“É de forma lamentável e com muita tristeza que vemos estes cortes. A notícia que tínhamos recebido ainda como uma possibilidade está se concretizando em um espaço de tempo muito curto”, foi desta forma que o pró-reitor adjunto de Pós-graduação e Pesquisa (Propp) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Luis Paulo da Silva Barra, recebeu a notícia do corte de 2.700 bolsas em programas de pós-graduação de todo o país, anunciado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior (Capes) na última terça-feira, 4. No Brasil, serão cortadas 2.331 bolsas de mestrado, 335 de doutorado e 58 de pós-doutorado.
Na UFJF, o percentual de congelamento de bolsas nos programas afetados é de 65,8%. Os cursos de doutorado não sofreram cortes. Os recursos congelados referem-se a cursos com duas avaliações nota 3 consecutivas e, também, a cursos avaliados com nota 4 que caíram para nota 3 na avaliação do próprio órgão: Matemática, Ecologia e Enfermagem.
Os programas de pós-graduação são avaliados com conceitos que variam de 3 a 7 – sendo 3 a nota mínima exigida pela Capes para a aprovação. A avaliação leva em consideração a produção científica do corpo docente e discente, a estrutura curricular do curso e a infraestrutura de pesquisa da instituição, dentre outros fatores. O contingenciamento anunciado não afeta quem já recebe o benefício.
De acordo com Barra, a escolha da Educação como um dos principais alvos dos cortes de verbas governamentais apresenta-se como uma estratégia política. “Ainda que a gente admita que exista a necessidade de cortes por parte do Governo, vemos que essa área deveria ser poupada. Particularmente, a questão do corte das bolsas em pós-graduação coloca em risco uma grande quantidade de programas de pós-graduação que estão em situação inicial e que, por diversos fatores específicos, podem não ter conseguido avançar no seu conceito. Isso vai atingir, principalmente, as universidades menores e os programas mais recentes”, pontua.
Através de nota, a Capes argumentou que a medida foi tomada com o propósito “de alinhar a concessão de bolsas no país à avaliação periódica, preservando os cursos mais bem avaliados nos últimos 10 anos”. As notas analisadas foram as obtidas nas avaliações trienal de 2013 e quadrienal de 2017. Com o anúncio, a Capes chega a uma redução total de 6.198 bolsas em 2019. O novo bloqueio representa uma redução de R$ 4 milhões em 2019; até 2020, o contingenciamento deve representar R$ 35 milhões.
Programas afetados
“No total, perderemos cerca de 50% das bolsas do programa”, enfatiza o coordenador do Mestrado Acadêmico em Matemática, Eduard Toon. O professor observa que a pós-graduação em matemática tem a particularidade de ter a maioria dos alunos de baixa renda, o que dificulta a realização do curso sem a bolsa. “Com este corte brutal, enfrentamos a séria possibilidade de que, em breve, nosso programa seja descredenciado.” Toon ainda observa que, pelo fato de a matemática se tratar de uma ciência de base, as chances de que pesquisas consigam algum tipo de financiamento privado são baixas. “Este tipo de corte vai na contramão do que países desenvolvidos fazem. Lá, os governos investem fortemente em ciências de base pois sabem que investimentos nestas áreas possibilitam desenvolvimento científico e tecnológico a médio e longo prazos”. Segundo ele, o programa de mestrado realiza pesquisas relevantes para o desenvolvimento da área e da sociedade. “Pode não parecer, mas a matemática está no nosso dia a dia. Sem ela não teríamos iluminação artificial, internet ou previsões climáticas, por exemplo. Estudos nesse campo nos ajudam a pensar de forma coerente e obter soluções para grandes problemas de forma clara e precisa. Não é possível imaginar nosso mundo sem a matemática.”
De acordo com o coordenador do Programa de Pós-graduação em Ecologia, Nathan Barros, o congelamento prejudica significativamente a produção de conhecimento adquiridos durante o processo de pesquisa. “Recebo a notícia com preocupação e de forma revoltante, tendo em vista os avanços que a ciência trouxe para o país nos últimos anos, o que tende a diminuir. A mão de obra da ciência no Brasil é feita por estudantes de mestrado e doutorado. A minha preocupação é, justamente, neste corte contra pessoas que poderiam colaborar com um avanço científico e tecnológico ainda maior para o país.” Segundo Barros, o primeiro impacto para o programa será a diminuição do número de alunos e, consequentemente, uma redução nos projetos científicos. “Além disso, nosso programa tem uma grande capacidade de levantar recursos financeiros, com projetos que trazem dinheiro para a Universidade; com o corte nas bolsas, eles também podem ser impactados.”
A coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Nádia Fontoura Sanhudo, também avalia negativamente os impactos do corte, sobretudo para os estudantes que estão iniciando suas carreiras acadêmicas. “As bolsas são concedidas aos pesquisadores para que seja possível cobrir os custos de taxas de publicações científicas, participação em eventos e outros gastos para a realização do mestrado. Os alunos estão no centro do processo de formação. Precisamos da dedicação integral deles para atendermos aos critérios de avaliação dos programas de pós-graduação estabelecidos pela Capes.” Segundo Nádia, há uma demanda pelo mestrado em enfermagem na Zona da Mata Mineira, uma vez que o programa recebe enfermeiros egressos das faculdades da cidade e região, bem como, do estado do Rio de Janeiro. “Os estudos que desenvolvemos buscam consolidar a produção, difusão e divulgação do saber em saúde e em enfermagem, produzidas pelos nossos docentes e discentes. A busca por formação em nível de mestrado se confirma com as 55 inscrições que recebemos no processo seletivo de 2019.”