Não é exagero dizer que o Brasil domina o mercado global de nióbio. O país abriga 98% das reservas ativas do mundo, segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM). Discussões sobre a reserva brasileira e o seu potencial econômico têm gerado muitas dúvidas e especulações. O insumo serve essencialmente à indústria aeroespacial, de óleo e gás, naval e automotiva. Localizado na quinta coluna da tabela periódica, entre o zircônio e o molibdênio, com número atômico 41, o metal é utilizado, entre outras coisas, para fornecer mais força e resistência ao aço. Para compreender melhor a natureza desse elemento, as possibilidades de sua exploração e possíveis aplicações, é preciso considerar diversos fatores. 

Recentemente, foi organizado pelo Ministério de Minas e Energia o Seminário Liderança Brasileira na Cadeia Produtiva do Nióbio. Na oportunidade, estiveram em Brasília diversos atores ligados à cadeia produtiva. Conversamos com o professor Ricardo Júnior Gonçalves, atualmente em estágio pós-doutoral na da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), participante do evento, para esclarecer alguns pontos sobre o assunto. 

90% do nióbio produzido é transformado em ferro-nióbio, uma liga metálica composta por 65% de nióbio e 35% de ferro

O nióbio
Levando em consideração que na natureza o metal é encontrado associado a outros minérios, Gonçalves explica que, até 1950, ele era obtido como um subproduto do tratamento das colombitas e tantalitas, minerais pouco abundantes. Isso resultava em preços elevados de extração e uso restrito na produção de um tipo especial de aço inoxidável e de algumas superligas. A partir de descobertas de grandes reservas de pirocloro (mineral com concentração de nióbio) no Brasil e no Canadá, a viabilização técnica e tecnológica de pesquisa e extração foi aumentada e mudanças foram notadas nos preços e nas aplicações do metal. 

O Brasil detém as maiores reservas do metal com uma diferença significativa; em segundo e terceiro lugar, Canadá e Austrália aparecem com apenas 1,11% e 0,46%, respectivamente. Países como Estados Unidos e Rússia também têm disponibilidade do elemento. Entretanto, devido às limitações de mercado encontradas para sua exploração, suas reservas ainda não são operantes. 

Onde está o nióbio brasileiro?
A maior produtora de nióbio do mundo é a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM). Atualmente, a família Moreira Salles tem 70% das ações da empresa, que produz 80% do nióbio do planeta. Os outros 30% foram vendidos, meio a meio, a grupos japoneses e chineses. 

Em Araxá (MG) encontra-se a maior reserva, descoberta pelo geólogo Djalma Guimarães em 1953. O metal também é encontrado na cidade mineira de Tapira, nos municípios de São Gabriel da Cachoeira (AM), Presidente Figueiredo (AM), em Catalão (GO) e Ouvidor (GO). A cidade de Catalão, a menos de 300 km de Goiânia, abriga uma outra empresa produtora de nióbio, a CMOC Brasil, que atua como subsidiária da China Molybdenum (CMOC). 

Graças à sua reserva e métodos de produção, o Brasil não importa produtos derivados do nióbio, sendo auto suficiente para atender as demandas do mercado interno. Já a exportação é uma atividade frequente. Vale ressaltar que 90% do nióbio produzido é transformado em ferro-nióbio, uma “liga metálica composta por 65% de nióbio e 35% de ferro; enquanto os outros 10% são usados em demais produtos, como óxidos de nióbio, ligas de grau vácuo e nióbio metálico, em aplicações especiais”, como salienta Gonçalves. 

Em 2016, o país exportou 68.576 toneladas de liga ferro-nióbio (Fe-Nb). Essa movimentação gerou uma receita de R$ 1,3 bilhão. Em 2018, “a exportação de ferro-nióbio rendeu um valor de US$ 2 bilhões, representando apenas 0,8% do valor total das exportações no ano” (Ricardo Gonçalves)

Gonçalves detalha que a mineração é feita a céu aberto, tanto em Araxá (MG) quanto em Catalão (GO). Em Araxá, não são utilizados explosivos na mina, sendo realizada apenas escavações. A partir daí, “o minério extraído é transportado para a unidade de beneficiamento, onde passa pelo processo de concentração para elevar o teor de nióbio. Depois, ocorre o refino e a purificação, resultando no composto que permite a confecção dos produtos”. 

Controle nacional
Mesmo com a evolução significativa das exportações de ferro-nióbio, a grandeza do valor produzido por elas representou apenas 5,6% do valor total de bens minerais exportados em 2017. De acordo com dados do Ministério da Economia, Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), em 2017, as exportações de minério de ferro, por exemplo, somaram US$ 19,1 bilhões. Esse valor representa cerca de 67,6% do valor total das exportações de bens minerais primários, como ilustra Gonçalves. 

“É improcedente a ideia difundida de que o nióbio deveria ter seu preço aumentado. Também não faz sentido aumentar a produção. A demanda internacional ainda é limitada e totalmente suprida” (Gonçalves)

Em 2018, “a exportação de ferro-nióbio rendeu um valor de US$ 2 bilhões, representando apenas 0,8% do valor total das exportações no ano”. Junto a isso, o pesquisador avalia como improcedente a ideia difundida de que o nióbio deveria ter seu preço aumentado. “Caso isso aconteça, os principais clientes internacionais vão recorrer a outras alternativas, seja explorando novas jazidas em outras partes do mundo ou investindo em substitutos como o vanádio e titânio. A demanda internacional ainda é limitada, mesmo com a diversidade de aplicações.”

Onde o material pode ser utilizado
Por possuir grande resistência e condutibilidade, o nióbio pode ser utilizado em diversas situações. As aplicações variam desde aços microligados, com proveito intenso na construção civil e na indústria mecânica, até a produção de liga de ferro, criando vigas mais resistentes – integrando pontes, por exemplo. É a resistência a altas temperaturas que faz com que as ligas do material também sejam utilizadas em dutos de óleo e gás para abastecer distribuidoras de combustíveis e turbinas de avião. Sua versatilidade faz com que o nióbio seja usado na fabricação de peças de carros, permitindo a produção de veículos mais leves. Ele é aplicável na indústria automotiva, aeroespacial e ferroviária pela segurança, força e resistência ao desgaste, fatores importantes para esses setores. Com redução de peso, maior maleabilidade, soldabilidade e uniformidade, o nióbio fornece uma melhor performance para os produtos aos quais é adicionado. Além disso, por reduzir o consumo de combustível e de matérias-primas, o uso do nióbio pode diminuir as emissões, sendo positivo para o meio ambiente. 

O nióbio é aplicado na indústria automotiva, aeroespacial e ferroviária pela segurança, força e resistência ao desgaste, fatores importantes para esses setores. 

Sobre o exemplo da indústria automobilística, Gonçalves aponta que a adição de 300 gramas de nióbio ao aço usado na fabricação de um carro é capaz de torná-lo mais leve e resistente a colisões; e, ao reduzir seu peso final, possibilita a economia de combustível. “Desse modo, os resultados exitosos na relação com o meio ambiente são constatados na redução da emissão de CO2, nos processos de produção de aço e vantagens na economia de combustível. Destaca-se, ainda, o uso potencial do nióbio em baterias para carros elétricos.” 

Por outro lado, o professor pondera que a utilização do nióbio em produtos finais da indústria automobilística, ou o uso em aços inoxidáveis e aços estruturais, gera outros efeitos na rede de produção do metal. “A precarização e os riscos para a saúde do trabalhador nos complexos de minas e siderurgia, os impactos ambientais nos municípios mineradores, as denúncias de contaminação, a pilhagem dos territórios, os conflitos com comunidades vizinhas das minas e a disputa pelo subsolo são alguns exemplos.”

Novas reservas

“É um argumento usado especialmente pelo atual governo para deslegitimar os direitos dos povos indígenas, disseminando a ideia de que eles e seus territórios são entraves para o desenvolvimento do país”, diz Gonçalves sobre a necessidade de abrir novas fronteiras extrativas no Brasil. 

Existem muitos depósitos conhecidos de nióbio no mundo, mas que não são explorados. Esse fato, como argumenta Gonçalves, é devido ao cenário da oferta e da procura. “Apesar do aumento no seu consumo nos últimos anos e das novas aplicações, o mercado do metal é restrito e a demanda ainda é limitada. Não faz sentido aumentar a produção sem demanda crescente.”

As reservas de nióbio em operação no Brasil e nos demais países suprem a demanda mundial. Como observa o pesquisador, “apenas as reservas da CBMM, em Araxá (MG), são capazes de suprir a demanda global atual, caso se mantenha a mesma, por mais 200 anos”. Em relação a essa situação, Gonçalves problematiza a justificativa de que novas fronteiras extrativas do nióbio precisam ser abertas em outros territórios para contribuir com a autonomia econômica do Brasil. “É um argumento usado especialmente pelo atual governo para deslegitimar os direitos dos povos indígenas, disseminando a ideia de que eles e seus territórios são entraves para o desenvolvimento do país.” 

O nióbio é insubstituível?
O nióbio não é insubstituível. Há outros produtos e substâncias que apresentam, aproximadamente, as mesmas propriedades. Exemplos são o titânio, com reservas em diversos países, como China, África do Sul, Canadá, Índia e Austrália; o vanádio, encontrado na Rússia, China e África do Sul; e o tântalo, com reservas no Brasil e Austrália, como aponta Gonçalves. 

O professor esclarece que, no campo siderúrgico, o titânio e o vanádio são elementos microligantes e cumprem, basicamente, a mesma função que o nióbio. “O tântalo apresenta significativa afinidade geoquímica com o nióbio, ostenta possibilidades de aplicação em superligas e na indústria aeronáutica para fabricação de turbinas. Contudo, esse elemento ainda possui preços mais elevados e maior densidade do que o nióbio.”