“Ser africano é um orgulho. Principalmente sabendo que a África é o berço da humanidade”. Estas palavras são do Professor de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Eudésio Eduím da Silva. Nascido e crescido em Guiné-Bissau, o docente atravessou quase cinco mil quilômetros para chegar à UFJF, inicialmente como estudante de doutorado, por meio do Programa de Estudantes / Convênio de Pós-Graduação (PEC-PG). Após os estudos, Eduím retornou ao campus – mas, dessa vez, como professor.
O docente também é um dos principais idealizadores do evento em homenagem ao Dia da África, que acontece a partir das 14h nesta quinta-feira, 25 de maio, na Reitoria da UFJF, sob o tema “A África não é um país!”.
A escolha pela Economia como ferramenta de mudança social
Desde cedo, Eudésio Eduím mostrou-se sensível a questões sociais. Segundo ele, ao se deparar com os conceitos e complexidades do campo de estudo da Economia, compreendeu que, para intervir em uma realidade social que considerava inadequada, precisaria de ferramentas quantitativas para um diagnóstico preciso.
O guineense afirma que a escolha pelo Brasil foi devido à semelhança entre o país e as nações africanas. Embora Portugal fosse uma opção, o docente considerou a economia portuguesa muito distinta para os seus propósitos. “Já o Brasil possui um setor agropecuário muito forte, uma das características semelhantes à Guiné-Bissau e à parte dos países da África.”
Antes de estudar e estabelecer-se em Juiz de Fora, a primeira parada brasileira de Eduím foi na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em 2004, instituição onde se formou e fez mestrado em Economia. Em 2014, veio para a UFJF para cursar o doutorado. Tanto o Programa de Estudantes / Convênio de Graduação (PEC-G) e de Pós-Graduação (PEC-PG) são iniciativas dos ministérios das Relações Exteriores e da Educação, conhecidos por oferecer oportunidades de formação superior a cidadãos de países com os quais o Brasil mantém acordos educacionais e culturais.
Os desafios culturais
Apesar das semelhanças com Guiné-Bissau, muitas questões se tornaram um desafio para Eduím durante a mudança de país. Ao chegar em terras brasileiras, apesar de ter sido bem recebido, o professor relata o impacto das diferenças culturais, a começar pelo idioma. “Apesar de falarmos português, existem algumas peculiaridades na fala de cada região. Uma vez, um professor brasileiro não entendeu uma apresentação devido à minha fala. Além disso, existem alguns costumes, como o uso de roupa ou expressões, que chamam a atenção.”
Outro ponto marcante é sobre as manifestações religiosas que, para o professor, ainda falta entendimento por parte dos brasileiros e de outras nações. “Nós não temos uma instituição religiosa que nos rege. A manifestação religiosa é encarada no nosso dia a dia como se fosse uma cultura. Ela é, na maioria das vezes, mais familiar. Cada família tem o seu modo, tem a forma como cultua os seus ancestrais”, pontua o economista.
O que o Brasil e o mundo precisam aprender com os países africanos?
Para o professor, o nosso país e o mundo ainda precisam aprender a valorização e o cuidado com o meio ambiente – algo que afeta diretamente o desenvolvimento econômico e é considerado fundamental em seu país de origem. Há muitos séculos, o continente africano sofre com uma série de problemas relacionados às esferas política, social e econômica. Nas últimas décadas, porém, em adição à grave situação enfrentada, a preocupação dos especialistas recai de forma intensa e significativa na questão ambiental, suas origens, consequências e meios de reversão.
“A forma como lidamos com o meio ambiente, de entendermos que é uma manifestação divina, é o que nos garante a capacidade de nos conectar com o ser divino ou não. É preciso que o mundo entenda que parte dos recursos não é renovável e as gerações terminam sucessivamente”, reforça.
Dia da África
Celebrado anualmente no dia 25 de maio, o Dia da África será comemorado na UFJF com o tema “A África não é um país!”. O objetivo é conscientizar a comunidade acadêmica e a sociedade em geral sobre a diversidade de um continente composto por 54 países, com o maior número de etnias e línguas.
Hoje, a UFJF conta com 43 alunos representantes de 13 países do continente africano: Angola, Benim, Cabo Verde, Camarões, Gabão, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Namíbia, Nigéria, República do Congo, São Tomé e Príncipe e Senegal.
Eduím é um dos idealizadores do evento que acontece nesta quinta-feira, 25, e defende que, mais que comemorar a data, é preciso que as pessoas entendam o seu significado: marcar a fundação da Organização da Unidade Africana (OUA), em 1963, hoje conhecida como União Africana. A entidade foi criada em prol da libertação africana frente ao massacre e a exploração do colonialismo europeu.
Na programação do Dia da África, o professor será responsável pela palestra sobre a importância da ancestralidade na vida dos povos africanos e a evolução desta vivência para além da religiosidade, trazendo informações em grupos familiares e comunidades. Detalhes sobre o evento completo podem ser conferidos no site da UFJF.