Nos últimos anos, observamos o fortalecimento da luta de mulheres, que foram responsáveis por inúmeras conquistas reais e pelo aumento da discussão sobre direitos e espaços em nossa sociedade. Esses avanços, contudo, não vieram necessariamente acompanhados de mudanças concretas na vida de milhares de mulheres em todo o país. Desigualdade de gênero, violência e várias outras formas de opressão ainda continuam presentes na sociedade, fazendo com este dia 8 de março não seja motivo de muitas comemorações.
Para a ouvidora especializada da Diretoria de Ações Afirmativas, Cristina Bezerra, os desafios que as mulheres enfrentam na UFJF são muito próximos do que o que as mulheres enfrentam na sociedade como um todo. “É o desafio contra o racismo, contra o machismo, contra a homofobia, contra o assédio e, principalmente, o desafio de ter sua voz e seu conhecimento legitimado pelo espaço acadêmico e pela pesquisa nas diversas áreas de conhecimento de forma geral. Em algumas áreas, como das exatas, isso é até mais grave, onde a maioria dos estudantes e professores é formada por homens.”
Ainda segundo a ouvidora, já é possível observar, a partir do trabalho da Diretoria de Ações Afirmativas (Diaaf), elementos que demonstram algumas conquistas. “Quando uma universidade se volta para essas questões e valoriza as ações afirmativas, outras conquistas vêm junto. Por exemplo, os espaços de acolhimento, os coletivos feministas como sujeitos de diálogo e sujeitos de construção de possibilidades dentro da universidade, o enfrentamento da violência contra a mulher e o assédio são temas que estamos problematizando. Essas conquistas são importantíssimas dentro do ambiente universitário, não só na UFJF.”
Ela exemplifica as conquistas a partir de situações concretas, como a gestão da Universidade. “A maioria é formada por mulheres.” Em relação à comunidade em geral, no entanto, a ouvidora destaca que ainda existe um espaço aberto para várias políticas de inclusão e de fortalecimento do papel da mulher na sociedade, na pesquisa, ensino, extensão, no ensino da pós-graduação. “É um grande indicador para nós quando as mulheres chegam à pós-graduação e colocam temas relativos ao feminismo, à vida das próprias mulheres, isso tudo deixa a gente muito contente. Mas ainda temos muito a fazer, ainda temos uma sociedade na qual a violência contra a mulher mata e o machismo divide a sociedade, um país onde os governantes muitas vezes diminuem o papel da mulher.”
Conquista de espaços
Para a professora do programa de pós-graduação em Saúde Coletiva Isabel Leite, um dos grandes desafios da mulher na pesquisa é o fato de sua jornada dela nunca se restringir apenas ao trabalho acadêmico. “Protagonizamos amplos campos de atuação e articular tudo isso não é uma tarefa fácil. Há muito pouco tempo atrás, quando o número de pós-graduações ainda era restrito, para uma mulher conseguir seu título era necessário, muitas vezes, deixar a família, filhos pequenos, ou seja, um desafio quase impeditivo.”
Outro fator destacado pela professora são as estatísticas que mostram que o campo da pesquisa esteve, durante muito tempo, restrito ao mundo masculino. “Se o espaço na educação formal de nível superior foi dominado muito antes pelos homens, exemplo disso é que a primeira turma de medicina tinha apenas uma mulher, imagina na pós-graduação? A mulher teve que conquistar a duras penas um lugar na academia. Esse cenário se repete em diversos setores da sociedade, as mulheres sempre correndo atrás de um prejuízo histórico. Tivemos uma entrada tardia, imposta pela sociedade que nos excluiu durante muito tempo. O que buscamos é fazer um resgate desse tempo perdido.”
Na avaliação da técnica de laboratório de análises clínicas do ICB e coordenadora de saúde do Sintufejuf, Luana Lombardi, as maiores lutas das mulheres hoje são em função do reconhecimento do trabalho, da dupla ou tripla jornada e no enfrentamento aos assédios morais e sexuais neste ambiente. “Não há conquistas e avanços sem luta e mobilização. O direito ao voto das mulheres foi conquistado com luta e mobilização. Sem questionarmos o que está posto não teremos avanços. Quando chegamos ao ponto de sofrer ataques a direitos, como o de se aposentar dignamente e com justa idade, por exemplo, quando temos o nosso direito de ir e vir ameaçados por altos índices de feminicídios, quando retiram da mulher o direito de fazer escolhas sobre o seu próprio corpo, então é tempo de mobilização e luta.”
Para a estudante de Direito, integrante do DCE e Coletivo Maria Maria, Walquíria Paceli de Oliveira e Vilas, o grande desafio da geração jovem consciente das causas femininas é o de lutar até que não seja mais preciso reivindicar igualdade, respeito e liberdade. “Temos que lutar contra pautas políticas que restringem nossos direitos, lutar por liberdade, e pelo simples e infinitamente rico direito à vida. Combater o assédio, subjulgamento, salários inferiores, rótulos diversos. Tudo se respalda no fato de que não somos vistas e nem saímos do mesmo patamar que os homens quando disputamos, apesar de sermos infinitamente capazes de chegar a qualquer lugar, independente de onde partimos. É preciso dizer isso sem medo da repercussão. É preciso conscientizar demais mulheres até que todas sejamos livres no sentido mais amplo. Enquanto o dia 8 ainda tiver passeatas, atos, e reivindicações, significa que algo ainda precisa mudar. Avançamos, mas não o suficiente.”