Mariana, 5 de novembro de 2015: 19 pessoas mortas e um distrito inteiro destruído. Brumadinho, 25 de janeiro deste ano: 244 mortos e 26 desaparecidos. Os números dos dois últimos rompimentos de barragens em Minas Gerais dão a dimensão dos estragos ambientais e humanos provocados pela mineração no estado. E foi justamente esse o tema de uma roda de conversa promovida pela Universidade Federal de Juiz de Fora em Governador Valadares (UFJF-GV), na última sexta-feira, 24. Os professores Henrique Queiroz (UFJF), Fulvio Cupolillo (IFMG) e Osmar Ribeiro (Pitágoras) debateram os impactos e os principais fatores de risco do empreendimento.
A iniciativa faz parte do projeto de extensão da “UFJF-GV Na Rota Cultural: Manifestação da Diversidade Artística e Popular” e marcou a abertura das instalações da exposição “Brumas do Vale” – obra idealizada pela professora do IFMG-GV, Kênia Faria Brant, que usa a arte para fazer uma reflexão sobre a tragédia de Brumadinho.
De acordo com a coordenadora do projeto, Devani Tomaz Domingues, “a conversa foi pedagógica, com a marca do luto pelas vítimas das tragédias e pela crítica reflexiva ao atual modelo de desenvolvimento. Luto que nos direciona à luta pela segurança nos locais de trabalho e ao cuidado com o meio ambiente”. A servidora destacou que a atividade representou uma oportunidade de “junto com os especialistas convidados, enfrentar diversos questionamentos, que eles [especialistas], de forma técnica, esclareceram”.
Discussão precisa envolver todas as áreas
Um problema que envolve tantas vertentes do conhecimento – como é o caso da mineração – não pode ser analisada de maneira isolada. É esta a conclusão a que chegou um dos pesquisadores que participaram da roda de conversa.
Segundo o professor do Departamento de Administração da UFJF-GV, o debate exige uma “interdisciplinariedade” entre a pesquisa e os grupos afetados diretamente. “A via provável para descobrir novos elementos e trazer respostas efetivas pode advir da pesquisa, mas ela, em grande parte advém das lutas sociais. São os movimentos sociais os grandes responsáveis efetivamente pelas cobranças sociais que devem ser colocadas a todo instante”, afirmou Henrique Queiroz.
Impactos ambientais, econômicos e sociais
Quando o assunto é o impacto ambiental, de acordo com Queiroz, é “muito difícil concluir a durabilidade e extensão” dos danos causados. Apesar disso, ele afirma que é “muito grande”, já que os rejeitos percorreram mais de 600 quilômetros de rio e chegaram ao mar.
Já em relação aos aspectos econômicos, o professor da UFJF não tem dúvidas: a empresa criada para facilitar o ressarcimento dos atingidos, em vez de facilitar esse processo, “tem atuado como uma dificultadora”. Isso porque, mesmo após três anos do desastre de Mariana, segundo Queiroz, aqueles que perderam as suas casas ainda estão morando de aluguel e “não têm recebido as respostas necessárias”.
Social. Esta é, na opinião de Queiroz, a área onde estão os maiores estragos provocados pelo rompimento das barragens, que afetam, principalmente as chamadas comunidades tradicionais, como os indígenas e quilombolas. “Certamente, têm sofrido intensamente, porque é o povo que vive uma relação mais próxima com a terra, e interromperam não só o meio de reprodução de vida, mas também o meio de afirmação cultural, religiosa da identidade grupal e étnica. Isso tem causado uma série de impactos sociais, como depressão, desânimo, danos que envolvem a sociabilidade desses povos”, explica.
Todos esses danos, segundo concluíram os três professores, estão relacionados ao modelo econômico adotado no país. “A gente chegou à conclusão de que o problema não é a mineração em si. O uso de minério é necessário para a manutenção e reprodução da vida humana. O ferro é usado em infinitos setores. Não dá para abandonar a utilização dos recursos minerais. Mas o modelo implantado hoje, no Brasil, é um modelo de exploração predatória, que destrói e não dá tempo para a natureza se recompor”, afirma Queiroz.