Sensor a fibra óptica promete analisar a qualidade do leite com maior precisão (Foto: Canva Pro)

A indústria do leite movimenta cerca de 70 milhões de reais por ano no Brasil, sendo Minas Gerais o maior produtor do território, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Do processo de ordenha até a chegada nas prateleiras do mercado, uma série de testes e procedimentos são realizados. Pesquisadores do Laboratório de Instrumentação e Telemetria (LiTel) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) desenvolveram um sensor a fibra óptica pioneiro no mercado, capaz de analisar a qualidade do leite em diversos aspectos.

Desenvolvido integralmente na Faculdade de Engenharia, o dispositivo detecta mudanças no leite, com destaque para a quantidade de cálcio presente no produto. Para isso, são determinados parâmetros do que se espera da análise, que são codificados no dispositivo. E então os dados são interpretados, sendo apresentada uma comparação das curvas obtidas. 

Por meio do Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (Critt), a proposta de patente foi feita neste ano junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi). O sensor (BR 10 2023 006215 6) está em fase de instalação em campo e análise dos resultados. Todo o sistema de medição – do sensor aos softwares de interface com os usuários – foi criado no espaço da Universidade.

O dispositivo é inserido em um recipiente com a amostra do leite e envia para o software os dados referentes a um parâmetro (Foto: Alexandre Dornelas)

Coordenado pelo professor Alexandre Bessa, o trabalho envolveu discentes de graduação e pós-graduação dos cursos de Engenharia: Arthur Andrade, Deivid Edson Campos, Felipe Barino, Italo Fernando Alvarenga, João Vitor Calderano e Renato Luiz Filho

Uma das vantagens dos sensores ópticos em fibra é a amplitude da captação de informações. “Trabalhamos com uma visão do sensor muito mais ampla, e conseguimos identificar qualquer variação significativa dentro do espectro óptico. Conseguimos mensurar de uma forma muito mais precisa e ampla do que um sensor convencional, por exemplo”, compartilha Alexandre Bessa sobre o produto.

Para os pesquisadores, o objetivo central é unir a demanda da indústria com o momento atual, proporcionando inovações tecnológicas que melhoram a vida e as experiências da população. “A gente trabalha com pesquisa aplicada à solução de algum problema, então tentamos minimizar o custo de medição, de desenvolvimento e de novas tecnologias. Desenvolvemos ferramentas não só para empresas, mas que vão reverter para a sociedade”, pontua. 

“Um sistema desses para medir parâmetros é relativamente caro, e estamos desenvolvendo aqui no laboratório com tecnologia nacional e, com isso, evitamos trazer coisas de fora. Desenvolvemos essa tecnologia para as empresas brasileiras, de maneira a evitar compras de insumos internacionais.”

Diferencial competitivo

“Ninguém no Brasil trabalha com um sensor parecido com o que fazemos aqui, estamos dentro de um ambiente acadêmico, em um programa de pós-graduação de excelência, e todos saem ganhando” (Alexandre Bessa)

Dentre os aspectos relacionados à inovação, o grande diferencial está na praticidade e na tecnologia empregada com uma análise digital. A possibilidade que o sensor seja deslocado para o local de produção permite que todo o processo de análise aconteça ali, sem a necessidade de levar o leite para outra unidade ou um laboratório especializado, prevenindo contaminações e riscos acarretados pelo transporte. O aparato tecnológico também possibilita a redução de custos para os produtores e empresas parceiras do projeto, uma vez que todos os componentes do sensor foram desenvolvidos no laboratório. 

Professor Alexandre Bessa, especialista em estudos de fibra óptica e responsável pelo laboratório (Foto: Alexandre Dornelas)

Além da fibra, outro elemento de destaque é o interrogador de sinal, que converte a informação recebida do sensor para sinal amigável, como o elétrico, sendo posteriormente convertido para análise no computador. “A parte mais cara de um sistema óptico é a de interrogação do sinal. O interrogador que estamos desenvolvendo abaixa significativamente esse custo, que é o maior desafio”.

“Nós temos não somente o software de aquisição de dados de previsibilidade e o de inteligência artificial, mas também uma interface amigável. Qualquer pessoa consegue acessar o programa, o software é livre, não tem custo, assim como a interface”, ressalta Santos, com relação à praticidade da aplicação e utilização do sistema.

Próximos passos

Os testes do protótipo em campo são realizados com parceiros, sendo periodicamente analisados pela equipe e, constantemente, novas versões são desenvolvidas e implementadas. Há a perspectiva de aplicar também o sistema em derivados lácteos.

Para a ampliação e comercialização do modelo, pretende-se criar uma startup, desenvolvida a partir de feedbacks e demandas dos envolvidos no processo de concepção, e composta por docentes integrantes do projeto. Também é esperada a continuidade das parcerias firmadas com empresas que colaboram nas etapas de desenvolvimento, construindo um solo firme para o lançamento da iniciativa.

Todo o sistema é remoto, o produtor pode colher a amostra lá na fazenda sem precisar levar para o laboratório (Foto: Alexandre Dornelas)

Inovação não é uma novidade para o grupo, que já desenvolveu dispositivos semelhantes para análises de outros produtos, entre eles a cerveja e a água, que acarretaram parcerias com grandes empresas, como a Ambev. O agronegócio é um foco para o direcionamento das pesquisas, uma vez que a indústria representa um dos principais componentes da economia do país.

Cooperação acadêmica

O LiTel tem buscado parcerias dentro da UFJF, principalmente com diferentes departamentos. Já está em andamento o projeto para produção de sensores de detecção do CO2, junto do Departamento de Física, como mais um recurso aproveitado da adaptabilidade do protótipo em diferentes ambientes e parâmetros.

“Ninguém no Brasil trabalha com um sensor parecido com o que fazemos aqui, estamos dentro de um ambiente acadêmico, em um programa de pós-graduação de excelência, e todos saem ganhando: a universidade com pesquisa de ponta a nível nacional e internacional, e os alunos que estão trabalhando nisso em equipe. A vivência de uma empresa proporciona um sentimento de compromisso ao entregar uma pesquisa de qualidade. Quando os alunos começam a ver e aplicar alguma coisa que aprendem na prática é um estímulo para a própria formação”, defende. 

O desenvolvimento e depósito da patente representa um grande passo para o Laboratório, onde são desenvolvidos aparelhos para os mais variados meios, desde líquidos e gases, à análise de deformações e temperaturas em construção civil. O professor ressalta que o laboratório está de portas abertas, e procura estudantes das mais diversas áreas para pesquisas e inovações, pois “parceiros dentro da Universidade são fundamentais”.

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU 

As ações de pesquisa da UFJF estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). O projeto de pesquisa citado nesta matéria se alinha aos ODS 2 (Fome zero e agricultura sustentável), 9 (Indústria, inovação e infraestrutura) e 12 (Consumo e produção responsáveis).

Confira a lista completa no site da ONU.