III Encontro de Ética em Pesquisa com Seres Humanos integra a Semana de Ciência, Tecnologia e Sociedade (Foto: Pressfoto / Freepik)

III Encontro de Ética em Pesquisa com Seres Humanos integra a Semana de Ciência, Tecnologia e Sociedade (Foto: Pressfoto / Freepik)

Como parte da programação do III Encontro de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, o professor Paulo Cortes Gago (UFRJ) apresentou nessa quinta feira, 20, a palestra “As especificidades da ética em pesquisa na área de Ciências Humanas e Sociais: a resolução 510/16”. O Encontro integra as atividades da Semana de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Dos campos de concentração à regulamentação de pesquisas

No começo de sua fala, o professor traçou um breve histórico da ética em pesquisa, passando por alguns casos flagrantes de abusos, como as pesquisas realizadas em campos de concentração no regime nazista alemão e o Tuskegee (episódio que ocorreu entre 1932 e 1972, quando cientistas, buscando investigar a evolução de casos de sífilis não tratada, utilizaram 600 homens negros como cobaias, sem informá-los devidamente sobre os riscos ou sobre a existência de um tratamento eficaz para a doença).

Em seguida, Gago enumerou as primeiras iniciativas de regulamentação ética em pesquisas, como o Código de Nuremberg, em 1947, que propôs 10 princípios que deveriam guiar a utilização de humanos em pesquisas. No Brasil, a criação de um órgão regulador ocorreu em 1996, com o surgimento do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), vinculado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Professor afirma que garantia do anonimato e representação justa das realidades estudadas são fundamentais para quem participa em pesquisas (Foto: Alexandre Dornelas)

Professor afirma que garantia do anonimato e representação justa das realidades estudadas são fundamentais para quem participa em pesquisas (Foto: Alexandre Dornelas)

Particularidades das ciências humanas e sociais

Conforme o professor, essa submissão da ética em pesquisa às perspectivas do CNS criam dificuldades para a realização de estudos na área das ciências sociais, por não compreenderem certas particularidades. Foi buscando reduzir essas lacunas na regulamentação que, a partir de 2012, o órgão passou a formular uma resolução complementar, aprovada em 2016, após consulta junto à comunidade científica.

No entanto, a resolução 510 não eliminou todos os descompassos entre a norma e a realidade das pesquisas nas ciências humanas, havendo ainda algumas controvérsias. Tampouco atualizou a Plataforma Brasil, por onde os pesquisadores devem submeter seus projetos a avaliação, de acordo com as novas regras. Segundo o que explicou Gago, estão dispensados da avaliação dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) aqueles trabalhos que utilizam dados que garantam o anonimato dos participantes — como pesquisas de consulta a dados de acesso público, a bancos de dados anônimos ou pesquisas censitárias — ou pesquisas de revisão bibliográfica.

Para o professor, uma das grandes dificuldades de pesquisadores ao submeter seus projetos é avaliar quais os benefícios, diretos ou indiretos, oferecidos pela pesquisa aos participantes. Esses benefícios vão além de compensações financeiras, abrangendo a representação justa dessa vivência, melhora na qualidade de vida para o indivíduo ou sua comunidade.

Há, além disso, a necessidade de transmitir ao participante a natureza da pesquisa, garantindo que este compreende seus riscos e benefícios. O registro do consentimento pode ser feito a partir de qualquer mídia e apresenta, também, algumas dificuldades. Gago exemplificou o caso de populações indígenas que não utilizam a escrita, ou populações que enfrentam algum tipo de risco inerente à sua realidade.

Palestrante abordou casos notórios, desde os campos de concentração à regulamentação de pesquisas (Foto: Alexandre Dornelas)

Palestrante abordou casos notórios, desde os campos de concentração à regulamentação de pesquisas (Foto: Alexandre Dornelas)

Riscos

A proposta da comunidade científica para a Resolução 510, barrada pelo Conep e ainda em aberto, pretendia associar os riscos ao participante à fases específicas da pesquisa. Conforme Gago, ao contrário das pesquisas na área médica, em que o risco ao participante se encontra no decorrer da própria pesquisa, os riscos nos projetos das ciências humanas surgem no momento de divulgação dos dados coletados. A garantia do anonimato e a necessidade de uma representação justa das realidades estudadas são fundamentais na avaliação desses riscos.

Questionado sobre os limites da avaliação do CEP sobre os projetos de pesquisa, o professor explicou que a metodologia do projeto passa a ser abarcada pela análise do Comitê, uma vez que uma metodologia que comprometa o próprio resultado do estudo torna fútil os riscos e o desgaste aos quais o participante pode vir a se submeter.

Informações sobre o processo de submissão de pesquisas estão detalhadas na página do CEP UFJF.

Outras informações:

Comitê de Ética esclarece sobre nova regulamentação para pesquisa