Literatura e Ética: niilismo e antiniilismo
Colóquio Internacional
Universidade Federal de Juiz de Fora (ICH)
4 e 5 de julho de 2023
A crítica filosófica de Levinas à obra de Proust, na qual tudo é “vertiginosamente possível”, é um importante ponto de partida para se pensar as relações entre a literatura e a ética. O exílio do poeta da cidade que segue à sua entrega ao ritmo vertiginoso da estética, inaugura uma experiência do niilismo que atravessa a literatura moderna e enfraquece o “músculo do espírito” que Levinas julgou necessário à ética. O juízo levinasiano de que existe algo de “irresponsável e egoísta no gozo estético” alcança a mesma hesitação em face da arte que encontramos em Tolstói, para quem o ritmo da estética “embota à inteligência” e poderia levar a mais firme das consciências a dissolver-se nos mistérios de Sodoma e Gomorra. Ao mesmo tempo, a dimensão antiniiilista presente na literatura moderna, encarnada na própria arte de Tolstói, oferece uma realidade que questiona o caráter niilista da experiência literária e desfaz, no interior do procedimento artístico, o abismo que separou a responsabilidade ética da tentação estética. A pulsão antiniilista que orienta, por exemplo, a literatura ucraniana e russa, de Nikolai Gógol a Vasili Grossman, aponta para uma responsabilidade ética da literatura que se expôs aos riscos do não sentido e movimentou-se entre o pêndulo do niilismo e do antiniilismo
A afirmação de Derrida de que a literatura é uma instituição que permite “dizer tudo” encontra-se no mesmo horizonte do criticismo de Levinas da literatura e traduz a ambiguidade de uma escritura que encontra na performance estética a possibilidade de um acontecimento ético. Ao inscrever na realidade uma experiência de “suspensão da lei”, a literatura moderna se liberta de todas as formas tradicionais de vínculos e torna possível um “ser suspendido” que se encontra diante de uma realidade e diferença incomensuráveis. O que Levinas descreveu nos cadernos de cativeiro como a “erupção do fantástico” coloca, portanto, “todo o real à beira de um precipício”. Dessa forma, o fantástico gogoliano, a polifonia de Dostoiévski, a desfamiliarização de Tolstói, o involuntário de Proust – e toda constelação estética que atravessou o século XX – de Kafka a Guimarães Rosa – oferecem-nos vestígios da inquietude ética e do “desejo quase maníaco por contato” de uma escritura que procurou, febrilmente, caminhos em direção ao mistério do outro.
A partir dessa perspectiva, o colóquio se constituirá como espaço de reflexão sobre as possíveis relações entre ética e literatura, considerando expressões artísticas e filosóficas de latitudes distintas.
Programa
Terça feira, 4 de julho
14h Abertura
Niilismo e Filosofia
14h20 Andrea Potestà (Pontificia Universidad Católica de Chile)
El ethos del nihilismo
14h50 Frederico Pieper Pires (UFJF)
Niilismo e diferença colonial
Mediação: Danilo Mendes (UFJF /Editora Recriar)
19h Gerard Besussan (Université de Strasbourg)
La philosophie est un nihilisme
Tradução e mediação : Jimmy Sudário Cabral (UFJF)
Quarta feira, 5 de julho
Literatura : niilismo e antiniilismo
14h Maria Clara Lucchetti Bingemer (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro)
Etty Hillesum : teopoética e testemunho
14h30 Marcos Lopes (Unicamp)
Iniciação ao niilismo- a poesia de João Luiz Barreto Guimarães
15h Marcio Capelli (Pontifícia Universidade Católica de Campinas)
O poema como exercício espiritual (uma maneira de perder-se)
Café
16h30 Renato Lessa (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro)
Mundos de Primo Levi
Mediaçao : Fernando Perlatto (Universidade Federal de Juiz de Fora)
Café
19 h Maxim D. Shrayer (Boston College)
Vasily Grossman’s Path of Jewish Resistance
Mediação : Jimmy Sudário Cabral (UFJF)
Lançamento do livro
Maxim D. Shrayer (Boston College)
Nabokov e o Judaismo – História e Memória antes e depois do Holocausto
(Coleção Literatura e Ética. Editora Recriar. Coordenação Jimmy Sudário Cabral, UFJF/ Susan McReynolds, Northwestern University)
Eixos temáticos
- Literatura e ética
- Niilismo e filosofia
- Niilismo e literatura
- Literatura, filosofia e ética animal
- Literatura, niilismo e guerra
- Literatura, fé e genocídio.