Nathan Barros integrou painel da ONU no Japão sobre aquecimento global (Foto: Alexandre Dornelas/UFJF)

Nathan Barros integrou painel da ONU no Japão sobre aquecimento global (Foto: Alexandre Dornelas/UFJF)

A Terra possui seu próprio sistema natural de climatização. Gases concentrados na atmosfera formam uma camada que permite a absorção e a permanência dos raios solares no planeta. Esse mecanismo – o efeito estufa – garante a temperatura perfeita para a manutenção da vida na Terra. Porém, o excesso desses gases faz com que a temperatura cresça exacerbadamente. O gás carbônico, emitido a partir da queima de combustíveis fósseis (gasolina, por exemplo) e processos industriais, e o metano, emitido principalmente pela pecuária, são protagonistas no agravamento do efeito estufa. Um aumento de “apenas” 3,5 °C da temperatura mundial acarretaria na extinção de 70% de todas as espécies, segundo projeções da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Com o objetivo de reunir conhecimento sobre as mudanças climáticas, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) criou, com apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Desde 1988, oferece aos países informações científicas para que criem formas de lidar com as mudanças climáticas. O IPCC é a maior autoridade mundial quando se trata de aquecimento global. No início deste mês, o painel se reuniu em Quioto, no Japão, para 49° sessão. A pauta era analisar as modificações feitas no documento que apresenta diretrizes para a elaboração de inventários que quantificam a emissão de gases do efeito estufa (GEE) em cada setor (emissão de automóveis, por exemplo). Este “manual” foi escrito pelos principais especialistas em mudanças climáticas do planeta. Um dos autores foi o professor do Laboratório de Ecologia Aplicada (LEA) da UFJF, Nathan Barros. “Participei de quatro reuniões, duas em 2017 e duas em 2018. Depois da última revisão de governo nós trabalhamos durante três semanas e entregamos a versão final, que então foi colocada para votação nesta plenária do IPCC. Nós eramos 20 autores, mas participar dessa plenária somente quatro foram nominados”, conta o pesquisador.

Dois dias de treinamento. Quatro dias de reunião. 20 horas cada. Países discutindo, tentando chegar em um acordo que tem o potencial de mudar diretamente o futuro do planeta. Delegados e diplomatas votam, escutam e questionam os pontos que estão sendo votados e, assim como qualquer outra tomada de decisão das ONU, o IPCC precisa ter unanimidade. Todos os países precisam chegar a um entendimento para que o documento seja aceito. Durante o treinamento, os autores receberam instruções de como deveriam se comportar diante desta situação. “Nós não poderíamos interferir nas discussões, mas poderíamos responder as perguntas feitas pelos representantes dos países. Existe uma influência enorme da ciência, moldando as políticas e os impactos futuros das emissões de gases”, esclarece Barros.

Emissão de GEE por reservatórios de hidrelétricas

Desde 2016, Barros trabalha na força-tarefa do IPPC, responsável pelas diretrizes dos inventários nacionais de gases do efeito estufa, que todos os países que assinam o Acordo de Paris tem que emitir a cada dois anos. O manual de diretrizes atual é de 2006. Recentemente, o IPCC viu que existe a necessidade de atualizar este guia. “Além de adaptar o conteúdo já existente, também pensamos em novas áreas para incluir no inventário. Isso aconteceu para reservatórios de água, por exemplo reservatórios de hidroelétricas”, explica. Acreditava-se que a energia produzida em hidrelétricas era “limpa”, porque utiliza-se apenas o movimento da água para gerá-la. Porém, ao construir uma usina, é obrigatória a retirada da vegetação da área a ser inundada. A decomposição da matéria orgânica que sobra do corte das árvores e do carbono presente no solo ocasiona a formação de gás carbônico e metano. Além disso, o rio continuará trazendo sedimentos e matéria orgânica para o reservatório. “A produção desses gases torna-se mais intensa na Amazônia devido à presença abundante de matéria orgânica e da alta temperatura, que favorece a decomposição”, afirma Barros. O metano é formado em zonas sem oxigênio, geralmente áreas mais profundas do reservatório, por bactérias produtoras do gás, as chamadas metanogênicas.

As publicações do grupo de pesquisa do LEA-UFJF coordenado pelos professores Nathan Barros, Fábio Roland e André Megali representam as principais pesquisas na área de emissão de gases do efeito estufa por ambientes aquáticos do mundo. Incluir esta área nos inventários nacionais significa dar a devida atenção para mecanismo que representa até 2% das emissões mundiais de GEE. “Foi muito interessante ver que a ciência que nós geramos aqui na UFJF é de ponta e que nossos resultados podem influenciar a esfera política mundial”, conclui