Segundo Fernanda Thomaz, o Afrikas busca valorização das heranças originadas no continente para uma percepção mais clara do papel dele junto à humanidade (Foto: Twin Alvarenga)

Segundo Fernanda Thomaz, o Afrikas busca valorização das heranças originadas no continente para uma percepção mais clara do papel dele junto à humanidade (Foto: Twin Alvarenga/UFJF)

Uma diversidade de povos, línguas e culturas muitas vezes desconhecidos por grande parte da população mundial quando se diz respeito ao terceiro continente mais extenso do mundo: a África. Por meio do estudo da história do continente, o grupo de pesquisa “Afrikas”, organizado por uma parceria entre o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) e o Departamento de História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), procura quebrar os estereótipos e trazer novas perspectivas sobre o continente considerado o berço da humanidade.

De acordo com a coordenadora do grupo, Fernanda Thomaz, o próprio nome do projeto busca ilustrar essa diversidade. “Afrikas”, no plural, representando as múltiplas Áfricas pouco conhecidas, e a letra “K”, usada como referência à escrita em vários países do continente. Uma das propostas do grupo é trabalhar como atuação política, pensando na colaboração do ensino da história da África para uma mudança na conjuntura social. “No contexto da nossa sociedade, onde o imaginário de África é extremamente deturpado, é preciso pensar o que isso representa na nossa identidade. Pensar nas hierarquias, nas contradições sociais, como a sociedade é construída e, sobretudo, na busca de valorização dessas heranças, para também percebermos que a África faz parte da humanidade”, explica Fernanda.

Parte das novas perspectivas defendidas pelo projeto está na mudança da visão eurocêntrica do mundo, segundo a pesquisadora. Na própria História lecionada nas escolas, por exemplo, os negros apenas são citados em relação à escravidão. “As Áfricas podem fazer parte da nossa herança, mas estão tão distantes de nós e são realidades extremamente diferentes. É preciso pensar em uma realidade mais ampla e menos eurocêntrica. Para mim, esse é o caminho para combater o racismo”, diz Fernanda. 

“É preciso pensar em uma realidade mais ampla e menos eurocêntrica. Para mim, esse é o caminho para combater o racismo”, afirma a coordenadora do grupo, Fernanda Thomaz

Pensando na atuação junto à comunidade, um dos objetivos da pesquisadora é ampliar o Afrikas e torná-lo também um projeto de extensão. Por enquanto, os próprios alunos do grupo de estudo estão realizando esse trabalho, por meio da exibição do filme “Virgem Margarida” junto aos movimentos de ocupação das escolas. O longa aborda a pós-independência em Moçambique, sobretudo a relação das mulheres nesse processo.

Pós-Afrikas

A fim de discutir as possibilidades de implementação da história e cultura das sociedades africanas no cotidiano escolar da educação básica, foi criado o curso de pós-graduação lato sensu (Especialização) em História da África da UFJF, o Pós-Afrikas, também coordenado por Fernanda. O programa é voltado para atualização de formação dos professores da rede básica de ensino.

 Para Fernanda, através do grupo de pesquisa, é possível "conhecer as múltiplas Áfricas, e entender que não é só uma delas que nos formou” (Foto: Twin Alvarenga)


Para Fernanda, através do grupo de pesquisa, é possível “conhecer as múltiplas Áfricas, e entender que não é só uma delas que nos formou” (Foto: Twin Alvarenga/UFJF)

O Pós-Afrikas foi submetido ao Ministério da Educação (MEC) no final de 2014 e teve início em outubro de 2015, destacando-se como o primeiro curso do país a tratar sobre a História da África oferecido por uma instituição pública. As aulas são presenciais e semanais, ministradas por professores e pesquisadores de todo o país. Algumas contaram também com a presença de professores africanos, como de Moçambique e Guiné-Bissau, que estavam de passagem pelo Brasil e aceitaram o convite para participar.

Faltando poucos meses para encerrar, Fernanda faz um balanço positivo sobre o curso, considerando o contentamento dos alunos e o baixo número de evasões. De acordo com a pesquisadora, inicialmente, o MEC exigia 50 vagas, sendo 80% direcionadas para professores da rede pública de ensino, e 20% de demanda social. Como a procura foi alta, 63 vagas foram disponibilizadas. “Agora que estamos terminando, de 63, estamos com 58 alunos. A evasão foi mínima. Pelo que ouço, há uma satisfação com o curso, até porque eles vislumbraram outras realidades. Sem isso, muitas vezes nossos cursos ficam muito rasos e, pensando na atuação dos professores, essa formação é fundamental. Então, esse é o lugar de conhecer as múltiplas Áfricas e entender que não é só uma delas que nos formou.”

O Pós-Afrikas é o primeiro curso de pós-graduação do país, oferecido por uma instituição pública, a tratar sobre a História da África. 
“A evasão foi mínima. Há uma satisfação com o curso, até porque eles vislumbraram outras realidades”, explica Fernanda

Além de pensar em outras realidades, a pesquisadora também destaca a importância da Consciência Negra não se limitar apenas ao mês de novembro. “A Consciência Negra é fundamental, mas deveria fazer parte da nossa reflexão cotidiana. Essa consciência tem que estar ligada a uma ideia de enfrentamento. Por que milhares de jovens negros são violentados e mortos? Se nós pararmos de olhar para nosso próprio umbigo, conseguimos perceber contradições gritantes na nossa sociedade.”

Esta matéria é a primeira da série de matérias especiais em homenagem à Semana da Consciência Negra. Saiba mais sobre a série e demais eventos organizados pela UFJF celebrando esse tema clicando aqui.