Judith Marshall:  “O desastre ambiental no Canadá aconteceu em agosto de 2014, enquanto em Mariana ocorreu em novembro de 2015, ambos com impactos sociais e ambientais grandes Foto Twin Alvarenga

Judith Marshall: “O desastre ambiental no Canadá aconteceu em agosto de 2014. O de Mariana em novembro de 2015, ambos com impactos sociais e ambientais grandes” (Foto: Twin Alvarenga)

“Ao citar fatores institucionais e políticos do rompimento da barragem de Mount Polley, sinto que os colegas conseguem pontuar semelhanças com o desastre ocorrido em Mariana.” Com essa angulação, a pesquisadora canadense associada do Centre for Research on Latin America and the Caribbean (Cerlac) da York University, Judith Marshall, ministrou palestra, no anfiteatro do Instituto de Ciências Humanas (ICH) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), traçando comparações e apontando semelhanças entre o rompimento da barragem de Mount Polley, na província da Columbia Britânica, no Canadá, e o rompimento da barragem no Rio Doce, em Mariana (MG).

Na primeira parte do encontro, Judith informou dados gerais sobre a mina de Mount Polley. “É uma mina de cobre, ouro e prata que pertence à empresa Imperial Metals. É uma empresa média, diferente da transnacional Vale, mas  é um membro importante na mineração da Columbia Britânica.” Em seguida, abordou dados resultantes dos rompimentos das duas barragens. “O desastre ambiental no Canadá aconteceu em agosto de 2014, enquanto em Mariana ocorreu em novembro de 2015, ambos com impactos sociais e ambientais grandes. No caso de Mount Polley, o ecossistema da água foi poluído e os arredores da mina, uma área importante para peixes, foi gravemente afetada. Segundo ela, ao contrário de Mariana, no Canadá não houve fatalidade, mas muitas pessoas perderam seus meios de subsistência, incluindo milhares de indígenas. “A área afetada atraía bastante turismo, principalmente pela pesca. Com o rompimento, isso está em falta. No caso do Brasil houve fatalidades, além de muitas pessoas perderam seus bens materiais.”

A pesquisadora analisa as relações de poder entre políticos e empresas transnacionais. “São alinhamentos ideológicos de uma ordem política global, o que desmistifica teorias sobre o mito do primeiro mundo.” Ao apontar semelhanças que caracterizam os desastres sob o ponto de vista institucional, considerou hipóteses como: orientações políticas dos governos; alertas prévios não atendidos; minimização do rompimento pelas empresas; a maneira que ambas instituições reagiram, tanto durante o ‘boom’ dos impostos e dos preços altos; contribuições políticas para o governo das empresas privadas e todo o lobby que essas instituições praticavam.

Viés ideológico globalizado

“Nos dois casos os discursos de um viés ideológico globalizado, num mundo onde os atores mais poderosos são empresas transnacionais, estiveram presentes. Em ambos, o aspecto mais dramático foi a mudança do relacionamento no poder entre governo e empresas. Mudança que eleva as dimensões das empresas e o poder dos seus discursos, através de uma linguagem econômica mundial. Os investidores fazem lobby com o governo para que renuncie o processo de aprovação de uma mina, que, ao invés de cumprir o prazo determinado para abrir uma nova mina, esse tempo é reduzido. No Brasil ocorre a mesma coisa, o governo ao invés de governar para o bem-estar de todos e controlar o investidor, para garantir que o investimento sirva à  cidadania, eles promovem o eco dos discursos dos investidores sobre a necessidade de garantir o bom funcionamento de uma mina”.

Judith identifica, ainda, relações de omissões das empresas. “Houve momentos em que as barragens foram identificadas com pontos fracos estruturais, mas por conduta e necessidade não pararam a produção pois os preços eram altos e com impostos, necessitavam obter lucros para os sócios, a tendência das empresas foi rejeitar esses alertas.” Sob essas características a pesquisadora identificou uma lógica interna no comportamento das empresas que justificam os resultados catastróficos dos rompimentos das barragens.

De acordo com o professor do PPGeo e coordenador do Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (Poemas), Bruno Milanez, é importante trazer esse debate para a UFJF e para Juiz de Fora, pelo fato de a cidade estar inserida numa realidade econômica mineradora. “Estamos inseridos no debate da realidade mineral, e, às vezes, fenômenos como esse parecem distantes e que não nos dizem respeito.”

Após a palestra, o debate foi aberto ao público, fomentando a discussão sobre o tema abordado. Estiveram entre os presentes alunos, professores e convidados externos.