Atualmente, o setor aéreo é responsável por cerca de 2% das emissões globais de gás carbônico, conforme dados da Air Transport Action Group (Foto: Tobias Rehbein/Pixabay)

O acordo global que culminou nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) prevê diversas metas voltadas para um mundo mais sustentável. País signatário da Agenda 2030, o Brasil deve superar vários desafios ambientais. Dentre eles, a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 37% abaixo dos níveis de 2005, até 2025, com uma contribuição indicativa subsequente de 43%, em 2030, conforme Contribuição Nacionalmente Determinada (iNDC, da sigla em inglês). 

A aviação civil tem impacto significativo nessa determinação, uma vez que é responsável por cerca de 2% das emissões globais de gás carbônico, o que tem relação direta com o processo antropogênico de aquecimento global. Segundo dados do Grupo de Ação de Transporte Aéreo (Atag, da sigla em inglês), a indústria da aviação se comprometeu a zerar as emissões líquidas de carbono até 2050, ano em que se estima que serão transportados mais de 10 bilhões de passageiros, movimentando quase US$ 9 trilhões na economia mundial.

Neste contexto, a Universidade Federal de Juiz de Fora firmou parceria com a Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC) do Ministério da Infraestrutura para realizar pesquisa sobre o uso de combustíveis sustentáveis de aviação (SAF, do inglês Sustainable Aviation Fuels) e suas implicações. O estudo irá avaliar as alternativas do setor aéreo diante dos compromissos nacionais e internacionais de redução de emissões de GEE, tendo em vista as discussões avançadas para criação de um mandato obrigatório para mistura de SAF.     

Diretor do Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (Critt/UFJF), Fabrício Campos é o coordenador do estudo em parceria com a SAC (Foto: Alexandre Dornelas)

Coordenado pelo professor Fabrício Campos, diretor de Inovação da UFJF, o projeto visa dotar a SAC de informações técnicas capazes de embasar e auxiliar o processo decisório. “Temos a expectativa de contribuir de forma complementar na construção de políticas e diretrizes para a regulação econômica de serviços aéreos por meio de mapeamento do atual cenário relativo à SAF, no Brasil e no exterior.”

Com prazo de 24 meses, os resultados serão úteis para o planejamento relacionado à infraestrutura aeroportuária e ao melhor aproveitamento logístico para disponibilidade de SAF em aeroportos estratégicos. Além de pesquisadores da UFJF, a equipe também conta com especialistas em biocombustíveis de aviação das universidades federais de Goiás (UFG), do Mato Grosso (UFMT) e de Minas Gerais (UFMG). O lançamento foi feito durante o 2° Congresso da Rede Brasileira de Bioquerosene e Hidrocarbonetos Sustentáveis para Aviação (RBQAV), no Rio Grande do Norte, em maio deste ano. 

Destaque brasileiro na produção de biocombustíveis 

A Organização de Aviação Civil Internacional (OACI) estabeleceu como objetivos o crescimento neutro em carbono a partir de 2020 e criou o Carbon Offsetting and Reduction Scheme for International Aviation (Corsia), mecanismo de compensação simples que auxilia os estados a cumprirem essa meta no curto prazo. Com isso, o cumprimento das obrigações de compensação pode se dar pelo uso de combustíveis sustentáveis de aviação, uma vez que a troca de aeronaves é impraticável nos próximos 30 anos. 

Na opinião do docente titular da UFJF, Adilson David Silva, que também faz parte da equipe, o Brasil está em vantagem em relação a outros países, uma vez que é atualmente o segundo maior produtor mundial de biocombustíveis, contando com uma cadeia de suprimento bem estabelecida como etanol e biodiesel. “Nós possuímos competência instalada na produção de outros combustíveis renováveis. O Brasil tem também grande potencial eólico, solar, de hidrelétricas e biomassa, fundamental para produção de hidrogênio verde (HV), que é a matéria-prima para produção de combustíveis sustentáveis de aviação.

“É urgente as ações por parte do governo na promoção de políticas públicas, estabelecimento de metas de curto e longo prazo, incentivos fiscais, estímulo à P&D e regulação responsiva” (Adilson Silva)

Com relação à análise sobre a indústria nacional de SAF, os especialistas devem considerar a perspectiva de aderência aos objetivos do Programa Combustível do Futuro e às metas estabelecidas pelo Programa Corsia, “a partir de avaliação do ambiente interno e externo que envolve o segmento nacional de aviação civil, elencando suas oportunidades, ameaças, forças e fraquezas frente ao processo de descarbonização das cadeias produtivas globais”.

“Os biocombustíveis de aviação mais promissores são os que utilizam matéria-prima renovável e podem ser obtidos por processos de hidrotratamento de óleos vegetais, Fischer-Tropsch, oligomerização de álcoois e fermentação de açúcares.” O pesquisador menciona que apesar do avanço das tecnologias das aeronaves, e consequente maior eficiência operacional, bem como das melhorias na gestão do tráfego aéreo e dos programas de offset de carbono, estudos apontam que a adoção de SAF em substituição aos combustíveis fósseis é a única maneira eficaz de garantir a operação neutra em carbono do segmento no longo prazo. 

Parte da equipe durante congresso da RBQAV. Da esquerda para a direita, os pesquisadores Lais Thomaz, Fabrício Campos, Amanda Gondim, Adilson Silva e Vanya Marcia Pasa; e Rafael Menezes, do MCTI (Foto: Arquivo pessoal)

Segundo a Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata, da sigla em inglês), a produção de SAF atualmente no mundo é de 100 milhões de litros e para atingir a meta de zerar as emissões de carbono em 2050, a produção terá de passar para 449 bilhões de litros. “A Noruega, nesse sentido, é pioneira mundial na adoção de um mandato, ao determinar a inclusão de no mínimo 0,5% de SAF em todo combustível de aviação fornecido no país, a partir de janeiro de 2020”, informa.

O professor Adilson Silva, que também coordena a Plataforma de Biodiesel da Zona da Mata, projeto formado pela hélice tríplice entre Universidade, Prefeitura e Green Fuels, enfatiza: “É urgente as ações por parte do governo na promoção de políticas públicas, estabelecimento de metas de curto e longo prazo, incentivos fiscais, estímulo à P&D e regulação responsiva. Se o Brasil demorar na criação dessas regulamentações, seremos seriamente prejudicados.”

UFJF é parceira na produção de biodiesel em JF

Em 2020, a UFJF assinou termo de cooperação entre a Prefeitura de Juiz de Fora e a empresa inglesa de combustíveis renováveis Green Fuels para o desenvolvimento de projeto de pesquisa de validação tecnológica, econômica e ambiental sobre a utilização de biodiesel feito a partir de óleo de cozinha descartado. 

Com isso, está sendo instalada uma unidade de processamento de biodiesel no Centro Integrado de Ensino, Pesquisa, Extensão, Transferência de Tecnologia e Cultura (Cieptec-UFJF Norte) no Distrito Industrial de Juiz de Fora. Desde a assinatura do termo, várias etapas já foram realizadas e a previsão para início de suas atividades é julho de 2022. 

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU 

A Coordenação de Divulgação Científica da Diretoria de Imagem Institucional, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), está promovendo uma estratégia de fortalecimento das ações de pesquisa da Universidade, mostrando que estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. 

A pesquisa citada nesta matéria está alinhada mais diretamente aos seguintes ODS: 1 (Erradicação da pobreza), 2 (Fome zero e agricultura sustentável), 7 (Energia limpa e acessível), 8 (Trabalho decente e crescimento econômico), 9 (Indústria, inovação e infraestrutura), 11 (Cidades e comunidades sustentáveis), 12 (Consumo e produções responsáveis), 13 (Ação contra a mudança global do clima) e 17 (Parcerias e meios de implementação). Confira a lista completa no site da ONU.

Relembre: UFJF assina termo de cooperação internacional para produção de biodiesel