Objetivo é garantir direitos da população historicamente excluída

Objetivo é garantir direitos da população historicamente excluída

No Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, são intensificados os debates acerca da necessidade de ampliação das estratégias de combate ao racismo no país. A população brasileira é composta majoritariamente por negras e negros, que somam 51% dos brasileiros. No entanto, historicamente, têm sido excluídos das instâncias deliberativas, seja no setor público ou no privado, e dos extratos socioeconômicos mais elevados.

No âmbito das universidades públicas, um dos instrumentos de inclusão e de reparação histórica é a reserva de vagas ou cotas. A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) foi a primeira em Minas Gerais a aplicar a referida estratégia. O Conselho Superior (Consu) aprovou a reserva de vagas em 2004, oito anos antes da publicação da Lei de Cotas, que entrou em vigor em 2012.

O dispositivo jurídico – Lei 12.711/12, atualizada para Lei 13.409/16 – reserva aos negros e indígenas que cursaram integralmente o Ensino Médio em escolas públicas, no mínimo, 25% das vagas ofertadas nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio. Desse percentual, 12,5% dos candidatos negros e indígenas também devem comprovar renda familiar per capita inferior a 1,5 salário mínimo. A outra metade das vagas é ofertada sem exigência da comprovação de renda.

O pró-reitor adjunto de Graduação da UFJF, Cassiano Caon Amorim, ressalta que a reserva de vagas garantida por lei beneficia, sobretudo, estudantes oriundos da rede pública de ensino. “A primeira coisa que é importante destacar é que não existe um sistema de reserva de vagas específico só para negros ou indígenas ou pessoas com deficiência. O que existe é uma reserva de vagas, envolvendo, no mínimo, 50% das vagas das instituições federais de ensino superior, para estudantes de escolas públicas. Dentro dessa reserva, há diferentes critérios para subdivisão dessas vagas: renda, raça e pessoas com deficiência.”

Na avaliação de Amorim, as cotas promovem e contribuem para a democratização do espaço universitário. “Basta olhar para a Universidade e ver que hoje temos uma outra cara. A entrada de estudantes de escolas públicas, e parte desses estudantes de são pessoas negras, mostra um pouco mais da cara da sociedade brasileira na Universidade. Antes da reserva de vagas, tínhamos uma Universidade extremamente elitista. Hoje temos circulando nesse espaço, nas salas de aula, no Restaurante Universitário e em todos os ambientes, especialmente os de graduação, estudantes que representam o que é a nossa sociedade. Temos uma Universidade muito mais diversa, plural.”

Os negros na sociedade brasileira

"Somos metade da população brasileira e, na universidade, o percentual de vagas reservadas para negros é de 25%", considera Julvan Moreira

“Somos metade da população brasileira e, na universidade, o percentual de vagas reservadas para negros é de 25%”, considera Julvan Moreira

Outro aspecto importante, na avaliação do pró-reitor adjunto de Graduação, Cassiano Caon Amorin, é que a Lei de Cotas, ao democratizar o espaço universitário,  favoreceu a pluralidade dos debates. “Toda a questão que envolve o negro brasileiro também veio para dentro da Universidade. Existe legislação que hoje também nos obriga, nos curso de graduação, a fazer a discussão das questões étnico-raciais. Por que discutir essa temática? Por inúmeras razões. Se observarmos, a maioria dos analfabetos é negra; a maioria das pessoas com menores rendimentos no Brasil é negra; o maior número de assassinatos envolvendo a juventude brasileira tem como vítimas jovens negros; e por aí vai. Desse modo, tem que se discutir essas questões e, com a chegada dos estudantes negros, houve uma mobilização nesse sentido.”

A avaliação é compartilhada pelo diretor de Ações Afirmativas da UFJF, Julvan Moreira de Oliveira, que acrescenta alguns dos desafios a serem enfrentados para ampliação dos processos de inclusão de negros e negras na Universidade. “Mesmo com a legislação de cotas, a Universidade não reflete o percentual de negros da população brasileira. Somos metade da população brasileira e, na universidade, o percentual de vagas reservadas para negros é de 25%. No entanto, esse percentual ainda não é totalmente preenchido. A quantidade de negros cotistas que ingressaram na UFJF, entre os anos de 2006 e 2018, está aquém das vagas reservadas para negros, ou seja, pretos e pardos.”

Para Oliveira, há dois caminhos a serem seguidos, visando ao efetivo acesso da população negra às universidades federais: investimentos em comunicação, em estratégias e em programas de permanência estudantil. “O primeiro caminho é a intensificação da campanha nas escolas públicas de ensino médio, para que o estudante negro possa ter maior conhecimento acerca da possibilidade de ingressar nas universidades via política de cotas. O segundo é a política de permanência que as universidades precisam elaborar em várias dimensões. Política de permanência não se resume à assistência estudantil. É preciso pensar em estratégias pedagógicas de acompanhamento dos estudos, na elaboração dos trabalhos. Isso também auxilia esse estudante a se inserir nesse novo modelo de estudo ao qual ele nunca havia tido acesso.”

O diretor de Ações Afirmativas acrescenta a necessidade de oferta também de acompanhamento psicológico, visando ao combate aos casos de assédio. Nesse sentido, Oliveira recorda que a UFJF  criou, em junho de 2016, por meio da Resolução nº 32 de 24 de maio de 2016, a Ouvidoria Especializada em Ações Afirmativas. O órgão, ligado à Diaaf, visa ao combate a quaisquer tipos de discriminação e violência, atendendo um dos principais anseios da comunidade acadêmica.

Ouvidoria Especializada em Ações Afirmativas foi criada em maio de 2016

Ouvidoria Especializada em Ações Afirmativas foi criada em maio de 2016

“Recebemos denúncias de casos de assédio, principalmente contra estudantes cotistas, por conta de questões econômicas e étnico-raciais. Estratégias como a criação de ouvidorias especializadas e a oferta de atendimento psicológico são indispensáveis para que os cotistas permaneçam na Universidade.”

Acompanhamento acadêmico    

No próximo ano, uma das metas da Pró-reitoria de Graduação e da Diretoria de Ações Afirmativas é implantar projeto de acompanhamento acadêmico de estudantes cotistas. “Propusemos e pretendemos iniciar esse projeto em 2019. A intenção é que todos os cursos tenham um bolsista ou um tutor, para acompanhar esse estudante ingressante na elaboração dos trabalhos, nas atividades de estudos, etc”, afirma Oliveira.

O professor destaca uma das funções primordiais das universidades federais: o fomento à democratização da sociedade brasileira. “Estamos em uma sociedade extremamente racista e a universidade reflete um pouco esse ambiente. A Universidade Pública tem, dentre suas funções, estimular a democratização da sociedade, pensando e propondo ações que incluam todos os grupos minoritários.”

Outras informações: (32) 2102-6919 – Diretoria de Ações Afirmativas