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Da universidade para a sociedade: coleção de livros da UFJF documenta ações de extensão

A Editora UFJF torna pública – e gratuita – a coleção “A Extensão que fizemos, a Extensão que faremos: um novo tempo para a universidade pública na sociedade brasileira”. Composta por nove volumes, a série apresenta textos que retratam projetos e programas realizados pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) entre 2016 e 2023, abrangendo os trabalhos apresentados nas Mostras de Ações de Extensão da instituição.

De acordo com Marcus Vinicius David e Girlene Alves da Silva, reitor e a vice-reitora do período em questão, o objetivo da coleção é “dar visibilidade ampliada à articulação entre o conhecimento produzido na Universidade e as demandas da sociedade, demonstrando como a produção acadêmica pode ser aplicada e construída em uma relação direta com a comunidade”.

A organização das obras é assinada pelas então pró-reitora e pró-reitora adjunta de Extensão, Ana Lívia Coimbra e Fernanda Cunha Sousa, respectivamente. Cada volume traz contribuições relacionadas às diversas áreas temáticas dos projetos e programas de extensão realizados na UFJF, abrangendo Comunicação, Cultura, Direitos Humanos e Justiça, Educação, Meio Ambiente, Saúde, Tecnologia e Produção, e Trabalho.

Um registro do passado e uma contribuição valiosa para o futuro

Para a atual pró-reitora de Extensão, Érika Andrade, a extensão é fundamental para a integração entre universidade e sociedade, impactando diretamente no desenvolvimento social, cultural e econômico. Segundo Andrade, essa dinâmica contribui para o desenvolvimento acadêmico e profissional dos estudantes, promovendo experiências que extrapolam os limites da instituição, tendo contato direto com as realidades e os desafios do cotidiano para além da universidade.

“Estas obras terão impacto significativo no processo de curricularização da extensão da UFJF.” (pró-reitora de Extensão Érika Andrade)

Os livros, de acordo com Andrade, oferecem uma visão abrangente das experiências e desafios enfrentados pela UFJF no campo da extensão, servindo como referência para o aprimoramento de práticas e metodologias futuras. “O material será uma fonte de consulta para o conhecimento de experiências possíveis e reais que poderão servir de inspiração para novas possibilidades de atividades de extensão e suas diversas formas de organização, avaliação e integração aos currículos acadêmicos dos diferentes cursos.”

A divulgação dos volumes também é vista pela pró-reitora como uma oportunidade de ampliar a compreensão e o alcance das práticas extensionistas. Para Andrade, o material reforça a função da universidade como agente de transformação social, com impacto direto na qualidade de vida das comunidades atendidas pelas ações da UFJF. Ela conclui que a coleção consolida o papel da extensão na política institucional da universidade e em seus objetivos formativos.

As consequências desastrosas da mineração em Minas Gerais

Professor Miguel Felippe coleta água do rio Paraopeba (Foto: Maria Otávia Rezende)

O projeto “Minas de lama: os desastres da mineração em Minas Gerais”, coordenado pelo professor Miguel Fernandes Felippe, do Departamento de Geociências da UFJF, foi idealizado a partir das demandas sociais que surgiram após o rompimento das barragens de mineração em Mariana e, posteriormente, em Brumadinho. Felippe integrou as primeiras equipes de cientistas que começaram a estudar os desastres e, nessa experiência, pôde conversar com muitas pessoas atingidas. Foi aí que o professor percebeu que informação de qualidade era uma ferramenta importante para combater as desigualdades de poder presentes nesse conflito ambiental.

Segundo Felippe, à época, a população afetada queria saber se a lama era “tóxica”, se podia pescar no rio, nadar, plantar sobre os rejeitos. Dessa forma, a ideia do coordenador foi criar um projeto de extensão para fazer a divulgação científica dos resultados das pesquisas sobre os desastres, em uma linguagem acessível.

No início, todos os trabalhos sobre os desastres publicados na plataforma do “Google Acadêmico” foram compilados, lidos e fichados. Depois disso, foram selecionados os trabalhos que respondiam as perguntas mais frequentes da população para que fosse feita uma resenha em linguagem simples. Todas essas resenhas foram publicadas no site do projeto, também chamado “Minas de Lama”. Num terceiro momento, foram feitos e publicados, no Spotify, áudios em formato de podcast de curta duração com um resumo das pesquisas. Para o YouTube, o projeto elaborou vídeos animados, sempre com o objetivo de diversificar os meios de comunicação e facilitar a linguagem dos resultados das pesquisas.

“Pessoalmente, fiquei comovido com a participação dos alunos de graduação e a dedicação que tiveram com o projeto. Vários relataram a relevância do projeto para uma formação profissional mais ética, solidária e socialmente engajada, mas também, ressaltaram a relevância do projeto na formação do caráter e de valores pessoais.” (Miguel Fernandes Felippe, coordenador do projeto “Minas de lama: os desastres da mineração em Minas Gerais”)

As discussões ambientais, institucional e globalmente, são pautadas com pouquíssimo ou nenhum lastro social, argumenta Felippe. Ele coloca que “a tecnocracia que se filiou a um conceito de sustentabilidade distorcido, está regendo um debate fundamental para o futuro e presente da humanidade, sem compreender as reais demandas ambientais da sociedade”. Para Felippe, a extensão universitária, na temática de meio ambiente, tem a missão de pensar uma nova forma de relação entre sociedade e natureza.

Inclusão no mercado de trabalho e emancipação social

Além de capacitar moradores, projeto promoveu educação alimentar e nutricional (Foto: Brasil com S)

O projeto “Inclusão produtiva através de oficinas culinárias em uma obra social do município de Juiz de Fora – MG”, coordenado pela professora Ana Lívia de Oliveira, foi criado para promover a inserção no mercado de trabalho, a emancipação social e o aumento da renda.

O projeto, que terminou seu período de vigência em 2020 durante a pandemia, era desenvolvido por meio de oficinas culinárias na cozinha da obra social de Santa Catarina, no bairro Jardim Casablanca, Cidade Alta, em Juiz de Fora.

A partir da definição de estratégias pedagógicas, dinâmica de grupo, ambientação e tempo previsto para cada atividade, os participantes eram capacitados para serem microempreendedores individuais, auxiliares de cozinha e empregados domésticos.

Era também promovida a educação alimentar e nutricional dos beneficiários do projeto, para que pudessem melhorar a saúde e contribuir com mais ideias para a definição conjunta das receitas elaboradas nos encontros.

Na perspectiva da coordenadora do projeto, os relatos mais marcantes eram os de pessoas que conseguiram empreender ou entrar no mercado de trabalho. Nesse sentido, Oliveira entende que a extensão universitária contribui para a entrada de pessoas capacitadas no mercado de trabalho e para a participação e formação contínua de alunos de graduação, fazendo com que se fortaleça a ideia de uma universidade aberta e atenta às soluções de problemas enfrentados pela sociedade.

Diálogos com a educação de jovens e adultos

“O Brasil tem fome: leituras freireanas na Educação de Jovens e Adultos (EJA) para construção de outros currículos”, projeto coordenado pela professora Mariana Cassab, foi estruturado a partir do princípio pedagógico e político de que a escola e seus educadores produzem práticas curriculares criativas e resistentes – e, por isso, não apenas reproduzem as políticas educacionais de seu tempo, mas também as refletem. Nesse sentido, para a coordenadora, ampliou as leituras críticas em relação às políticas educacionais do tempo presente e o pensamento sobre o que é produzido no currículo das escolas públicas.

EJA é uma modalidade da Educação Básica que permite que adultos retomem e concluam os estudos (Foto: Agência Brasil/EBC)

O projeto se dá, principalmente, por meio do curso “Políticas e Práticas Curriculares em EJA: Resistências em Meio às Contrarreformas Educacionais”, oferecido às educadoras que atuam em diferentes etapas da escolarização e em diversas áreas de conhecimento. Além de contribuir para  a formação de educadores, coordenadores pedagógicos e gestores, o curso afirmava a autonomia, autoria e a criatividade docente através da valorização do educador, fortalecendo a EJA como modalidade educacional.

Cassab considera marcante a possibilidade de dialogar com pessoas ligadas à EJA em diferentes territórios do país e reconhecer suas demandas. A professora elenca, como um momento especial, relatos de alunos que passaram por essa modalidade educativa, que confirmaram a capacidade que ela possui de mudar vidas. Ela recorda, ainda, outro momento significativo: a oportunidade que as bolsistas do projeto tiveram de participar da organização do curso, dialogar com profissionais da educação e apresentar o trabalho desenvolvido em dois eventos acadêmicos.

Para a professora, a extensão universitária é uma oportunidade de diálogo entre a universidade e outros espaços educativos. Ela acredita que essa troca pode incentivar uma cultura colaborativa de aprendizagem, ajudando a enfrentar desigualdades e a refletir sobre o papel da educação na sociedade.

A música no bairro Dom Bosco

O coordenador do projeto “Oficinas de Musicalização e Aulas de Violão: inclusão cultural na luta por reconhecimento”, Guido Del’ Duca, tinha o desejo de causar impacto positivo na comunidade em que está inserido. A partir de sua experiência como estudante e trabalhador da UFJF, Del’ Duca pensou que seria uma boa ideia oferecer a oportunidade de aprender a tocar violão para crianças e jovens socialmente vulneráveis, moradores do bairro Dom Bosco, próximo à universidade.

Vista do bairro Dom Bosco, em Juiz de Fora (Foto: Carlos Alberto Romanelli)

O projeto acontece através de oficinas nos turnos da manhã e da tarde, em uma sala na sede do Grupo Semente, uma associação espírita que realiza trabalhos de assistência social no Dom Bosco. Durante as aulas, os alunos fazem exercícios de desenvolvimento da percepção musical e da técnica ligada ao instrumento e ao canto. Além disso, trabalham os processos de composição coletiva.

Sobre os momentos marcantes do projeto, Del’Duca aponta que, mesmo com a ação de extensão tendo já alguns anos de existência, foi no último ano que teve a ideia de inserir práticas de composição nas oficinas. Assim, o objetivo do coordenador era exercitar a criatividade dos beneficiários do projeto, focando mais no processo de criação que no resultado. Porém, de acordo com Del’Duca, “os resultados foram muito surpreendentes, e a naturalidade com que eles protagonizaram os processos de composição me marcou muito. Recentemente, apresentamos nossas composições para os moradores do bairro Dom Bosco em um evento realizado no Grupo Semente, e este foi um momento muito marcante para todos”.

Os projetos de extensão na área de cultura são um importante mecanismo de inclusão social de grupos tradicionalmente excluídos de processos e espaços de formação cultural, segundo o coordenador. Ele acrescenta que os projetos também são uma forma eficaz de emancipação social, “porque os alunos passam a ter mais capacidade técnica e interpretativa para se expressarem culturalmente e para assimilarem a cultura que se manifesta ao seu redor”.

Educação alimentar para a população mais vulnerável

Em 2018, motivada pela necessidade de contemplar faixas etárias de grande vulnerabilidade biológica e social, a professora Eliane Rodrigues de Faria criou o “Programa Saúde na Escola (PSE): ações de promoção da saúde na infância e na adolescência”, que promove educação alimentar e nutricional entre crianças e adolescentes de 2 a 19 anos em escolas municipais de Juiz de Fora (MG). Ele é parte do Programa Saúde na Escola (PSE) e conta com a parceria das Secretarias de Educação e Saúde do município.

Segundo Faria, a ideia surgiu da necessidade de iniciar ações de educação alimentar o mais cedo possível, considerando como hábitos saudáveis impactam na prevenção de doenças e na qualidade de vida. O trabalho une famílias, profissionais de saúde e funcionários escolares para construir soluções conjuntas.

Projeto leva educação alimentar e nutricional entre crianças e adolescentes (Foto: Agência Brasil)

As iniciativas incluem hortas escolares, oficinas culinárias e atividades interativas com jogos, teatro e fantoches. Para os pais e responsáveis, o projeto organiza palestras e grupos de discussão sobre alimentação e realiza demonstrações práticas sobre o teor de sal, açúcar e gordura nos alimentos. Materiais educativos também são distribuídos para reforçar o aprendizado e incentivar mudanças de comportamento.

Após a pandemia de Covid-19, o retorno às atividades presenciais evidenciou o impacto do projeto. Faria menciona momentos marcantes: “uma das crianças, em torno de cinco anos, começou a chorar e se disse emocionada por ver tantas pessoas juntas dando atenção a elas”. Foi possível ver “a importância do projeto na vida das crianças e da população mais vulnerável, não só nos aspectos educativos em relação à alimentação e nutrição, mas também no acolhimento, de se sentirem importantes e da aproximação com a universidade, que para eles era tão distante”.

A professora também destaca a importância da extensão universitária na formação dos estudantes ao permitir que eles apliquem o aprendizado teórico na prática, ao mesmo tempo em que interagem com saberes populares. Essa vivência contribui para uma formação mais humanística, aproximando os estudantes da realidade social e das necessidades da população.

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Matéria: Paulo Henrique Costa Totti

Edição: Laís Cerqueira