Promover o acesso de meninas negras ao conhecimento científico e à carreira acadêmica foi a missão proposta pela pesquisadora da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Zélia Ludwig, ao programa Camp Serrapilheira. Concorrendo com outras 870 propostas, Zélia foi um das 50 selecionadas (primeira fase prevista no edital) para apresentar os trabalhos que vem desenvolvendo para democratizar os benefícios da ciência. O evento reune diversos pesquisadores e divulgadores científicos do Brasil no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, entre os dias 4 e 7 de setembro. A iniciativa, dedicada a mapear e apoiar projetos de Divulgação Científica, é do Instituto Serrapilheira.
Conhecendo de perto as dificuldades enfrentadas por mulheres negras na Academia e na sociedade — ela é uma das poucas professoras negras do Instituto de Ciências Exatas da UFJF (ICE) –, Zélia passou a desenvolver e colaborar com trabalhos que incluíssem esse grupo na Ciência. “Participando do Grupo de Trabalho de Minorias da Sociedade Brasileira de Física (SBF), conheci pessoas e histórias, além de casos de racismo, exclusão, invisibilidade e desigualdade que elas enfrentam. Não só na universidade, mas na sociedade como um todo. Eu passei por isso há 20, 30 anos. Por que esses jovens precisam continuar sofrendo com isso?”, reflete a professora.
A história de Zélia mostra o potencial libertador do conhecimento científico e a carreira acadêmica como uma forma de mudar realidades – mas a pesquisadora também aponta que o acesso a estes benefícios não é democrático. Debatendo a realidade das mulheres na Academia, em 2016, Zélia criou a página “Mulher, Ciência e Sociedade” e, desde 2017, colabora como o projeto de Extensão “A ciência que fazemos”, voltado para estudantes da Rede Pública. Mais recentemente, a professora começou a observar a situação das meninas negras com uma atenção especial.
“Muitas dessas meninas, que deveriam estar estudando, estão trabalhando e cuidando dos filhos ou dos irmãos menores. Quando converso com elas, percebo que aceitam essa situação por não vislumbrarem alternativas. Mas, se tiverem algo novo, estão dispostas a agarrar. A Ciência pode ser esse algo novo, mas ela precisa ser mais inclusiva. É preciso que a Ciência vá até elas levando em conta sua realidade, oferecendo modelos que as inspirem, que dêem coragem, que mostrem que a carreira científica é uma possibilidade real.”
“Espero ver mais meninas negras nos laboratórios”
No evento, Zélia apresentará os trabalhos que já vem desenvolvendo na UFJF. Se selecionada para a próxima fase do Camp Serrapilheira, a pesquisadora deverá receber até 100 mil reais para ampliar estas iniciativas. “Com esse apoio, conseguiremos desenvolver um trabalho integrado com a UFJF, continuando e ampliando as visitas às escolas da Rede Pública, a produção de materiais didáticos, de workshops e eventos, como feiras de ciências e mini-cursos.”
Além dessas atividades, a professora pretende trazer essas estudantes para conhecer os laboratórios da Universidade. “Espero ver mais meninas negras nos laboratórios, dominando essas máquinas maravilhosas que a Ciência e a tecnologia nos oferecem. É importante ressaltar que não estou sozinha nessa empreitada: temos o apoio de professores e funcionários das escolas públicas e da UFJF, além de alunos voluntários”, conclui.
O Serrapilheira
Criado em 2017, o Instituto Serrapilheira é uma organização privada sem fins lucrativos, dedicada a fomentar o progresso científico no Brasil, apoiando tanto o desenvolvimento de pesquisas de impacto quanto iniciativas para divulgar e democratizar o conhecimento gerado nesses trabalhos.