Márcia Fávero: “Apesar de os professores não serem treinados para identificar problemas dos alunos que extrapolam a sala de aula, é preciso treinar o olhar e se comunicar antes de fazer qualquer proposição” (Foto: Alice Coêlho)

Ingressar no ensino superior é um sonho almejado por muitos. Porém, ao mesmo tempo que a experiência acadêmica traz muitas novidades e expectativas, também exige um processo de adaptação a um novo ambiente e, grande parte das vezes, à uma nova cidade. Para explorar esse momento de emoções tão contrastantes, a psiquiatra e professora da Faculdade de Medicina Márcia Fávero foi convidada ao Instituto de Ciências Humanas (ICH) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) para ministrar a palestra “A saúde mental dos estudantes universitários”. Na oportunidade, discutiu os principais elementos criadores de estresse, ansiedade e depressão para alunos do ensino superior.

A palestra aconteceu na última quinta-feira, dia 30, e deu continuidade ao Simpósio de Saúde Mental da Faculdade de Farmácia da UFJF, que acontece no anfiteatro 3 do ICH. Márcia elencou inicialmente alguns dos fatores acadêmicos causadores de estresse nos universitários, que podem se desenvolver para problemas ainda mais graves se não forem tratados adequadamente. Dentre eles estão uma carga horária excessiva, a privação do sono, da vida social e ter que lidar com incertezas. “E acrescente a isso, ainda, o fator da competição.”

A professora traz um paralelo entre a época que cursou Medicina na instituição e os dias atuais, notando que hoje há uma pressão maior para que os alunos já se encaminhem profissionalmente desde os primeiros períodos, participando de projetos extracurriculares e compondo seu currículo, algo que gera certa exaustão nos alunos e um distanciamento entre si, pois vêem seu próximo como uma espécie de rival para o mercado de trabalho.

Todos essas preocupações somadas, causam uma diminuição da qualidade de vida do aluno. Mas não é só isso. Ela defende que, para se ter uma boa saúde mental, é preciso também estar saudável fisicamente e socialmente. “Saúde é todo esse conjunto, não se pode pensar que a psiquiatria e o uso de medicamentos, muitas vezes colocados como protagonistas nesse debate, vão resolver o problema se todo o resto não estiver de acordo.”

Ela também aponta fatores pessoais, como determinação, resiliência, habilidades de comunicação e distância da família. Esses elementos afetam diretamente a capacidade do aluno em lidar com o meio onde está inserido e “apesar de os professores não serem treinados para identificar problemas dos alunos que extrapolam a sala de aula, é preciso treinar o olhar e se comunicar antes de fazer qualquer proposição”.

A saúde mental do estudante de saúde

Márcia reservou parte da palestra para tratar de estudantes dos cursos de saúde, cenário observado a partir de sua própria experiência e que traz particularidades que atenuam determinados fatores. “Quando eu participei de uma mesa de debates na Faculdade de Medicina para tratar desse tema, nós ouvimos vários alunos e fomos surpreendidos com os assuntos que eles traziam. Para minha surpresa, eram reclamações muito práticas, como a carga horária, o excesso de avaliações ou a falta de empatia de determinados professores.”

Além da pressão do próprio curso e de ter que constituir uma carreira, ela acrescenta que também “existe uma tendência a achar que o estudante e profissional da saúde já sabe se cuidar. Ele não está se formando para cuidar do outro?”, reflete.

Diante disso, coloca em foco a questão da percepção, elemento fundamental para a compreensão do problema, uma vez que cada um localiza-se num coletivo com base em sua própria perspectiva, e uma vez que diferentes situações podem causar diferentes percepções de um aluno para outro, de um professor para outro. “Muitas vezes nós, professores, nos surpreendemos com uma situação que não se imaginou. O que precisamos fazer é nos comunicar e pensar que há uma intenção comum. Todos nós acreditamos e queremos que todos os alunos possam ingressar e concluir sua formação. É preciso criar o hábito de debater isso de maneira conjunta.”

O coordenador geral do Diretório Acadêmico da Faculdade de Farmácia, Renan Augusto de Souza, ressalta que a ideia para realização do evento surgiu de uma observação. Segundo ele, “muitas pessoas na faculdade buscavam o atendimento oferecido pela Pró-Reitoria de Assistência Estudantil ou utilizavam algum tipo de medicamento relacionado à depressão ou ansiedade.” Diante deste cenário, o Diretório se mobilizou para trazer os palestrantes e compor o simpósio como uma forma de mostrar aos alunos que a comunidade acadêmica zela por eles. Ele  afirma, ainda, que ter o espaço para discutir o assunto é muito importante. “Já é algo que acontece na Universidade, mas o Simpósio dá um impulso para que mais eventos e discussões venham a ocorrer”.

O evento continua nesta sexta-feira, 31, no anfiteatro 3 do ICH, com mais uma série de palestras. Confira aqui a programação.

Outras informações: (32) 2102-3803 (Faculdade de Farmácia)

Leia mais

Melhorar laços afetivos ou tomar remédios para aliviar tristeza e comportamentos?