Bruno Milanez atuou por um mês, em julho, como pesquisador visitante no projeto Extractivism.de. Expectativa é estabelecer parcerias de pesquisa (Foto: Carolina de Paula/UFJF)

“Um dos pontos inovadores é colocar a atividade extrativista como centro da análise das pesquisas que, até então, eram orientadas pelo aspecto de proximidade geográfica”, salienta o professor da UFJF Bruno Milanez sobre o projeto Extrativismo, do qual fez parte recentemente na Alemanha. Reunindo pesquisadores de todo o mundo, a proposta é estudar os desafios para o desenvolvimento de países dependentes da extração e exportação de recursos naturais, especialmente petróleo, gás e minério, na América Latina e na região do Norte da África, com foco em Marrocos, Argélia e Tunísia.

O projeto é uma iniciativa conjunta entre a Universidade de Kassel e a Universidade Philipps de Marburg, com financiamento do Ministério Federal Alemão de Educação e Pesquisa, por meio de edital lançado anualmente para que pesquisadores visitantes possam desenvolver atividades de pesquisa em Kassel ou Marburg.  

Neste ano, Bruno Milanez, do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGeo) e do Departamento de Engenharia de Produção e Mecânica, foi um dos selecionados e o único brasileiro a submeter trabalho: “Já vinha estudando a relação entre corporações mineradoras e o Estado brasileiro a partir de um projeto de pesquisa apoiado pelo CNPq e percebi, no edital de 2023, a possibilidade de criar diálogo com pesquisadores que se debruçam sobre problemas semelhantes em outros países”.

Milanez apresentou parte de sua pesquisa desenvolvida na UFJF no Encontro do Centro de Estudos Latinos Americanos da Universidade de Kassel. Seus estudos são voltados para as associações empresariais que se constroem nos diferentes segmentos do setor mineral, as redes estabelecidas entre seus diretores, sua relação com as políticas públicas e outras peculiaridades do lobby da mineração. 

A motivação para participar do projeto foi a percepção de que pesquisadores estrangeiros da área tendem a se limitar aos países hispânicos (Foto: Arquivo pessoal)

Para o professor, o período em Kassel representa a oportunidade de criação de uma rede de pesquisadores para identificar pontos de interesse convergentes, propostas de análises e indicações de enfoques que poderiam ser adotados em suas pesquisas. “Conhecer as teorias e métodos que outros pesquisadores utilizam para estudar situações semelhantes oferece novas oportunidades científicas para descrever e analisar esse contexto. Por exemplo, as ferramentas que estão sendo usadas para se discutir a exaustão das reservas de gás na Bolívia podem nos ajudar a debater o esgotamento das reservas de qualidade de minério de ferro em Minas Gerais”, conta.

Olhar sobre a América Latina

Entre apresentações e oficinas de trabalho, Milanez refletiu sobre a forma como os brasileiros se relacionam com a América Latina, que pode ser muito curiosa e, ao mesmo tempo, triste. “Em parte, devido à barreira linguística, mas também como consequência do tamanho de nosso país, olhamos muito pouco para o que ocorre em nossa vizinhança e perdemos muitas oportunidades de aprendizado”, observa.

Em sua opinião, é mais fácil encontrar pesquisas que tentam propor para o Brasil tecnologias ou soluções sociais desenvolvidas na Europa, do que aquelas desenvolvidas em países mais próximos, como a Argentina ou o México, e com contextos mais semelhantes. 

“Entendo que olhar para países dependentes da exportação de matéria-prima na América Latina e na África, incluindo suas dificuldades, desafios e também soluções, é uma forma muito mais adequada de compreender o contexto brasileiro. Acredito que se meus alunos saírem da faculdade com essa sensibilidade, provavelmente serão profissionais e cidadãos melhor preparados para discutir e propor as respostas para uma série de problemas que precisamos enfrentar em nosso país.”

O professor e os demais participantes também terão dever de casa: ao longo do próximo ano, serão desenvolvidos relatórios de análise para a sociedade em geral e artigos para periódicos científicos, alguns individuais e outros em parcerias. “Já acertei com Felix Dorn a elaboração de um texto avaliando as diferentes estratégias nacionais dos países da América Latina sobre suas reservas de lítio”, informa.

Conhecido como “ouro do futuro” ou “ouro branco”, a maior reserva de lítio no mundo fica na Bolívia (Foto: Canva Pro)

Dorn é pesquisador na Universidade de Viena (Áustria), onde estuda há anos o regime extrativo de lítio na Argentina, e, no estudo que desenvolverão juntos, eles pretendem entender a adoção da “nacionalização” do lítio como estratégia de alguns países, vislumbrando as oportunidades e desafios dessa ação. O lítio é visto como o ouro da transição energética para fontes de energia limpa, já que possui alto potencial eletroquímico e capacidade de conduzir calor, condições necessárias para fazer funcionar as baterias de carros elétricos e as baterias que acumulam a energia gerada pelos painéis solares ou geradores eólicos.

Assim como qualquer outra atividade de mineração, a extração do lítio é intensiva em impactos ambientais e sociais. Existe o risco de expulsão de comunidades e conflitos por água e, dependendo da região onde ocorre, pode também contribuir para o desmatamento e perda de biodiversidade. Segundo o pesquisador da UFJF,  os primeiros estudos do Brasil sobre o tema ainda estão saindo. “A pesquisa de mestrado da minha orientanda, Aline Araújo do PPGeo, vai no sentido de entender como as empresas mineradoras usam o discurso de energia limpa ou de urgência climática para legitimar projetos de extração mineral que são poluentes e impactantes”, explica.

Pesquisa está alinhada aos ODS

As ações de pesquisa da UFJF estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. A pesquisa e atividades realizadas por Milanez estão alinhadas aos ODS 10 (Redução das desigualdades), 12 (Consumo e Produção Responsáveis) e 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes).

Confira a lista completa no site da ONU.