboração de uma estudante do Mestrado em História.
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