Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), consumo de café no Brasil cresceu 1,7% em 2021 (Foto: Wenderson Araujo/Trilux)

Figurando entre as bebidas mais consumidas em todo o mundo, o café é quase uma unanimidade nos lares brasileiros. Não à toa o país é o maior produtor e exportador mundial do grão como commodity, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, da sigla em inglês). Dentre as espécies produzidas em escala comercial, destaca-se a Coffea arabica L., conhecida por suas propriedades sensoriais mais aguçadas, o que eleva seu preço de mercado. Quanto às condições que influenciam nas características finais do café, o local de produção é comprovadamente um fator que atua sobre os genótipos das espécies cultivadas. 

Os grãos verdes das espécies selecionadas foram submetidos à espectroscopia para identificar substâncias determinantes no processo de localização geográfica da produção (Foto: Tony Oliveira/CNA)

É neste contexto que pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) aplicaram a espectroscopia para determinar a origem geográfica dos grãos de café produzidos em Minas Gerais. Divulgada na revista Current Research in Food Science – Classificação geográfica de origem dos grãos de café verde (Coffea arabica L.) produzidos em diferentes regiões do estado de Minas Gerais por FT-MIR e quimiometria –, a pesquisa objetiva fornecer um meio de autenticar o café produzido em regiões tradicionais do estado e já associadas a um produto de qualidade pelos consumidores. 

Atualmente, o processo de determinação geográfica do café é feito por provadores treinados, o que acaba por alongar o tempo de análise e sujeitar o controle ao risco de erros humanos, além de depender da avaliação individual. Com isso, há uma demanda por estabelecer um método preciso, rápido, eficaz e que possa agregar valor ao produto final. Dessa forma, os pesquisadores almejam valorizar as marcas identificadas pela região de produção, bem como a proteção contra eventuais adulterações.

Equipamento utilizado por Virgílio dos Anjos cria vidro para verificar espectro da amostra (Foto: Carolina de Paula)

Fatores ambientais como altitude, clima, solo, bioma, temperatura, insolação e precipitação têm maior impacto no surgimento de compostos químicos presentes no grão cru e que são fundamentais para a produção de cafés especiais.

Cafés de um mesmo genótipo e produzidos em maiores altitudes apresentam aumento dos teores de açúcares, como a sacarose, além de lipídios, aminoácidos, trigonelina e dos isômeros do ácido clorogênico. Por consequência, os cafés de maior qualidade são encontrados nesses locais. 

Espectroscopia e estatística

Os testes foram realizados no Grupo de Engenharia e Espectroscopia de Materiais (GE2M), do Laboratório de Espectroscopia de Materiais (LEM), do Departamento de Física, coordenado pelo professor Virgílio dos Anjos. A professora do Departamento de Física da UFJF e uma das integrantes da pesquisa, Maria José Bell, explica que o projeto utiliza a metodologia de espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR), empregada em laboratórios de pesquisa e na indústria para compreender a estrutura de moléculas individuais e a composição de certas misturas. 

Professora Maria José considera que o principal desafio para que a técnica possa ser empregada comercialmente é a redução de custos (Foto: Carolina de Paula)

“A luz infravermelha é incidida sobre a amostra e, para cada substância, é absorvida de maneira diferente. Ao final, têm-se um espectro baseado na diferença de padrões vibracionais, tornando possível identificar a ‘digital’ da molécula e da amostra”, detalha.

O professor Marcone de Oliveira, do Departamento de Química, realizou a análise estatística multivariada por meio da quimiometria dos componentes identificados nas amostras. “Os resultados discriminaram com precisão a região originária de produção dos grãos, mostrando que a espectroscopia infravermelha associada a ferramentas estatísticas identificaram o ácido clorogênico, trigonelina e ácidos graxos como marcadores da origem geográfica dos grãos verdes de café”.

No estudo, foram utilizados grãos verdes de diferentes genótipos: Catuaí Amarelo, Catiguá MG2, Topázio MG 1190 e Mundo Novo. A amostragem dos testes foi feita com quatro regiões produtoras de café: Sul de Minas, Cerrado, Norte de Minas e Matas de Minas. Para cada área considerada, foram coletadas amostras de três cidades distintas.

Para a amostragem dos testes, foram escolhidas quatro regiões produtoras de café: Sul de Minas, Cerrado, Norte de Minas e Matas de Minas (Imagem: Reprodução)

Para Maria José, há o desafio de redução dos custos da operação para tornar o método aplicável ao mercado. “Os trabalhos futuros pretendem automatizar os processos e desenvolver uma metodologia usando o mesmo princípio, mas com redução de custos, visando a viabilidade comercial.”

A perspectiva a médio prazo é firmar parceria com as empresas responsáveis pela certificação no país, como a Associação Brasileira da Indústria do Café e exportadores do commodity. O intuito é incentivá-los a utilizar a tecnologia de infravermelho, juntamente com a metodologia de análise proposta no trabalho para que seja viável adequar aos cafés brasileiros. 

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU
A Coordenação de Divulgação Científica da Diretoria de Imagem Institucional, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), está promovendo uma estratégia de fortalecimento das ações de pesquisa da Universidade, mostrando que estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. 

A pesquisa citada nesta matéria está alinhada mais diretamente aos ODS 9 (Indústria, inovação e infraestrutura) e 12 (Consumo e produção responsáveis). Confira a lista completa no site da ONU.