Em “Aposte! Ou a gente ainda tá na TV” a atriz Ana Reis interpreta uma artista de teatro frustrada. (Imagem: reprodução)

Uma artista de teatro frustrada é a apresentadora do “primeiro e último” programa da sua vida, onde o público interage e decide, por meio de uma série de enquetes, qual o desfecho da personagem. Este é o enredo de “Aposte! Ou a gente ainda tá na TV”, um dos episódios de “O trajeto de ideias geniais”, mais um projeto vencedor do “Prêmio Janelas Abertas” da Pró-Reitoria de Cultura (Procult) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), criado para apoiar produções de diversas áreas artísticas e a democratizar os espaços culturais da instituição.

Toda a performance, assim como o roteiro e a direção, ficam a cargo de Ana Jéssica Reis, atriz valadarense com diversos trabalhos desenvolvidos e passagens por alguns grupos teatrais da cidade. Ela explica como surgiu “O trajeto de ideias geniais”, a sua segunda empreitada artística solo:

“Ele não é uma obra, ou um produto final, mas sim um processo em que eu exploro diferentes linguagens e mídias. O interesse dessa minha pesquisa é compreender como nos tornamos aquilo que somos (ou como me tornei aquilo que sou) e investigar a ideia do ser humano enquanto um produto. Existem alguns temas atravessadores: amor, felicidade, solidão, solitude, morte, saúde mental, Deus, ficção e realidade. No fim é tudo sobre a reconstrução da autoimagem explorando limites entre a ficção e a realidade no contexto dessa modernidade líquida de fragilidade nas relações, em que tudo é efêmero e nada é feito para durar”, conta.

E Reis, de fato, abusa desses limites entre o real e o ficcional, a começar pela protagonista, que tem o mesmo nome da atriz. Apesar disso, ela faz questão de deixar claro as nuances entre personagem e intérprete:

No programa, transmitido pelas mídias sociais, o público interage com a apresentadora. (Imagem: reprodução)

“Eu construo uma narrativa a partir da minha biografia, mas aquilo que eu performo é uma ficção. A história que eu compartilho não é a realidade em si, mas um ponto de vista sobre os fatos. A Ana personagem possui ações, reações e um discurso que não é o da Ana da realidade. Aquela personagem está no limite, ela decidiu acabar com tudo, aquilo é um grande episódio de mania. Eu uso algumas ‘verdades’ para poder explorar os limites entre a ficção e a realidade. Eu adoro fazer isso como atriz, fazer uma cena com tanta entrega que ninguém vai acreditar que aquilo não é real. E nesse sentido, colocar alguns dados biográficos ajuda a fazer essa ‘confusão’ na cabeça do espectador”, ressalta.

Outro elemento que dá a tônica desse primeiro episódio do projeto é a interatividade entre artista e público. Todas as cenas foram de fato transmitidas pelas mídias sociais e contaram com a intervenção dos espectadores. “Como esse processo é solo, eu compreendi que o papel do público é muito importante, ele é literalmente cocriador da obra”, defende Ana Reis.

A outra Ana, a da ficção, também defende esse protagonismo da plateia virtual. “Este programa é para mostrar a você até onde a gente pode chegar pela sua audiência”, frisa a apresentadora.

Mas se tem uma coisa que as duas Anas discordam é em relação ao futuro do projeto. Se para a personagem, “Chega de teatro! Chega! Eu quero me libertar disso”, a continuidade da trabalho está nos planos da atriz. “Existe um desejo de realizar mais episódios. E já existe uma ideia dessa estrutura dramatúrgica. Existe uma conexão entre os episódios, todos eles fazem parte de um grande ‘jogo’, mas a continuidade depende da interação do público. Todas as escolhas que a audiência faz tem consequências e o caminho é construído a partir delas”, garante Reis.

Na avaliação da atriz, o “Prêmio Janelas Abertas” funcionou como um catalisador para as suas ideias. (Imagem: reprodução)

E na opinião da atriz, a premiação foi decisiva para isso. “O edital ‘Janelas Abertas’ foi um catalizador que acelerou o processo de compartilhar com o público aquilo que eu estava construindo em quatro paredes. Eu aprendi muito com essa experiência, principalmente com os erros. Todo o trabalho me deu coragem, serenidade e sabedoria para continuar percorrendo esse meu ‘trajeto de ideias geniais’”, afirmou.

A diretora do Museu de Arqueologia e Etnologia Americana (MAEA), Luciane Monteiro Oliveira integrou a comissão que avaliou projetos experimentais como o desenvolvido por Ana Reis, e afirma que eles “são prova de que propostas em comum levam a grandes resultados, capazes de evidenciar as semelhanças e as diferenças das regiões de abrangência”. Ela também destacou que Juiz de Fora e Governador Valadares “abriram, de fato, suas janelas” e que o prêmio “foi uma oportunidade de as duas cidades e seus entornos encontrarem, juntos, soluções com sabedoria, sensibilidade e criatividade.”

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*A série sobre os projetos de Governador Valadares contemplados no “Prêmio Janelas Abertas” continua nesta quarta-feira, 10, contando um pouco sobre o grupo que faz uma releitura de cantigas de roda