Nesta quarta-feira, 19, o Grupo Divulgação abre a temporada de teatro adulto 2010 com o espetáculo “Juizado de Pequenas Perdas”, de José Luiz Ribeiro. A peça fica em cartaz até o dia quatro de julho, com apresentações de quarta-feira a domingo, sempre às 20h30, no Forum da Cultura. Reservas pelo telefone (32) 3215-3850.
Contando com um elenco de nove atores, a peça conta a história de Elisa, uma secretária dedicada ao seu trabalho na Gouvêa Empreendimentos Ltda. Em meio ao desespero da firma para ganhar uma concorrência de mercado, e à desatenção da secretária Matilde, que pode pôr tudo a perder, a protagonista faz uma viagem pela própria memória, resgatando valores perdidos com o avanço da tecnologia.
Mergulho histórico e conflito com o presente
Elisa, interpretada por Márcia Falabella, é uma sobrevivente de sua própria história. Bisneta de alemães, perdeu o pai muito jovem. Como naquela época, meados dos anos 40, a mulher não tinha muitos direitos, tampouco muitas opções para se garantir sem um marido, ela foi à procura de alguma alternativa. E foi como datilógrafa que encontrou o sentido da vida, junto a uma máquina de escrever, vista como uma arma de libertação para a mulher da época.
Muitos anos depois, já como secretária mais antiga e exemplar da empresa em que trabalha, Elisa passa a conviver com a modernidade tecnológica e a conseqüente informatização do ambiente de trabalho. Instala-se, então, um conflito de gerações, personificado, de um lado, na protagonista, e de outro, em Matilde, outra jovem secretária, já habituada ao computador.
Memória viva da história de sua firma, Elisa, a todo tempo, leva seus sentimentos e lembranças ao espectador, revivendo vários momentos de seu passado: recordações das cantoras da era do rádio, a religiosidade de sua irmã, seu curso de datilografia na Escola Ramington, a morte de seu pai, a saudade de sua mãe, e todos os momentos vividos na firma desde o antigo chefe.
“Estou me inspirando em outras atrizes e em minhas tias-avós que viveram nessa época. Ainda peguei o final da era da máquina de escrever e acredito que as pessoas se policiavam mais para não errarem, pois corriam o risco de terem que fazer tudo de novo”, afirma Márcia Falabella. A atriz acredita que ainda hoje temos funcionárias como a Elisa, que amam seu trabalho e se dedicam a ele. Nesse ponto, ela se compara à personagem, já que dedicou sua vida ao teatro, uma arte secular.
Segundo o autor e diretor da peça, José Luiz Ribeiro, “a máquina de escrever dá o ritmo da história. Ela traz os questionamentos dos valores da sociedade atual e tecnológica que temos hoje, e como tudo isso se perdeu com o tempo”. Sua inspiração foi o livro “Os meios de comunicação como extensões do homem”, de Marshall McLuhan. No capítulo A máquina de escrever, McLuhan mostra como o equipamento promoveu uma integração de diversas funções, associando escrita, fala e publicação. Ele aponta também para a profissão de datilógrafa, que se tornou uma figura popular nas empresas naquela época.
Uma construção através do tempo
José Luiz Ribeiro optou por um figurino atemporal, em conseqüência das constantes mudanças de época durante a narrativa. O vestuário feminino é monocromático, em tons de cinza, enquanto os atores usam ternos pretos.
Por sua vez, o cenário divide-se em três planos, sendo dois de realidade, presente e passado recente, e um plano elevado, que representa o supra-real, a memória distante da personagem Elisa. A iluminação dá suporte para a construção dos diferentes planos, sendo modificada a cada vez que a cena passa do real para o imaginário, e vice-versa.
Já a trilha sonora traz à mente do espectador o som das máquinas de escrever. O bater das teclas é considerado pela protagonista um som ritmado, quase musical, e a trilha mostra essa musicalidade, transformando a datilografia em canções no piano. O espetáculo ainda é pontuado pelas canções de Dalva de Oliveira – estrela do rádio – que embalam os momentos nostálgicos de Elisa.