Geraldo Vitral explica importância de vida saudável e diagnóstico precoce nos tratamento de cura do câncer de mama (Foto: Fayne Ferrari)

Geraldo Vitral explica importância de vida saudável e diagnóstico precoce nos tratamento de cura do câncer de mama (Foto: Fayne Ferrari)

A campanha internacional  Outubro Rosa visa a chamar a atenção para a realidade atual do câncer de mama e a importância do diagnóstico precoce da doença. Não há informações precisas e oficiais sobre a origem da iniciativa. O pouco que se sabe é que a campanha começou nos Estados Unidos, em ações isoladas, e se expandiu para várias partes do mundo.

Para obter visibilidade, a campanha desperta ações, como iluminar de rosa monumentos, prédios públicos, pontes, teatros. No entanto, estratégias de informação e conscientização buscam ir além, divulgando formas de prevenção da doença que podem colaborar para redução do número de registros.

A informação é remédio poderoso. Segundo o Ministério da Saúde, 15 mil mulheres morrem a cada ano no país. O motivo da maioria dos casos estaria ligado à ausência de diagnóstico precoce.

Para entender melhor o assunto, o Portal da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), conversou com o professor da Faculdade de Medicina e mastologista, Geraldo Vitral.

– Portal: Quais são os fatores principais causadores do câncer de mama? Como prevenir a doença?

– Geraldo Vitral: A abordagem do câncer de mama deve ser focada em dois aspectos. O primeiro, que chamamos de prevenção primária, significa evitar que a doença apareça. Atualmente ainda temos muita dificuldade de determinar com exatidão quais fatores são causadores do câncer de mama. Nós conseguimos identificar situações que aumentam o risco, mas não as causadoras diretas do câncer de mama. Os fatores de risco estão muito relacionados ao estilo de vida, ou seja, sedentarismo, consumo de álcool, obesidade, ingestão alimentar inadequada. Sabemos que a abordagem desses aspectos vai melhorar não só a questão do câncer de mama, como outros aspectos cardiovasculares, pulmonares, etc. Isso não é remédio, não é medicação, mas podemos fazer. Provavelmente, dá mais trabalho, porque vai ter que mudar estilo de vida, no entanto, os benefícios a médio e longo prazos são muito grandes. Se conseguirmos a conscientização com a mudança do estilo de vida, mudança da dieta, prática de atividade física, eliminação dos vícios, conseguimos evitar, não só evitar o câncer de mama, mas inúmeras outras doenças.

A outra questão seria o diagnóstico precoce, ou seja, no Brasil, grande parte dos cânceres de mama são diagnosticados em estágio avançado. Isso significa um risco maior dessa paciente não se curar, uma possibilidade maior de uma cirurgia mais extensa e de um tratamento quimioterápico e/ou radioterápico mais agressivo. Se pudermos fazer o diagnóstico precoce, aumentamos, não só a chance de cura dessa paciente, como diminuímos a agressão do tratamento, que é proporcional ao estágio da doença.

– Qual a recomendação da Sociedade Brasileira de Mastologia para realização de mamografia? Há faixas etárias específicas, por

Geraldo Vitral: "São mulheres na faixa etária entre 50 e 60 anos, esse é o período de maior incidência, que vivem principalmente nas regiões mais desenvolvidas economicamente do país" (Foto: Fayne Ferrari)

Geraldo Vitral: “São mulheres na faixa etária entre 50 e 60 anos, esse é o período de maior incidência, que vivem principalmente nas regiões mais desenvolvidas economicamente do país” (Foto: Fayne Ferrari)

exemplo?

– Existe muita controvérsia com relação à periodicidade de realização da mamografia. O Instituto Nacional do Câncer (Inca) determina uma periodicidade e a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), outra. Algumas instituições têm outros parâmetros próprios. A SBM indica a realização anual para as mulheres a partir dos 40 anos e até a máxima idade possível. Já o Ministério da Saúde e o Inca estabelecem a mamografia bianual (duas vezes por ano) dos 50 até os 69 anos.

– Existem dados sobre a incidência do câncer de mama no país?

– Nós temos uma incidência de câncer de mama em torno de 56 mil novos casos por ano. Sabemos que no Brasil ainda existem situações de subnotificação, mas já é um número bastante alarmante. Outra questão é que, de modo geral, esses casos são diagnosticados em estágio avançado, e o ideal é que não ocorra isso. Quanto mais acesso à mamografia, quanto mais acesso ao serviço de saúde, mais diagnósticos precoces poderemos fazer. O ideal é que também não haja um retardo entre o diagnóstico da doença e a instituição do tratamento, ou seja, caso seja identificada uma alteração clínica ou mamográfica, que se proceda esta investigação e se faça um tratamento que, se não for imediato, vai comprometer. Isso é muito variado. No Brasil, temos ilhas de excelência e outras regiões que têm atendimento muito precário. A maior incidência do câncer de mama no Brasil é na região Sudeste. Nesse dado, entram questões de estilo de vida, de notificação, sobrevida, etc. Quanto mais se vive, maior o risco para câncer de mama. O principal fator de risco para câncer de mama, depois de ser mulher – homens também podem ter câncer de mama – é a idade. É o risco cumulativo. A estimativa é que para cada 8 mulheres uma terá câncer de mama, se considerar todo o período de vida dela.

– O senhor mencionou que no país são registrados 56 mil novos casos de câncer de mama por ano e, além disso, que as mulheres são as principais vítimas. Conte-nos, por favor, sobre o perfil médio desse grupo.

São mulheres na faixa etária entre 50 e 60 anos, esse é o período de maior incidência, que vivem principalmente nas regiões mais desenvolvidas economicamente do país: Sul e Sudeste. Nessas regiões se concentram a maior incidência, por conta desses fatores epidemiológicos que eu relatei.

– O senhor mencionou, também, a possibilidade de homens terem câncer de mama…

– Sim, porém, a incidência é bastante  baixa, correspondendo a 1% do total de cânceres de mama, ou seja, a cada cem mulheres com a doença deve ter um homem. O homem é sim passível de ter câncer de mama, assim como pode ocorrer câncer de mama em mulheres bem jovens, mas são casos menos frequentes.

– Quais as recomendações para prevenir a doença?

– Atividade física regular, controle alimentar adequado. Aquilo que sabemos desde a infância: evitar alimentos excessivamente industrializados, excesso de gordura. O ideal é uma alimentação balanceada, como a nossa avó já falava que tinha que ser: arroz, feijão, carne, ovos, mas tudo comedidamente. Além disso, é importante controlar o peso e evitar o consumo excessivo de álcool, que aumenta e muito o risco de câncer de mama. Pouco mais de um cálice de vinho, por exemplo, tem um efeito cardioprotetor. No entanto, aumenta o risco de câncer de mama. Você não vai deixar de tomar a sua cervejinha, o seu vinho, mas é válido tentar não abusar disso. O outro aspecto é não descuidar do diagnóstico precoce, que se apoia num tripé: autoexame, exame clínico pelo médico e o exame radiológico pela mamografia. Sozinhos eles não funcionam  e são desestimulados. Por exemplo, o Inca desestimula – e está certíssimo – o autoexame como estratégia única, porque pode dar a falsa sensação de que está tudo bem, sendo que pode não estar. O exame clínico sozinho também não resolve. Já a mamografia sozinha pode gerar um falso resultado. É preciso o tripé. No autoexame a mulher se conscientiza, ela lembra que tem a mama para cuidar. O procedimento deve ser realizado uma vez por mês e, ao tocar as mamas, se a mulher notar alguma diferença, pode ser um sinal que mereça uma investigação. Nesse caso, ela deve procurar um médico, para examiná-la.    

É basicamente isso: estilo de vida e diagnóstico precoce. Este deve ser o foco para prevenir o câncer de mama.

Não descuidar do diagnóstico precoce, que se apoia num tripé: autoexame, exame clínico pelo médico e o exame radiológico pela mamografia. Sozinhos eles não funcionam  e são desestimulados

– Hoje já temos tecnologias cada vez mais eficazes em termos de diagnóstico e de tratamento também. O tratamento do câncer de mama hoje é muito menos agressivo do que era antes, há dez, vinte anos. Então, nós vemos pessoas que tratam o câncer de mama e levam uma vida completamente normal, deixando de haver aquele estigma do câncer de mama. Hoje nós consideramo, e falamos isso nas aulas para os alunos, que o câncer de mama é igual à hipertensão: uma doença crônica. Ah, mas hipertensão é um ‘comprimidinho’! Mas, se você não tomar a medicação, você terá um infarto e irá morrer. O câncer de mama é a mesma coisa. Às vezes você nem precisa ficar tomando comprimidos. Tratou, está resolvido! Então, a partir do momento que você tem essa visão de que o diagnóstico do câncer de mama não é um atestado de óbito, e que você tem uma alta chance de cura, você começa a lidar com a doença de uma forma muito mais tranquila. E eu avalio que de forma até mais consciente, porque você passa a não ter medo de fazer o diagnóstico. Essa evolução de conceito é muito positiva e é devida a esses movimentos, como a Campanha Outubro Rosa, que atinge de fato as pessoas. É preciso usar os meios de comunicação para atingir a população.

– Em caso de diagnóstico precoce do câncer de mama , quais são as chances de reabilitação integral?  

– As chances são superiores a 90%. Então, superior a 90% é quase 100%!  Vão existir casos que não vão curar? Vão! Assim como existem casos de pneumonia sem cura, de hipertensão e de infarto também. O desfecho ruim faz parte, mas, a partir do momento em que você fala que tem uma chance superior a 90% de cura no diagnóstico precoce, não existe argumento melhor do que esse.

– Quais são os tratamentos disponíveis na atualidade para os casos de câncer de mama?

– Cirurgia conservadora que significa não retirar a mama, ou seja, você retira a lesão sem a necessidade da retirada da mama, a chamada “mastectomia”. Hoje, o índice de mastectomia que nós fazemos é muito baixo, muito pequeno. Dentro do ambiente de Hospital Universitário, conseguimos 70% ou mais de diagnóstico de cirurgia conservadora da mama e com a mesma possibilidade de cura da mastectomia.  Quando falamos em cirurgia conservadora, estamos falando que se fizermos a cirurgia conservadora ou a cirurgia radical (com mastectomia) a chance de cura é a mesma. Então, vamos fazer a conservadora, além da associação de outros procedimentos, como a quimioterapia, a radioterapia, a hormônio terapia, a terapia-alvo, que consiste em um tratamento direcionado a um tipo específico de tumor e você usa uma medicação que vai direto naquelas células. Você vai aumentando o seu arsenal terapêutico  e vai, ao mesmo tempo, ampliando a possibilidade de cura. Houve muitos avanços nos últimos anos. Quando eu era estudante de Medicina e tinha notícia que uma paciente ia para cirurgia de câncer de mama, já pensávamos em retirar a maior quantidade de tecido possível. Hoje, é o contrário! Nós sempre pretendemos retirar o mínimo de tecido, ou seja, apenas o que é necessário retirar.