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Oito mulheres, um homem

Apresentação

Festas tradicionais, muita música, comidas típicas, café, pão de queijo, cachaça… Minas Gerais é isso e muito mais. É mais ou menos o que se quiser que seja, pois, como todo lugar, guarda em si imensas diferenças. Se Minas tem Ouro Preto, a Pampulha, as montanhas, tem também cidades onde vive um povo do qual pouco se fala. Que não compôs músicas que atravessaram os mares, mas possui a própria arte. Não é identificado por sua culinária, mas se vira muito bem na comida de cada dia. Que envelhece após décadas de luta pela sobrevivência, vê os filhos, netos e bisnetos seguirem outros caminhos, e que continua tentando dialogar com essas novas gerações.

Nove Histórias Mineiras conta um pouco da vida de cidadãos de Minas Gerais. São velhos trabalhadores – oito mulheres, um homem – que vivem em Juiz de Fora, no Dom Bosco, um bairro pobre, cercado de muita riqueza. Com idades entre 70 e 90 anos, muitos deles migraram do campo para a cidade ainda pequenos, viveram as mudanças de trabalhar na roça quando crianças e ter depois que conseguir emprego com pouca ou nenhuma escolaridade. Foram ser empregadas domésticas, lavadeiras, fazer biscates, poucas conseguiram se transformar em operárias.

Acompanharam grandes transformações urbanas: da época dos bondes para o perigo de ser atropelado nas vias de maior movimento; de amassar barro nos trilhos dos morros à dificuldade de se conseguir um ônibus para ir ao centro receber a aposentadoria; de ser empregado nas indústrias têxteis a ver essas fábricas fecharem, na decadência da ex-Manchester mineira. Tudo isso misturado com muita festa e alegria de viver, dos namoros nos bailes de antigamente ao radinho onde ainda se ouve a música que faz lembrar tempos de mocidade.

As histórias que aqui são (re)contadas foram colhidas em entrevistas conduzidas pela assistente social e doutora em Serviço Social Josimara Delgado, professora da Universidade Federal da Bahia, que foi docente da Universidade Federal de Juiz de Fora. Coordenadora dos projetos “Envelhecimento e Memória” e “Espaços Sociais, Envelhecimento e Relações Geracionais”, da Faculdade de Serviço Social da UFJF, participou também do projeto “Comunicação, Memória e Ação Cultural”, coordenado pelo professor Bruno Fuser, aposentado pela Faculdade de Comunicação da mesma universidade.

Este livro surge, portanto, dessa parceria entre uma especialista em pesquisas sobre a velhice na classe trabalhadora e um professor que é jornalista e se dedica ao tema comunicação e cidadania. O projeto “Comunicação, Memória e Ação Cultural”, com apoio da Fapemig, desenvolveu atividades de extensão e pesquisa durante dois anos no bairro Dom Bosco, e centrou-se na produção cultural a partir de oficinas em que assumiu importância central a construção de histórias de vida dos velhos e as narrativas sobre o bairro, com participação de integrantes de outras gerações.

Trazemos aqui uma pequena mostra desse trabalho. As histórias de vida foram todas gravadas e transcritas, sob a coordenação de Josimara Delgado, com a colaboração de bolsistas da UFJF. O texto final foi produzido por Bruno Fuser, que buscou reescrever as centenas de páginas das transcrições de forma a permitir a leitura mais agradável possível, tomando algumas liberdades mas respeitando sempre a fala e as principais marcas identitárias de nossas personagens: Tercina, Percília, Vera, Dorinha, Isaías, Emília, Teresa, Maria Aparecida e Conceição. As ilustrações são de Marlene Crespo, que conferem ao livro a poesia e a leveza de sua arte.