No mês marcado pelas reflexões, ações e celebrações em torno da Consciência Negra, o Museu de Cultura Popular, do Forum da Cultura da UFJF, traz ao público a exposição “Negritude”. A mostra reúne um rico acervo de objetos e representações religiosas que compõem parte da identidade negra e integram, de forma substancial, a cultura brasileira. Ela segue em cartaz até o dia 29 de novembro, com visitações de segunda a sexta, das 10h às 19h. A entrada é gratuita.
A escolha do nome da nova exposição buscou abranger alguns dos sentimentos, singularidades e valores culturais pertencentes à cultura dos negros. Uma maneira de demonstrar que, mais do que a diferença de pigmentação entre brancos e negros – uma questão meramente biológica – o termo ‘negritude’ é carregado de outras múltiplas camadas que perpassam fatos históricos, questões identitárias, a luta permanente contra políticas sistemáticas de destruição, entre outros pontos.
Ao todo, estarão em exibição mais de 80 itens, entre eles, representações de divindades que fazem parte dos cultos de matriz africana e da Mitologia Iorubá, figuras que simbolizam danças típicas do povo negro, adornos, entres outros. Tais peças oferecem ao público a oportunidade de entrar em contato com toda a herança cultural trazida pelas pessoas escravizadas do continente africano, em um dos períodos mais condenáveis da história do Brasil.
Do Candomblé, religião afro-brasileira que combina elementos das religiões africanas tradicionais com influências do catolicismo e do espiritismo, temos efígies de Orixás, figuras vinculadas às forças da natureza. É possível conferir de perto estatuetas de Oxalá, divindade masculina responsável pela criação de todos os seres e considerado o pai de todos os orixás; Oxóssi, divindade que vive nas florestas e representa a fartura, sempre empunhando um arco e flecha; Iemanjá, deusa dos mares e oceanos, considerada a mãe de todos os orixás e símbolo da maternidade e a fecundidade; Obá, divindade do barro e das enchentes, responsável por carregar armas e cozinhar os alimentos; entre outros.
A Umbanda, religião genuinamente brasileira, que agrega elementos de outros credos, também é destaque na exposição, através de representações das conhecidas Pretas e Pretos-Velhos. Tais entidades incorporam os espíritos de negros africanos e são admiradas pela sabedoria e simplicidade dos conselhos e ensinamentos, além de possuírem os conhecimentos de ervas e plantas utilizadas em rituais.
Para o conservador e restaurador de bens culturais do Forum da Cultura Saulo Machado, a nova exposição é uma demonstração de resistência e valorização da cultura negra. “Apesar dos mais de três séculos de escravidão que ainda reverberam na atual sociedade, ecoando em forma de racismo, intolerância religiosa e tentativas de apagamento cultural, “Negritude” é a prova de que a cultura negra permanece viva, pulsante e como um dos pilares da sociedade brasileira. Daí, faz-se tão necessária e importante a utilização do sistema museal para a difusão e preservação dessa rica herança cultural. Ao exibir obras e manifestações que retratam a história e as contribuições do povo negro, a exposição não só resgata o passado, mas também promove um espaço de reflexão, valorização e empoderamento, reafirmando a importância de reconhecer e celebrar a diversidade cultural”, reflete.
Também estão expostas figuras de mulheres e homens negros dançando o Jongo e o Maracatu. O jongo é uma dança afro-brasileira que une versos ritmados e movimentos de roda, ao som de tambores. Trata-se de um dos ritmos que deu origem ao samba. O Maracatu, por sua vez, é uma manifestação composta por música, dança e outros elementos culturais trazidos por escravizados do continente africano. Seu surgimento ocorreu no período colonial brasileiro, no estado de Pernambuco, tendo recebido influências indígenas e portuguesas.
Inserida neste contexto, a mostra desempenha um papel fundamental na desmitificação de crenças preconcebidas em relação às religiões de matriz africana, que por séculos foram demonizadas e ligadas à ideia de algo negativo.
As obras em exibição são originárias de diferentes localidades do país como, por exemplo, Bahia, Caruaru (PE) e Moçambique. Elas são feitas a partir de materiais como gesso e cerâmica policromados, metal e miçangas, entre outros. A estética peculiar, as múltiplas tonalidades, texturas e formatos escolhidos pelos artistas para a concepção de cada uma das peças, criam uma atmosfera diferenciada, que permite aos visitantes se encantarem com as belezas e mensagens transmitidas por uma cultura que é parte essencial e indissociável de todos os brasileiros.
As belezas da Mitologia Iorubá
A Mitologia Iorubá é um conjunto de crenças que se baseiam na vida em harmonia e em comunidade. Ela inspirou algumas religiões de origem africana, como o Candomblé, no Brasil, e a Santería, em Cuba. É originária da região da África Ocidental, sobretudo da Nigéria.
Composta por mais de 400 orixás, nessa mitologia não há separação entre homens e animais, os próprios animais agem como humanos. Ela também é fortemente marcada pelo culto à ancestralidade, onde é louvada a continuidade da vida através da figura feminina.
Negritude pra dentro da cabeça
Novembro é reconhecido como Mês da Consciência Negra, um período de celebração da cultura e da existência das pessoas negras para a história da sociedade e, principalmente, um momento para relembrar a luta diária contra o racismo e discutir sobre a necessidade de medidas para combater a desigualdade racial.
Em 20 de novembro, celebra-se o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, que inclusive, a partir deste ano, torna-se feriado nacional. A data remete ao dia da morte de Zumbi dos Palmares, último líder do Quilombo dos Palmares, assassinado em 1695. Em diversas cidades do Brasil, ocorrem eventos realizados pelo movimento negro, que proporcionam momentos de aprendizado e reflexão em torno da memória e resistência do povo descendente de africanos/as no Brasil.
Museu de Cultura Popular – UFJF
Com um rico acervo de mais de 3 mil peças, o Museu de Cultura Popular é um importante espaço de preservação, resgate e valorização da arte oriunda de expressões e tradições populares.
Entre estatuárias, artefatos indígenas, brinquedos antigos, peças de crenças religiosas e outros diversos itens, das mais distintas origens, o visitante tem a oportunidade de realizar uma verdadeira viagem a outros tempos e locais, muitas vezes desconhecidos. O museu abriga objetos da cultura nacional e também de estrangeiras.
As peças, de natureza singular, aguçam a curiosidade e atuam como pontos de contato entre pessoas e culturas diferentes, propiciando, dessa forma, um intercâmbio extremamente importante para a sociedade.
O Museu, criado em 12 de março de 1965 – data que marcou o centenário do folclorista Lindolfo Gomes –, foi transferido para o espaço do Forum da Cultura em 1973, sendo doado à UFJF em 30 de setembro de 1987. Sua origem está no trabalho do Prof. Wilson de Lima Bastos, que criou o então chamado “Museu do Folclore”, mais tarde renomeado como “Museu de Cultura Popular”.
Forum da Cultura
Instalado em um casarão centenário, na rua Santo Antônio, 1112, Centro, o Forum da Cultura é o espaço cultural mais antigo da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Em atividade há mais de cinco décadas, leva à comunidade diversos segmentos de manifestações artísticas, abrindo-se a artistas iniciantes e consagrados para que divulguem seus trabalhos.
Endereço e outras informações:
Forum da Cultura
Rua Santo Antônio, 1112 – Centro – Juiz de Fora
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