Alessandra Brum, professora do curso de Cinema e Audiovisual, é a nona convidada do programa IdPesquisa, disponível nos canais digitais da Universidade (Foto: UFJF)

O resgate da memória do cinema em Minas Gerais – que atravessa décadas e gerações – tem sido um trabalho constante de pesquisadores e cineastas do estado. Uma dessas ações é o projeto Minas é Cinema, coordenado pela professora Alessandra Brum, do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e dos Programas de Pós-Graduação em História (PPGH) e Artes, Cultura e Linguagens (PPGACL). A iniciativa é tema do nono episódio do programa IdPesquisa, disponível nas plataformas digitais da Universidade.

A principal intenção é resgatar o legado cinematográfico de mais de 100 municípios da Zona da Mata mineira, com foco nas publicações sobre cinema entre 1897 e a década de 1960. Criado em 2013 e financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o “Minas é Cinema” já se tornou uma referência na pesquisa cinematográfica do estado e está inserido na linha de pesquisa Cinema e Audiovisual do Programa de Pós-graduação em Artes, Cultura e Linguagens (PPGACL). 

Os integrantes do projeto buscam informações em arquivos históricos locais, como publicações de jornais e revistas. Todo o material é digitalizado e disponibilizado no site do Minas é Cinema que, segundo Alessandra, possibilita que outros pesquisadores tenham acesso a esses materiais, impulsionando novas pesquisas. 

 A gente vai em busca dessas pessoas que guardam esse material para digitalizá-lo e publicá-lo no site do projeto. Por isso, o Minas é Cinema se torna também um projeto de extensão. O que fazemos é uma história pública, que vai além dos muros da Universidade – Alessandra Brum

Segundo a pesquisadora, a ideia de iniciar o projeto surgiu da necessidade de investigar e compreender as produções cinematográficas de fora dos grandes centros. A proposta, afirma Alessandra, não é apenas estudar o cinema, mas também reescrever a história da sétima arte no Brasil, a partir de uma perspectiva mais local.

De acordo com Alessandra, a maioria das pesquisas está focada no eixo Rio-São Paulo. “O projeto se desvia desse escopo e adota uma perspectiva regional, pois acreditamos que a separação entre o nacional e o regional não faz mais sentido. Nosso objetivo é reescrever a história do cinema brasileiro a partir desses universos até então desconhecidos. Afinal, até o momento, a grande maioria das pesquisas se concentra nesses dois centros.”

Em 2024, o Minas é Cinema recebeu o selo Saberes Históricos por atender à carta de princípios do Fórum Saberes Históricos, ação que reúne associações profissionais e diversos coletivos que se mobilizam para estabelecer compromissos éticos em relação à produção e difusão de saberes. 

Banco de dados
O Minas é Cinema também conta com um banco de dados que reúne informações sobre os filmes e espaços de exibição cinematográfica de Juiz de Fora. Este banco contém dados de sete salas de cinema que, ao longo do século XX, foram gerenciadas pela Companhia Central de Diversões. As salas que faziam parte dessa companhia eram: Auditorium, Central, Glória, Palace, Popular, Rex e São Matheus.

De acordo com a pesquisadora, esse levantamento foi possível graças ao trabalho realizado por Waltencir Parizzi, funcionário da antiga Companhia. Após sua aposentadoria, Parizzi doou ao Arquivo Central da UFJF dois álbuns contendo panfletos publicitários das obras cinematográficas exibidas entre 1944 e 1957 nessas sete salas. No banco de dados, é possível acessar esses panfletos, organizados por mês e ano.

Materiais encontrados em arquivos são digitalizados e disponibilizados no site do Minas é Cinema (Foto: UFJF)

Atualmente, a pesquisa passa por uma segunda fase, que se concentra no levantamento de materiais sobre as atividades cinematográficas realizadas em Juiz de Fora, com ênfase em arquivos históricos provenientes da Prefeitura e de igrejas locais.

“Nessa nova fase da pesquisa, em que o objetivo é adicionar novos cinemas ao banco de dados, um dos pesquisadores da equipe visitou o arquivo de uma igreja católica e, ao consultar um jornal, descobriu a existência de um cinema em Juiz de Fora que desconhecíamos. O nome desse cinema era bastante curioso, é Cineminha do Guri. Isso demonstra o potencial da pesquisa e como estamos resgatando memórias, valorizando o patrimônio audiovisual da região e da cidade de Juiz de Fora”, destaca a pesquisadora.

Essas ações fazem parte das metas do projeto. Entre elas está o preenchimento das lacunas na programação das sete salas de cinema gerenciadas pela Companhia Central de Diversões, entre 1944 e 1957. Em seguida, o objetivo é mapear os filmes exibidos nesses espaços antes de 1944 e após 1957. A terceira e última meta é incluir as demais salas de cinema que existiram em Juiz de Fora, sejam elas localizadas no centro da cidade ou nos bairros.

Trabalho nos arquivos
As visitas aos arquivos da cidade e a pesquisa em periódicos antigos são fundamentais para a construção da memória cinematográfica e, consequentemente, para o desenvolvimento do projeto. Parte da equipe é composta por bolsistas e estudantes do curso de Cinema e Audiovisual da UFJF, como é o caso de Maria Antônia Quintana, que atualmente realiza pesquisas no Arquivo Central da Universidade em busca de novas descobertas sobre os cinemas de Juiz de Fora. Maria Antônia trabalha no escaneamento de documentos relacionados à história dos cinemas da cidade nas décadas passadas, além da organização digital dos arquivos para facilitar o acesso a cada um deles. 

“O Minas é Cinema é um projeto muito essencial, e pode servir de ótimo exemplo”, avalia Maria Antônia Quintana (Foto: arquivo pessoal)

“Uma das coisas que mais me deixa encantada pelo projeto, é a possibilidade de estar em contato com arquivos tão antigos e tão importantes como os que a gente lida. Trabalhamos, no momento, com recortes de jornais, pôsteres promocionais e tantos outros documentos que datam em torno de 1950. São verdadeiras preciosidades”, reflete. 

Apesar disso, para a estudante, a preservação de memórias audiovisuais no Brasil foi muito negligenciada, o que levou à perda de muitos arquivos sobre o tema. “O Minas é Cinema é um projeto muito essencial, e pode servir de ótimo exemplo para que mais pessoas comecem a pesquisar mais sobre o passado audiovisual brasileiro e preservar o que ainda pode ser acessado.”

“O que mais gosto é a possibilidade de entrar em contato com um material muitas vezes praticamente ignorado, mas que é riquíssimo”, avalia Victor Amaral Palha (Foto: arquivo pessoal)

Por sua vez, o estudante Victor Amaral Palha, também bolsista do projeto, pesquisa, organiza e digitaliza documentos referentes ao cinema em Minas Gerais, que vão de contratos e recibos a recortes de jornais com críticas cinematográficas, fotografias, entre outros.

“O que mais gosto no projeto é a possibilidade de entrar em contato com um material muitas vezes praticamente ignorado, mas que, no entanto, é riquíssimo. Agora que estamos digitalizando o material do antigo Centro de Estudos Cinematográficos de Juiz de Fora, é muito valioso entrar em contato com o modo de pensar, estudar e discutir cinema naquela época. A impressão é a de estar lidando com o trabalho de pessoas que poderiam ser nossos colegas de curso, se vivessem hoje”, comenta Palha.

Laboratório de Narrativas Audiovisuais
Outra iniciativa existente no âmbito do Minas é Cinema é o Laboratório de Narrativas Audiovisuais (LANAv), voltado à gravação de entrevistas a personalidades, cineastas, técnicos e pesquisadores que se dedicaram ou se dedicam às atividades cinematográficas em Minas Gerais e no Brasil. As entrevistas podem ser assistidas pelo site do Minas é Cinema. 

Ouça o episódio do IdPesquisa em áudio: 

Outras informações:

Minas é Cinema 
Laboratório de Narrativas Audiovisuais
CPCine – História, Estética e Narrativas em Cinema e Audiovisual
Programa de Pós-Graduação em Artes, Cultura e Linguagens