A professora do Departamento de História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Fernanda Thomaz, publicou esta semana o texto “Quais vidas negras importam?” no jornal angolano on-line “O Kwanza”. A coluna é um convite à reflexão sobre o movimento “Black Lives Matter” [“Vidas Negras Importam”], que vem ganhando maior notoriedade na mídia nos últimos dias, após a morte do norte-americano George Floyd, asfixiado por um policial.  

Confira o texto na íntegra 

“O Kwanza” é um jornal on-line e independente, de informação generalista, e reúne conteúdos que interessam a Angola, aos angolanos e à diáspora.  Colunista da publicação desde fevereiro, Fernanda Thomaz explica que a escrita não acadêmica tem sido um exercício importante, inclusive para o trabalho como professora e pesquisadora.  

Fernanda Thomaz: “Acho fundamental ter um jornal de origem angolana e com uma proposta de ser internacional.” Foto: Alice Coêlho/UFJF

“Tem me provocado a refletir sobre as formas de me comunicar com um público mais amplo, fora do espaço acadêmico. Penso que fazemos pouco esse exercício na universidade. A escrita acadêmica é, muitas vezes, desinteressante para a grande maioria da sociedade e nós, na universidade, pouco nos importamos com isso. Acredito que o nosso papel é também a preocupação com a formação da sociedade. E só iremos conseguir fazer isso se repensarmos as maneiras como esse conhecimento chega às pessoas”, pontua.      

Desde fevereiro foram publicados cinco textos da pesquisadora no jornal angolano, que abordam, especialmente, temáticas como o eurocentrismo, as africanidades e as relações raciais.

“O editor do ‘Kwanza’ fez o convite diretamente, através das redes sociais. Ele me disse que acompanhava as minhas publicações. A partir daí, comecei a publicar na parte de opinião do jornal. Esse espaço tem me permitido escrever sobre questões que me incomodam. Às vezes, percebo que faço um desabafo em torno de situações políticas e sociais aqui, no Brasil, e no que toca ao mundo e, especificamente, ao continente africano”, explica.

“Neste momento que vivemos, com a Covid-19, vemos que a mídia costuma mostrar a situação do mundo em relação à doença. Só que o mundo anunciado na mídia, geralmente, não inclui os países africanos” – professora Fernanda Thomaz

Fernanda Thomaz ressalta a relevância de publicações acerca dos países africanos.  “Acho fundamental ter um jornal de origem angolana e com uma proposta de ser internacional. É uma forma de trazer informação de Angola e dos países africanos para mundo. Vivemos numa realidade bastante eurocêntrica, de modo que o continente africano é invisibilizado e negligenciado constantemente. Podemos ver isso em todas as questões. Neste momento que vivemos, com a Covid-19, vemos que a mídia costuma mostrar a situação do mundo em relação à doença. Só que o mundo anunciado na mídia, geralmente, não inclui os países africanos. E, quando menciona algo, é sempre muito homogeneizante. É triste e absurdo, ao mesmo tempo. Então, “O Kwanza” tem um papel importantíssimo, ainda mais que é produzido com a forte presença de escritores, jornalistas e intelectuais angolanos.”

Sobre o “O Kwanza”

Idealizador e editor do “O Kwanza”, o jornalista angolano Jorge Real Soares Eurico conta que a publicação foi elaborada após mudar-se para o Canadá. Atualmente, Eurico reside na província de Ontário, cidade de Toronto. “Uma das coisas que me chamou atenção, quando cá cheguei, foi o fato de existirem comunidades bem estruturadas e organizadas. Por exemplo, reparei que as comunidades portuguesas e brasileiras têm os seus veículos de comunicação, tais como jornais, rádios e TVs, onde passam as mensagens do seu interesse.  A comunidade africana de expressão inglesa  (nigerianos, ganenses, etc) também dispõe de jornais e outras instituições que ajudam a manter acesa a chama dos seus hábitos e costumes e, de certa forma, o cordão umbilical às suas terras de origem.”

Jorge Eurico: “As comunidades dos países africanos de expressão portuguesa não dispunham de nenhum veículo de comunicação no Canadá.” (Foto: arquivo pessoal)

De acordo com o jornalista, as comunidades dos países africanos de expressão portuguesa não dispunham de nenhum veículo de comunicação no Canadá. “Refiro-me aqui às comunidades angolana, cabo-verdiana, moçambicana, são tomense e guineense. Ora, sendo filho de uma cabo-verdiana, angolano de nacionalidade e ‘amante’ da lusofonia, pensei em criar um jornal dirigido à comunidade angolana e às demais comunidades e países africanos de Língua Portuguesa. Aí está hoje “O Kwanza”,  há oito meses na web.” 

A publicação também pode ser lida em inglês, francês, alemão e mandarim. “É um projeto do qual me orgulho na medida em que, de acordo com o feedback que recebo, tem correspondido às expectativas dos leitores espalhados pelos quatro cantos do mundo onde a língua portuguesa é ‘dona’ e ‘barona’ cotidiana”, conta Eurico. 

Colunistas do “O Kwanza”

A participação da professora Fernanda Thomaz como colunista teve início dois meses após o lançamento da publicação. “É colaboradora de ‘primeira hora’ do jornal.  Fernanda Thomaz tem um texto leve e assertivo. É interessante ler o que escreve. Ao mesmo tempo,  prestigia a publicação, fazendo pedagogia com os seus artigos. Quero aproveitar para agradecer reverencial e penhoradamente. Espero que caminhemos juntos, na senda da intervenção cívica e política, através da caneta, por longos anos. Quero igualmente destacar a participação dos demais colaboradores. É uma colaboração desinteressada, pois ninguém é remunerado. A começar por mim, que sou o proprietário e editor. Ninguém é remunerado pelo fato de não haver publicidade”, conclui.   

Leia os textos da professora Fernanda Thomaz no jornal “O Kwanza”:

Histórias que precisam ser contadas

Um espelho de imagens distorcidas

Presidente brasileiro denunciado à ONU por contribuir na disseminação da Covid-19

Covid-19 e os desafios enfrentados em Moçambique

Quais vidas negras importam?

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