No cenário da emergência sanitária causada pela atual pandemia, pesquisas realizadas por cientistas brasileiros se destacaram no cenário acadêmico internacional, seja por terem um alto nível de qualidade ou por seu elevado fator de impacto. Entre os responsáveis por esses estudos estão pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora, autores do artigo que demonstra como o vírus da Covid-19 se alastrou nas mais diferentes regiões do território de Juiz de Fora durante os meses de março a novembro de 2020.
A abordagem, inovadora no país, permitiu verificar uma quantidade maior de casos notificados em bairros mais favorecidos, ao mesmo tempo em que os maiores números de hospitalizações e mortes por decorrência da doença aconteceram em bairros com maior índice de vulnerabilidade social. O estudo usou técnicas de análise espacial com modelos hierárquicos bayesianos, que têm sua aplicação principalmente na análise de dados de pequenas áreas, como é o caso dos bairros do município. O trabalho, realizado por integrantes do Grupo de Modelagem Epidemiológica da Covid-19, foi publicado na Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical.
Os pesquisadores Fernando Colugnati e Mário Nogueira, professores da Faculdade de Medicina da UFJF, explicam o diferencial das análises. “A maioria dos atuais estudos compara a situação epidemiológica de diferentes estados de um país ou entre diferentes localidades, fazendo assim uma análise mais geral. O nosso trabalho explora dados de um município de médio porte, segundo a classificação do IBGE, relacionando os bairros da cidade, classificados a partir do Índice de Vulnerabilidade em Saúde (HVI, sigla em inglês), com os números de casos suspeitos, confirmados, hospitalizações e mortes pela doença.”
Questão de ética: compromisso de manter dados de moradores anônimos
Para que as análises presentes no estudo fossem possíveis de serem realizadas, foi firmada uma parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de Fora, que compartilhou dados epidemiológicos sensíveis (que continham os locais de residência exatos dos pacientes) diretamente para os pesquisadores envolvidos. Colugnati explica que, mediante a aprovação do estudo na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, foi realizada a assinatura de um termo de sigilo entre as partes, garantindo assim que os pesquisadores utilizassem ferramentas de anonimização dos dados recebidos para que a privacidade de todos fosse mantida.
Dados epidemiológicos do período e metodologia utilizada
Entre março e novembro de 2020, o município de Juiz de Fora registrou 30.071 casos suspeitos de Covid-19, com 8.063 confirmações. Deste quantitativo, 1.186 pessoas precisaram ser hospitalizadas e 376 vieram a óbito. O estudo dividiu o período em três momentos: entre os meses de março e maio, foi observado um aumento exponencial no número de casos na cidade. Já entre junho e agosto, os casos continuaram em um patamar alto, que foi reduzido entre os meses de setembro e novembro. No final do último período, foi constatado outro aumento exponencial no nível de casos registrados.
Dificuldade de acesso a testes em regiões de maior vulnerabilidade social
A partir da metodologia, foi possível aferir que as regiões urbanas de maior vulnerabilidade social apresentaram número menor de casos confirmados, ao mesmo tempo que apresentam maior risco de internações e óbitos pela doença. “O Índice de Vulnerabilidade em Saúde deixa claro que o acesso aos testes era muito mais difícil nos bairros com maior vulnerabilidade. Em meados de 2020, cerca de 60% dos testes eram realizados na rede privada, e não pela Prefeitura. Isso demonstra que, na verdade, existia uma falta de acesso a esses testes na rede pública, que é aquela que a maioria da população dos bairros com índices de vulnerabilidade mais baixos teriam acesso”, analisam Colugnati e Nogueira.
Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU
A Coordenação de Divulgação Científica da Diretoria de Imagem Institucional, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), está promovendo uma estratégia de fortalecimento das ações de pesquisa da Universidade, mostrando que estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade.
A pesquisa citada nesta matéria está alinhada aos ODS 3 (Saúde e bem-estar) e 9 (Indústria, inovação e infraestrutura).