Professores e especialistas participaram do Seminário Integrado do Rio Doce. (Foto: Maria Clara Leite)

Três anos após o rompimento das barragens em Mariana, ainda são muitas as comunidades que sofrem as consequências da poluição das águas do Rio Doce, que passa pela cidade de Governador Valadares. Com o objetivo de discutir ações integradas de suporte e diminuição dos impactos do desastre, especialistas, profissionais e estudantes de instituições da cidade se reuniram, nesta semana, para o III Seminário Integrado do Rio Doce. O evento promoveu rodas de conversa, encontros de pesquisadores e apresentação de painéis sobre o tema.

A iniciativa do seminário surgiu a partir de uma mobilização – principalmente dos atingidos e lideranças, ocorrida meses após o desastre de 2015. Para o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, campus Governador Valadares (UFJF-GV), Braulio Magalhães, trata-se de uma ação conjunta para manter acesa a discussão e a busca por mudanças na situação dos atingidos. A UFJF-GV desenvolve projetos de Extensão junto às comunidades ribeirinhas, através de atividades que promovem conhecimentos como a troca de saberes, educação socioambiental e desenvolvimento sustentável.

Entre os principais objetivos da terceira edição do seminário, estão o desenvolvimento da Rede Interinstitucional de Pesquisa Socioambiental de Governador Valadares, além de ações que produzam maior comunicação com os atingidos pelo desastre: “o seminário é um espaço da gente dialogar e debater. Nesta edição, nós temos o avanço de trabalhar uma rede integrada de instituições que trabalham a pesquisa socioambiental, especificamente a partir daqui”, explicou Braulio.

Durante as atividades do evento, integrantes do jornal A Sirene, de Mariana, participaram de uma roda de conversa com os participantes. Na ocasião, eles apresentaram o material produzido, debateram a importância de dar voz às comunidades e a constituição de um coletivo de comunicação do Fórum da Bacia do Rio Doce. O jornal foi criado em fevereiro de 2016, e é construído por cerca de 70 pessoas, entre atingidos pelo desastre, organizadores e colaboradores. “A ideia é que a gente fomente a criação de um mecanismo próprio aqui, e trabalhe esse processo de comunicação, de informação, de transparência”, explicou Braulio, que também é um dos organizadores do Seminário.

Luciana debateu o TAC Governança e sua aplicação junto aos atingidos pelo desastre. (Foto: Maria Clara Leite)

Críticas e proposições ao modelo do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) Governança foram tema de mesa redonda que contou com a participação das docentes do Departamento de Direito da UFJF-GV, Luciana Tasse e Tayara Lemos. O TAC Governança é um instrumento extrajudicial de solução alternativa de conflitos, que propõe trazer rapidez e celeridade às demandas judicias propostas no caso da Samarco. Entre as críticas apresentadas ao modelo, está a ponderação sobre a efetiva celeridade do processo e a predominância dessa solução no futuro. “Essa solução contratual do conflito vem em um momento de neoliberalismo retornante, desregulamentação de direitos trabalhistas e do meio ambiente. Esse modelo vai ser, então, o paradigma para solucionar esses conflitos de grande monta no Brasil e no mundo”, explicou Luciana. Ela destacou que o tema da mineração e os desastres decorrentes dela não são assuntos passageiros no país: “são mais de 700 barragens em Minas, mais de 20% em situação delicada”, explicou Luciana.

Esse sofrimento prolongado é um desastre dentro do desastre – Luciana Tasse, docente da UFJF-GV

As docentes abordaram, também, a falta de participação dos atingidos nos processos atuais e o sofrimento prolongado dos moradores nas regiões envolvidas. “O tempo trabalha contra os atingidos e a favor das empresas. Quando vamos a Mariana e às demais cidades, vemos que são indenizações injustas, patrimonialistas. Destacamos a importância do protagonismo dos movimentos sociais e das lutas por direito, para que essa participação seja efetiva”, pontuou.

Planejamento de mudanças e desdobramentos de ações conjuntas

Segundo Braulio Magalhães, a carência de informação aos atingidos pelo desastre revela a necessidade de criação de um canal direto. “Há um problema muito grande das pessoas efetivamente atingidas de uma forma mais direta, imediata, como os quilombolas, ribeirinhos, indígenas, enfim, as pessoas que sobreviviam do rio: falta muita informação”. Entre os efeitos dessa desinformação, o professor pontuou que “as pessoas que estão atingidas continuam alheias a muitas ações e isso tem prejudicado sobretudo o processo que entendemos que seja o mínimo de justiça”

Além do Seminário realizado nesta terça, os organizadores pretendem promover outras ações em conjunto com as instituições que integram a Rede Integrada. Braulio explicou que a intenção é “reunir as instituições para identificar, levantar e convidar todas as frentes de ação ligadas ao desastre de Mariana, para a partir daí ter um portfólio de tudo o que tem sido feito, e tentar financiamentos para instituições que são ligadas a questões ambientais, inclusive órgãos internacionais”.

Além da UFJF-GV, colaboraram na organização do evento o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG-GV) e a Univale.