Com a proposta de discutir as questões judiciais relacionadas à população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexuais (LGBTI), a Semana Rainbow – que começou na segunda, dia 14 e vai até domingo, 20 – da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) iniciou o evento com uma abordagem diferenciada sobre os desafios jurídicos vividos por essa parcela da população. A roda de conversa, organizada pelo Núcleo de Extensão e Pesquisa em Ciências Criminais da Faculdade de Direito (Nepcrim), apresentou o ponto de vista legal sobre a temática, além de compartilhar histórias, experiências e aspectos que precisam ser melhorados.
A professora da Faculdade de Direito, Joana Machado, aponta que é preciso fazer com que a sociedade assuma a responsabilidade sobre temas que envolvam os grupos minoritários. “Quando a população LGBTI e os simpatizantes alcançam um direito é preciso se esforçar para mantê-lo. As pessoas consideradas normativas, sentem-se ameaçadas ao ver que outros indivíduos estão alcançando direitos, que elas viam como privilégio. A investida precisa começar nas bases e instituições, e acreditar que apenas o poder judiciário não é o suficiente para resolvê-los.”
Segundo Joana, o Brasil vive um contrabalanço relacionado ao progressismo das questões LGBTI. É necessário considerar que, por mais que seja um país que possui leis que buscam direitos igualitários, como união estável, casamento entre pessoas do mesmo sexo e nome social, ainda registra um número representativo de violência contra essa comunidade. “O Judiciário é composto por pessoas majoritariamente brancas, heterossexuais, cisgênero (pessoa que se identifica com o gênero designado ao nascimento), de classes altas e, em maioria, não têm sensibilidade de compreender os assuntos da classe LGBTI. O nosso curso jurídico não prepara para que as pessoas tenham empatia a essa causa. A nossa aposta tem que vir pelos direitos já alcançados. É a pressão dos movimentos sociais que fazem com que as coisas passem a ter representatividade.”
“Inicialmente, a gente precisa debater os direitos dessas pessoas, não apenas no contexto civil, mas na conjuntura existencial. Para mudar isso é preciso investir na educação”, destaca o representante do Nepcrim, Rodrigo Neves. O aluno do sétimo período do curso de Direito afirma que essa discussão é bastante apropriada, considerando que a sociedade ainda é bastante conservadora. “Esse é meu primeiro contato com esse tipo de evento, O Direito é um curso muito conservador, e esse assunto é pouco comentado. Há um grupo que tenta manter essa tradição de discursos fechados, mas eu, como aluno, me importo com o tema e estou feliz em estar aqui.”
“A fobia ao grupo LGBTI é sutil. O pior é que, às vezes, nem percebemos e, pior que isso, a gente se acostuma” Marcos Chein
Para o professor do curso de Turismo e organizador do evento, Marcelo do Carmo, a possibilidade de apresentar essas questões dentro da UFJF, é utilizar por meio das artes e da cultura, o papel de trabalhar com os eixos de pesquisa ensino e extensão. “É uma forma de colocar essa discussão em uma perspectiva mais horizontal, não apenas para a comunidade acadêmica, mas aberta para todos os juizforanos e aos turistas que estão chegando. A gente traz a maneira de ensinar e aprender para fora de sala de aula e passamos a ocupar espaços, não apenas na Universidade, mas em toda a cidade.”
A vida fora do ‘armário’
Durante a roda de conversa, o professor da Faculdade de Direito da UFJF, Marcos Chein, e o aluno do curso de Direito da Universidade Salgado Filho (Universo), Thiago Lima, trocaram com o público algumas experiências e demonstraram a necessidade de se buscar direitos igualitários, mesmo quando a sociedade apresenta um discurso de aceitação, mas permanece com a mente conservadora.
“Na antiga faculdade, eu tive todas as permissões para usar o nome social. Porém, um dia, a diretora disse que o dono da instituição afirmou que não teria esse tipo de pessoa na universidade dele. Então, troquei de universidade”, conta Thiago que é um homem transexual. O estudante relata as dificuldades que passou para que seus direitos fossem cumpridos. “É um direito que nos foi dado, mas que não prepara para sermos recebidos. As pessoas não estão preparadas para lidar com esse tipo de público, seja em bancos, instituições de ensino ou hospitais.. Essas questões variam muito da boa vontade.”
.“A utilidade do armário é se proteger da violência física e simbólica, mas ela não te permite se relacionar e ser o que você é. Para a comunidade, te manter dentro do armário, é não ter que conviver com o problema”, afirma Chein. O professor ressalta que preconceito, por vezes, é velado e que em sua profissão ele pretende formar profissionais mais humanos. “A fobia ao grupo LGBTI é sutil. O pior é que, às vezes, nem percebemos e, pior que isso, a gente se acostuma. Como professor, me empenho para formar bons advogados, mas antes de bons profissionais, eu sei que é preciso formar boas pessoas. É preciso educar e resistir. Espero que um dia tenhamos menos leis e tenhamos mais amor.”
Confira a programação completa da Semana Rainbow