Álvaro Avezum é um dos quatro cientistas brasileiros com produção acadêmica de maior impacto no mundo (Foto: Raquel Cunha / Folhapress)

Álvaro Avezum é um dos quatro cientistas brasileiros com produção acadêmica de maior impacto no mundo (Foto: Raquel Cunha / Folhapress)

A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) recebeu, na quinta-feira passada, 27, o professor Álvaro Avezum, diretor da Divisão de Pesquisa do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. Avezum figura como um dos cinco cientistas brasileiros de maior impacto acadêmico mundial, segundo a lista “As mentes científicas mais influentes de 2015” (The world’s most influential scientific minds 2015), publicada pela Thomson Reuters.

Durante a conferência “Excelência e internacionalização em pesquisa”, realizado pelo Programa de Pós-graduação em Saúde (PPgS – UFJF), em parceria com o Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde (Nupes – UFJF), o pesquisador falou sobre os desafios e benefícios de desenvolver pesquisas com colaboração internacionais.

Em entrevista exclusiva, Avezum compartilhou suas experiências como pesquisador, sua percepção do cenário acadêmico brasileiro, dicas para ter impacto no trabalho acadêmico e sugestões para aproximar os laços com instituições no exterior.

UFJF: Qual seria o perfil de um pesquisador?

Avezum: O pesquisador deve ter o objetivo de idealizar, conceber e realizar pesquisas que tenham benefício populacional. Uma das coisas que a pesquisa faz é identificar áreas do conhecimento que necessitam de maior esclarecimento e de confirmação. Se o pesquisador estiver sintonizado com essas necessidades não atendidas, as questões científicas serão muito bem colocadas. O ponto inicial da pesquisa é a identificação correta de uma questão, e esta deve ser procurada onde exista real necessidade. Feito isso, o resultado da pesquisa será aplicável para melhorar a sociedade.

O pesquisador deve ter o objetivo de idealizar, conceber e realizar pesquisas que tenham benefício populacional.

É claro que o perfil envolve, também, treinamento formal. Na área da saúde, por exemplo, existem médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc., todos com formação na graduação nessas áreas. Isto, por si só, é insuficiente. O indivíduo deve ter um treinamento formal dentro da área de pesquisa. Não dá para improvisá-la.

Uma vez que o indivíduo tenha treinamento formal e busque onde há necessidade de respostas para trazer benefícios populacionais, só vai faltar o terceiro complemento: como viabilizar a pesquisa. Isso envolve recursos humanos e estrutura física para que o trabalho seja realizado de forma apropriada, com resultados confiáveis e passíveis de serem implementados.

Avezum apresentou na UFJF a conferência “Excelência e internacionalização em pesquisa”, realizado pelo Programa de Pós-graduação em Saúde (Foto: Alexandre Dornelas)

Avezum apresentou na UFJF a conferência “Excelência e internacionalização em pesquisa”, realizado pelo Programa de Pós-graduação em Saúde (Foto: Alexandre Dornelas)

UFJF: Como você encara a percepção do exterior sobre as pesquisas realizadas no Brasil?

Avezum: Não é novidade que o mundo tem se modificado de maneira contínua e muito rápida. Os limites entre os países estão cada vez menos perceptíveis e, no campo da pesquisa, nós temos trabalhado de forma mais horizontal, menos segmentada. Essa chamada globalização, dentro da pesquisa, significa que realizar pesquisas internacionais em que centros de excelência ou universidades colaborem, tanto nacionalmente quanto internacionalmente, tornou-se uma necessidade. Essas questões respondidas por meio da pesquisa internacional têm a possibilidade de ser aplicadas em todos os locais do mundo, em todas as regiões geográficas e em todas as etnias.

Para trabalharmos internacionalmente é fundamental que o pesquisador tenha contato com universidades fora do Brasil, e que os indivíduos fora do país tenham contato com as nossas universidades. Com esse intercâmbio entre pesquisadores e projetos em comum — que permitam que estes pesquisadores, com as redes colaborativas, trabalhem juntos –, nós temos vários ganhos, desde a aplicação dos resultados até a eficiência na realização da pesquisa em si.

Essa chamada globalização, dentro da pesquisa, significa que realizar pesquisas internacionais em que centros de excelência ou universidades colaborem, tanto nacionalmente quanto internacionalmente, tornou-se uma necessidade.

Então, pesquisa colaborativa internacional atende, também, uma necessidade dos programas científicos das universidades de que as publicações aconteçam em revistas científicas de alto impacto. Isso não significa deixar de lado a colaboração nacional. Elas andam juntas. Você trabalha em rede nacional e, essa mesma rede, colabora com outras internacionalmente. Quando nós falamos em inserção internacional, nós estamos deixando subentendido a colaboração nacional.

UFJF: Onde você vê o desafio para a realização dessas parcerias?

Avezum: Os desafios podem ser categorizados em alguns níveis.

O primeiro é a necessidade de um pesquisador ter interesse. Não são todos os profissionais que têm interesse na pesquisa. O indivíduo tem que ter uma vocação, não necessariamente deixando de lado a atuação profissional em si. Como médico, trabalho na assistência, trabalho no ensino e trabalho na pesquisa.

Não são todos os profissionais que têm interesse na pesquisa. O indivíduo tem que ter uma vocação

“É fundamental nas universidades que haja mentores que inspirem os alunos a seguirem na área da pesquisa”, considera Avezum (Foto: Alexandre Dornelas)

Como o jovem desenvolve interesse pelo campo da pesquisa? Ele tem que ter mentores. É fundamental nas universidades que haja mentores que inspirem graduandos e pós-graduandos, que inspirem os alunos, a seguirem na área da pesquisa.

Uma vez que esse jovem tenha interesse inicial e um treinamento inicial, ele precisa de uma estrutura para mantê-lo no exterior e, posteriormente, voltar. Então, veja: ele tem vocação, tem treinamento, a estrutura permitiu seu contato com outras instituições. Depois vem o desafio que, talvez, seja o mais importante: é permitir que a volta dele seja muito eficiente para implementar as coisas novas e positivas que ele viu no exterior. Tem que existir condições de desaguar os conhecimentos apreendidos lá fora.

Tem que existir condições de desaguar os conhecimentos apreendidos lá fora.

Feito isso, é uma questão de tempo para que a produção científica seja maximizada. E a colaboração e de duas vias. Ao mesmo tempo em que aprendemos com outros países, muitas coisas são feitas no Brasil e podem ser aplicadas por eles. Por exemplo, nós temos aqui o programa Saúde da Família, que é muito útil e já reconhecido por publicações em seu papel na redução de mortes por problemas cardiovasculares, porque é uma assistência vascularizada em quase três quartos da população brasileira. É um sistema que pode servir de modelos para outros países.

UFJF: Você se divide entre as funções de professor, médico e pesquisador. Você acredita que a falta de um tempo de dedicação exclusiva para a pesquisa é prejudicial para o desenvolvimento da pesquisa?

Isso não significa deixar de lado a colaboração nacional. Elas andam juntas. Você trabalha em rede nacional e, essa mesma rede, colabora com outras internacionalmente. Quando nós falamos em inserção internacional, nós estamos deixando subentendido a colaboração nacional.

Avezum: O indivíduo tem que ter um tempo dedicado para suas atividades. Quando eu digo “dedicado” eu não quero dizer exclusivo. Eu me divido entre lecionar, atender e pesquisar por opção. Porque a prática médica me torna melhor pesquisador, assim como meu trabalho na educação.

Então, se possível e havendo o interesse, eu defendo a ideia do indivíduo trabalhar nessas três áreas. Claro que, se ele tem 80% do tempo dele dedicado a assistência e apenas 20% para o ensino e para a pesquisa, é muito difícil ele produzir cientificamente. É necessário um tempo substancial para a pesquisa. São áreas que se complementam. É meu exemplo particular, e defendo essa prática para os mais jovens, também.