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Computador para poucos… Ou quase ninguém

Por Carolina Soares
15 de outubro de 2007

 

Algumas das políticas governamentais para estimular o acesso à informática passam pelo fornecimento de computadores às escolas públicas, como o Programa Nacional de Informática na Educação, o ProInfo, criado em 1997. A princípio, além de promover a tão falada inclusão digital, o uso destas máquinas seria a solução para um problema bem mais antigo: a deficiência do ensino público no país. Mas, até que ponto o uso de computadores nas escolas interfere no processo de aprendizagem?

Para entender melhor o assunto, podemos observar os alunos da Escola Municipal Coronel José de Salles, da comunidade de Orvalho, município de Lima Duarte. Eles não têm acesso à informática na escola. Nem fora dela. As professoras realizaram uma consulta com alunos da 1ª à 4ª série, do Ensino Fundamental. Foi feita a eles 1uma pergunta simples: quem já teve contato com um computador? Ficou claro para as crianças que bastava apenas chegar perto, mexer ou brincar para responder SIM. No entanto, das 49 crianças consultadas, 34 responderam NÃO, nunca tiveram a oportunidade de usufruir, de qualquer forma, das ‘maravilhas da informática’. Entre os quatorze alunos matriculados na 1ª série, por exemplo, apenas um já teve contato com computador e, mesmo assim, para “jogar videogame”.

Fora da escola, a situação não é diferente. A comunidade de Orvalho tem pouco mais de cem casas, oito delas com computador. Apenas uma família tem acesso à Internet. A “era digital” já chegou ao posto de saúde e ao Centro Comunitário, que recebeu dois computadores, com Windows 95, sem Internet, doados pelo Instituto Cidade, do Governo Federal, para uso do grupo de artesanato.

A escola de Orvalho tem, ao todo, 94 alunos e nenhum computador. Das treze escolas públicas do município de Lima Duarte, é a única que ainda não informatizou a sua secretaria. As provas e trabalhos para as crianças continuam sendo rodados em um mimeógrafo. Cristiane de Almeida Borges, diretora da escola, afirma que já recebeu um teclado e um monitor e em breve o computador será instalado para realizar os “trabalhos internos”. Ou seja, para os alunos e professores de Orvalho não vai mudar muita coisa.

Dá pra viver sem computador

A pedagoga Dulcimar Otaviano Lima, supervisora de ensino da escola, diz que “ajudaria se tivesse computador, mas dá para viver sem”. E, pelo visto, dá mesmo. A Coronel José de Salles é a escola com o melhor resultado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, o IDEB, em Lima Duarte e a quarta na região que engloba Juiz de Fora e as cidades vizinhas com menos de 200 mil habitantes. Enquanto a média nacional dos alunos de escolas municipais é 3.4, as crianças da escola de Orvalho acertaram mais de 50% da avaliação.

Dulcimara Otaviano Lima afirma também que, apesar de um computador fazer falta, o mais urgente é a melhoria do espaço físico das escolas, como salas de aula, por exemplo. Na escola de Orvalho não há secretaria ou sala para os professores. O computador, quando chegar, deve ficar na cantina.

Gizélia Santos, secretária de Educação de Lima Duarte, destaca que o uso de computadores poderia ser uma alternativa para o trabalho com “alunos com dificuldade para alfabetização”, mas não existe nenhum projeto para a instalação de computadores nas salas de aula do município. Ela justifica que existem outras prioridades para melhorar a qualidade da educação, com enfoque na área pedagógica. “O computador pode ajudar, mas quem ensina é o professor”, afirma Gizélia.

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Mocinho ou bandido

Além de não resolver, o computador pode criar outros problemas, é o que afirma Cristiane de Almeida Borges. De acordo com a diretora da escola de Orvalho, o uso de computadores durante as aulas pode fazer com que os alunos se distraiam, principalmente em salas com muitas crianças.

Cristiane diz que seria necessária a construção de uma nova sala para aulas específicas de informática, com professores especializados. No entanto, a capacitação de professores pode ser outro obstáculo para se promover o acesso à informática através das escolas: das seis professoras que trabalham na escola Coronel José de Salles, apenas a metade possui computador em casa. Mas Gizélia Santos discorda. Segundo a Secretária de Educação não seria necessária a contratação de um especialista. Os professores precisariam ser capacitados, mas “dariam conta do trabalho”.

O buraco é mais em baixo

Parece que todos concordam que o uso de computadores nas escolas ajudaria, mas está longe de resolver os problemas de uma criança que sai de casa às 5h da manhã para pegar a Kombi escolar, como é o caso de alguns alunos da zona rural que estudam em Orvalho. As dificuldades enfrentadas por alunos e professores são tantas que uma das professoras da escola diz que uma máquina de tirar xerox já ajudaria muito o seu trabalho: “só de não ter que rodar provas e trabalhos no mimeógrafo eu ficaria feliz”.

Dulcimar Otaviano afirma que o acesso à informática é fundamental para alunos e professores como indivíduos, “para acompanhar os avanços que estão acontecendo”. Cristiane de Almeida Borges concorda e vai além, diz que o contato com computadores não deve ser feito apenas através da escola porque ficaria restrito aos alunos. Para promover a inclusão digital seria necessário criar centros de informática que atendessem toda a comunidade. Mas, por enquanto, em Orvalho, nem na escola, nem fora dela.