Experimente fazer “cosquinha” no seu próprio corpo. Já parou para pensar por que só sentimos e damos risada quando outra pessoa está fazendo “cosquinha” em nós? O cérebro humano é recheado de mecanismos que conversam entre si, emitindo sinais sobre nosso próprio corpo, avisando para o mesmo onde ele está, qual sua posição e o que ele está sentindo e enxergando. Nossos olhos são grandes parceiros do nosso cérebro: o último percebe o comando para fazer “cosquinha” no próprio corpo, e os olhos ajudam trazendo a confirmação visual de que é você fazendo. E o que acontece no nosso cérebro, então, quando nossos olhos mergulham no escuro enquanto estamos acordados – ou seja, quando piscamos?
Em mais uma edição do Ciclo de Conferências do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), que acontece nesta terça-feira, dia 1°, às 12h no Anfiteatro A, o convidado Pedro Vieira questiona de onde surge o motivo pelo qual não percebemos que estamos piscando. Ao longo de nossas vidas, podemos passar o equivalente a pouco mais de 22 dias no “escuro” de uma piscada (veja tabela abaixo), usando como referência a mais recente estimativa expectativa de vida do brasileiro liberada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Enganados” pelo próprio cérebro
Pós-doutorando em Fisiologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pedro Vieira relata que começou a estudar o piscar de olhos durante seu doutorado. “Atualmente, trabalho com a hipótese de que nosso sistema visual prevê que iremos piscar e, a partir daí, modifica sua atividade para que esse período não seja percebido conscientemente por nós”, explica. “O objetivo é identificar de onde está vindo o sinal que antecipa a piscada e como ele é utilizado pelo sistema visual para preenchê-la. É preciso apontar os mecanismos neurais que trabalham para que os milissegundos de escuridão sejam preenchidos no nosso campo de visão.”
O pesquisador observa que o estudo desses sinais que antecipam um evento não é inédito, visto que eles estão presentes também nos mecanismos que atuam para a estabilização da visão durante a ocorrência dos movimentos oculares. Não percebemos conscientemente, por exemplo, as imagens se tornarem embaçadas quando movemos o foco do nosso olhar.
Vieira também relata que os animais estudados ao longo da pesquisa — no caso, corujas da espécie Athene cunicularia, conhecidas popularmente como corujas-buraqueira — podem ser reintroduzidas em seu habitat natural após suas contribuições para o estudo. “As corujas são escolhidas porque possuem um sistema visual com propriedade similares ao de macacos e gatos”, esclarece Vieira. “Alguns dos testes que conduzimos consiste em deixá-las piscar naturalmente em um ambiente totalmente escuro, ou seja, que não oferece estímulo visual nenhum através da retina. Já observamos que, antes de realizar a piscada, existe uma atividade neuronal que se inicia, um ‘comando’ cerebral que é um forte indicador de que o sistema visual prevê que uma piscada irá ocorrer, modulando, assim, sua atividade.” Estudos como de Vieira têm o potencial de trazer resultados que impactam o campo da neurociência, um dos mais vastos e complexos da saúde, auxiliando a melhor compreensão e mapeamento do nosso cérebro e sistema nervoso humano.
Ciclo de Conferências do ICB
Palestra “Mecanismos neuronais subjacentes à estabilidade visual: preenchimento do escotoma temporal causado pelo piscar”
1° de março, terça-feira, às 12h, no Anfiteatro A do ICB