Joana de Souza Machado pesquisa o papel do Estado em atender as demandas por justiça (Foto: UFJF/Arquivo)

Joana de Souza Machado pesquisa o papel do Estado em atender as demandas por justiça (Foto: UFJF/Arquivo)

Dando continuidade à série de entrevistas com a equipe administrativa que compõe a nova estrutura da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), serão apresentadas a seguir algumas propostas da pró-reitora de de Apoio Estudantil e Educação Inclusiva, Joana de Souza Machado. A equipe de Comunicação da UFJF conversou com ela sobre os principais desafios do cargo e as primeiras diretrizes definidas para a pasta. O objetivo da série é mostrar de forma transparente a toda comunidade universitária o que pensa e como pretende atuar cada integrante da equipe indicada pelo reitor Júlio Chebli e pelo vice Marcos Chein.

Com menos de dez anos de formada, mas já com doutorado em fase de conclusão, pode-se dizer que Joana é um exemplo da qualidade da formação oferecida pela Faculdade de Direito da UFJF. Professora do Departamento de Direito Formal e Ética Profissional, Joana vem pesquisando, no Brasil e em Harvard (EUA), o papel do Estado em atender as demandas por justiça. É justamente esse olhar acerca de justiça que ela pretende trazer para a pró-reitoria. Entre os planos para a área, estão a descentralização da assistência estudantil, responsável pelas análises socioeconômicas, e mais ênfase aos setores de psicologia e pedagogia da pró-reitoria; a discussão dos critérios de vulnerabilidade adotados pelos editais da UFJF e um amplo debate junto aos alunos a respeito das diretrizes dos programas de Apoio Estudantil, proposta anunciada ainda em campanha pelo novo reitor. Confira a seguir trechos da entrevista.

– Como você recebeu o convite de fazer parte da Administração Superior e de atuar na Pró-reitoria de Assistência Estudantil e Educação Inclusiva?

Recebi com bastante surpresa, porque meu tempo de retorno à casa é bastante recente. Imaginava fazer uma trajetória aqui dentro mais longa. Mas recebi também com alegria, porque esta área de apoio estudantil me sensibiliza. Tenho formação no Direito, não sou assistente social, mas dentro do Direito sempre procurei fazer discussões de interface com a educação, principalmente, envolvendo educação pública, orçamento público, direitos fundamentais e em como o Estado realiza a resposta por essas demandas por justiça, seja na área de distribuição econômica ou na área de reconhecimento cultural. Imaginei que poderia contribuir nesse sentido, pensando em como ressignificar a ideia de assistência estudantil, porque me parece que ainda está muito associada a uma noção puramente financeira e assistencialista. Até mesmo nossa ideia de mudar o nome da pró-reitoria vem desta proposta de alargamento e ressifignação da ideia de apoio para além de uma relação só financeira, mas de acolhimento deste aluno na sua diferença cultural e econômica, para democratizar não só o acesso, mas manutenção dele na universidade, para que ela possa se sentir parte.

– A equipe se manteve? Como ela está organizada?

Sim, continua a mesma, e é uma equipe que conta com colaboradores recém-chegados. Muitos não tinham dimensão da atuação da pró-reitoria. Por isso, o primeiro desafio é que a equipe passe a se comunicar e atuar de maneira mais colaborativa, integrada, e já percebo uma tentativa de união. Nossa primeira atuação foi promover uma bateria de reuniões, para que todos possam fazer sugestões.

– Quais principais ações pretende desenvolver como pró-reitora?

Começando, talvez, pela importância do serviço social dentro da pró-reitoria. Isso porque a equipe precisa fazer o tempo todo análise socioeconômica das pessoas, dos alunos, e pretendemos descentralizar isso, deixando bem clara essa prestação de serviço. A análise socioeconômica precisa ser realizada por pessoal especializado, e estamos criando uma coordenação só para assistência estudantil. Nesta nova estrutura, na qual os processos vão ganhar com a autonomia desses profissionais, a melhor contribuição que uma pessoa da minha área pode dar é pensar nas políticas públicas de Estado. Costumamos estudar esta questão de demanda por justiça não só a partir da distribuição de riquezas. O Estado precisa se responsabilizar por isso e, nesse sentido, as bolsas são muito importantes sim, porque precisamos continuar fazendo um esforço para que o apoio continue sendo universal, ou seja, para todo mundo que precisar. Mas, a gente entende que a demanda por justiça e por permanência na universidade não passa só pela questão financeira, e pretendo propor uma atuação mais abrangente dos setores de psicologia e pedagogia. Como o aluno pode se sentir pertencente não só porque ele hoje consegue ficar aqui, mas porque a Universidade o enxerga na sua diferença, não o quer padronizar ou tentar reduzir o universo a uma certa categoria de alunos.

– Como isso pode ser feito?

Temos tentado pensar em oficinas na área da psicologia e da pedagogia para que o aluno se sinta mais acolhido, pensando numa atuação agora mais integrada com a Pró-reitoria de Cultura e a recém-criada Diretoria de Ações Afirmativas, para que esses alunos, enfim, de um universo tão heterogêneo, possam se sentir acolhidos sem que tenham que se reduzir a um padrão dominante, a um padrão de alunado que já foi nosso público alvo, mas não é só esse mais.

– Além de implementar os programas de apoio estudantil, parece que você pretende imprimir um caráter mais crítico ou filosófico à área. É isso?

Vamos precisar incrementar muito a parte operacional de bolsas. Mas, sobretudo, temos que pensar no seguinte: o Estado vai promovendo políticas ou programas de apoio aos alunos e nós precisamos estar preparados não só para receber essas políticas, mas para questionar se elas são adequadas, se elas garantem autonomia universitária, qual o papel na universidade no diálogo direto com o Estado, e isso exige uma atuação interdisciplinar. Não podemos ser meramente um executor de políticas do Estado, precisamos ter capacidade de questionamento até para poder contribuir com a melhoria dessas políticas públicas.

– Desde que foi nomeada, o que tem exigido mais sua atenção?

Mesmo antes da divulgação da portaria, já tive semanas muito intensas aqui para tentar estabelecer essa relação com a pró-reitoria, percebendo, logo de início, um problema muito grave – a questão do espaço. A sala que a pró-reitoria começou a atender quando cuidava de 600 bolsistas continuou a mesma para cuidar de cinco mil bolsistas. A equipe aumentou e processos, papeis, arquivos, tudo estava coabitando o mesmo espaço. Percebi que a gente precisava sair numa corrida, que é da Universidade inteira, e eu tenho chamado de ‘guerra dos espaços’. Enquanto não temos a nova Reitoria, temos que pensar em ações provisórias, mas emergenciais. Primeiro, fizemos um mutirão para perceber ali o universo que estava aguardando nossas providências. Conseguimos passar o arquivo para a sala de atendimento, que não era adequada para isso, pois tinha só divisórias e não havia privacidade. E redirecionamos, provisoriamente, o atendimento para a sala da Ouvidoria. Conseguimos um gabinete para a pró-reitoria, onde eu também faço o atendimento ao público e onde fazemos reunião de equipe. Tudo isso permitiu um distanciamento para enxergarmos melhor os problemas da pró-reitoria.

– Qual sua percepção sobre a situação do Apoio Estudantil na UFJF, em relação ao programas e bolsas oferecidas?

Na última gestão a UFJF fez um esforço muito grande para investir verba própria de seu orçamento para complementar a verba recebida do Governo pelo Pinaes. Se chegava R$ 10 milhões do Governo, ela colocava mais R$ 10 milhões para atender esse compromisso do apoio universal, todo aluno que precisa e consegue comprovar, recebe a bolsa. Mas o Governo criou um novo programa, chamado “Bolsa Permanência”. Alguns requisitos desse programa fazem com que ele tenha uma abrangência pouco explorada na Universidade, pois só contempla o aluno do curso que tenha carga horária média de cinco horas diárias. Atualmente, só os cursos de Medicina e Enfermagem fazem jus a esses requisitos. Alguns dos nossos alunos migraram da bolsa manutenção para a permanência, com a premissa que isso seria interessante para a Universidade, pois ela poderia realocar os recursos em outras áreas ligadas ao ensino, ou seja, daria uma ‘folga’ para ela continuar com essa política de apoio universal. Mas temos verificado alguns problemas nesse programa. Ele é recém-criado, de 2013, e ficamos numa postura mais passiva, pois quem gerencia é o Ministério da Educação. Não há um canal para nós cobrarmos, procurarmos saber o que está acontecendo. Assim, uma questão que vamos precisar ver com bastante cautela é em que sentido a bolsa permanência pode ser a grande aposta da Universidade? Ser for, temos que auxiliar essa política do MEC. A bolsa tem um valor até mais alto do que a praticada aqui (R$ 400), mas não é acumulada com outros benefícios e talvez o aluno fique com a sensação de que a situação dele antes do “Bolsa Permanência” era melhor. Então, há uma série de discussões a serem feitas.

– De que forma essas discussões terão andamento?

Temos a intenção de realizar um seminário ainda esse ano, algo que foi anunciado pelo reitor e o vice-reitor em campanha. Eles pretendiam fazer uma grande discussão sobre apoio estudantil com toda a universidade a partir de um seminário para discutir pontos-chave que vêm sendo alvo de questionamento de alunos e da própria equipe de Apoio. O Bolsa Permanência será uma aposta da Universidade? Nos vamos reformular a carga horária de outros cursos? Alguns estão bem próximo disso, possuem 4,8 horas de carga por dia. Essa é uma das pautas do seminário, mas temos várias outras. A bolsa manutenção hoje possui uma contrapartida do aluno, ele precisa estar disponível 12 horas semanais para envolvimento em algum projeto registrado na Pró-reitoria. Mas nós temos poucos projetos registrados, e a maioria dos bolsistas não são encaminhados. E há o questionamento se isso deveria continuar obrigatório ou não, a representação discente acha que não. São assuntos que precisamos retomar para percebermos o melhor caminho para continuarmos falando em apoio universal

 – Existe uma expectativa de ampliação dos valores das bolsas? Você mesmo comentou que a UFJF alocou recursos próprios, além daqueles provenientes do Pinaes, no pagamento das bolsas. O que o reitor compartilhou com você sobre o planejamento financeiro dessa área?

Eles me disseram que vão manter o compromisso do apoio universal, mas cada vez mais nós vamos enfrentando um desafio maior. A cada ano temos mais alunos que precisam dessas bolsas e os recursos que vêm do MEC são limitados. Algumas soluções que já se apontam seriam: buscar mais recursos do Governo, por exemplo, esse Bolsa Permanência, e fazer uma avaliação dos nossos próprios critérios que definem a ideia de vulnerabilidade do aluno. A sensação não só por parte dos bolsistas, mas compartilhada pela equipe, é de que na análise dessa vulnerabilidade há uma margem de injustiça. O critério é só a renda per capita, nós não acolhemos outras variáveis adotadas por outras universidades. Teríamos que reanalisar esses critérios.

– Comente sobre outros planos que deseja desenvolver

Além de ressignificar a ideia de apoio, sofisticar o serviço de psicologia e pedagogia, que hoje é algo muito individualizado, precisamos aprimorar com certa urgência a comunicação da pró-reitoria com os alunos. Vou tentar estudar junto ao CGCO mecanismos de comunicação mais eficientes, pois o que angustia nosso aluno é o fato de não ter resposta em um tempo razoável. A ideia é que o aluno conheça qual a trilha dos recursos até chegarem até ele, evitando o desgaste com a pró-reitoria. Se a gente consegue fazer uma comunicação mais estreita com o aluno, ele pode se tornar mais parceiro e menos combativo.

 – Existe formas de driblar esse processo burocrático de apresentação da documentação e possíveis atrasos de pagamento das bolsas? Como você pretende resolver essas situações?

Hoje a pró-reitoria é responsável por todo e qualquer processo de análise socioeconômica que seja realizado na Universidade, por exemplo, o cursinho pré-vestibular popular, as matrículas, os editais de apoio, as isenções de taxa de cursos de pós-graduação, etc. É uma atuação extremamente abrangente mas com uma equipe pequena para cuidar disso tudo, em um espaço muito pequeno, então, o calendário de análise socioeconômica não para, ele vai se acumulando. Estamos tentando rever se a pró-reitoria é o órgão mesmo responsável por todas essas análises, ver qual é caminho, conversar com os setores que serão impactados, encaminhar os processos para outros setores, para que possamos nos dedicar só ao apoio estudantil e aí ter tempo para pensarmos os critérios, um calendário de prazos para dar uma resposta ágil aos alunos, porque, como está, fazemos sempre um trabalho referenciado ao passado, sempre atrasado. Além disso, mudar a filosofia do recurso nos editais. Atualmente, o recurso é utilizado como uma possibilidade de o aluno apresentar um documento que ele não havia apresentado no início do processo, e isso é sem fim. Precisamos rever os editais para que eles sejam mais claros, mais explicativos. Temos conversado com a Comunicação para fazer vídeos explicativos com as assistentes sociais sobre a documentação que o edital traz. O aluno tem uma linguagem muito estética, não tem paciência para ler o edital, erra muito na hora de trazer documentação e sai prejudicado por isso, porque não consegue comprovar sua própria vulnerabilidade. Então, a gente está tentando pensar nesses mecanismos para sermos mais rigorosos e ao mesmo tempo mais ágeis nessa análise.

Outras informações: (32) 2102-3967 (Diretoria de Comunicação)

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