“Fundão não foi a primeira, e, infelizmente não será a última.” Com esta frase, o professor Miguel Fernandes Felippe, do Departamento de Geociências da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), sintetizou sua palestra “Causas e Consequências do Rompimento da Barragem de Fundão”. No que chamou de “tragédia anunciada”, o professor abordou o tema junto a membros responsáveis pela defesa civil, como os órgãos municipais e o Corpo de Bombeiros. Diante das evidências apresentadas, falou das necessidades de se preocupar com eventos semelhantes ao ocorrido em Mariana (MG) em novembro de 2015.
A palestra fez parte do I Seminário Regional de Gestão em Proteção e Defesa Civil, realizado nesta quinta-feira, 24, no Instituto de Ciências Humanas (ICH) da UFJF. O maior desastre ambiental do Brasil também foi tema da exposição do capitão do Corpo de Bombeiros Rafael Neves Cosendey, que trabalhou em Mariana logo após o rompimento da barragem. O professor Miguel Fernandes esteve na região seis dias depois das ocorrências e constatou uma série de alterações ambientais em diversos âmbitos.
No que chamou de “alertas negligenciados”, Fernandes apontou o aumento nos índices de incidentes em mineração após a alta no preço destas matérias primas no mercado internacional. Na barragem de Fundão, inaugurada em 2008, grande parte de seu licenciamento foi realizado durante a alta no ciclo das commodities do minério de ferro ali presente, sobretudo alavancado pela alta exportação ao mercado chinês. Segundo o pesquisador, mesmo com a desaceleração da economia do país asiático, ocorrido antes da tragédia, os lucros da mineradora Samarco permaneceram estáveis, o que levou a uma diminuição dos custos de produção da empresa, por exemplo, em segurança.
Fernandes acrescentou que as barragens empregadas na região eram, no caráter técnico, as de menor custo dos modelos disponíveis no Brasil. Em 2009, apenas um ano após a inauguração de Fundão, pesquisas já apresentavam problemas com a captação de água, enquanto o volume de resíduos acumulados crescia exponencialmente. Em abril de 2015, ano da tragédia, estudos apontavam um possível rompimento, inclusive com grande precisão nas consequências, como no número de mortos, estimado em 20, enquanto houveram 19 vítimas fatais.
Consequências e risco eminente
Já sobre as consequências, Fernandes questionou o foco na região urbana: “Há um foco muito grande nas áreas urbanas que representam menos de 5% da área afetada. Enquanto isso, poucos sabem das áreas rurais.” O professor apontou também a ausência de uma cobertura mais heterogênea na extensão da bacia do Rio Doce, já que ao longo de sua abrangência, moradores, flora, fauna e cursos d’água foram afetados de maneiras bastante distintas.
A palestra trouxe estudos que demonstram desde uma redução exponencial da ictiofauna, até a pesquisas que apresentam os detritos presentes na água ao longo da bacia do Rio Doce, grande parte extremamente prejudiciais à saúde. O professor abordou também detalhes menos técnicos, como imagens impressionantes da lama, e relatos de moradores do local fortemente afetados, contados a Fernandes durante suas visitas de campo.
Como indício de que dificilmente a tragédia de Mariana será a última do Brasil, o professor apresentou um gráfico em que estão presentes as barragens consideradas de risco no país. Segundo os dados, 34 são consideradas de alto risco, 96 de médio e 532 de baixa periculosidade, a categoria na qual estava inserida a barragem do Fundão.
O I Seminário Regional de Gestão em Proteção e Defesa Civil é uma realização da parceria entre a UFJF e o 3º Comando Operacional de Bombeiros, visando fortalecer a proteção e a gestão de riscos nos 144 municípios na Zona da Mata e Campos das Vertentes abrangidas pelo 3º COB. Confira aqui a programação completa.
Outras informações: (32) 4009-9853 (3º Comando Operacional de Bombeiros)