Exalando aroma que lembra limão, a Stachytarpheta odorata foi descrita em julho na revista Tropical Plant Biology (Foto: Fátima Salimena)

“Uma grande responsabilidade”. É assim que os pesquisadores que descreveram a nova espécie de planta rara da Serra do Cipó dizem sobre a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Isso porque a Universidade, atualmente, é o único lugar que se tem conhecimento onde há exemplares cultivados desta espécie de planta. Há 18 anos que ela não é encontrada em seu habitat natural. Apesar desse tempo, ela ainda não pode ser considerada extinta na natureza, pois é preciso que tenha pelo menos 50 anos sem ser encontrada, sendo atribuído o status de conservação preliminar de criticamente ameaçada.

Publicada na Revista Tropical Plant Biology, a nova espécie Stachytarpheta odorata foi descrita por pesquisadores da UFJF e UFRJ. Trata-se de um arbusto de até dois metros de altura com ramos e folhas pegajosas, com pétalas roxas e cálice verde-arroxeado. O aroma que lembra limão motivou a escolha de seu nome, representado pelo epíteto específico “odorata”. O gênero Stachytarpheta conta com cerca de 90 espécies brasileiras. 

“Uma nova espécie de planta é descrita por dia no Brasil. Muitas delas são endêmicas, o que faz com que os taxonomistas corram contra o tempo, diante da destruição dos ambientes naturais” (Fátima Salimena)

Coletada em 2005 pela pesquisadora Fátima Salimena, especialista no gênero Lippia, e desde então mantida cultivada na Estação Experimental da UFJF, a planta ainda não tinha sido analisada minuciosamente. Em 2020, o doutorando Pedro Cardoso – UFRJ, que estuda o gênero Stachytarpheta desde 2016 – quando ainda estava na Iniciação Científica na UFJF – se propôs a estudá-la, a pedido da docente que relembrou a possibilidade de se tratar de uma espécie nova.  

“Descrever uma espécie nova é uma tarefa complexa que demanda muito tempo de estudo e dedicação ao grupo taxonômico. O taxonomista aprimora o entendimento dos limites das espécies a cada dia para aprender a diferenciá-las umas das outras e identificá-las corretamente. Assim, para saber se uma espécie é nova, precisamos, antes de mais nada, conhecer muito bem todas as outras espécies já descritas para a ciência, suas características diagnósticas, distribuição geográfica e ecologia”, informa Pedro Cardoso.

Planta endêmica da Serra do Cipó

Quando os pesquisadores se deram conta que se tratava de uma nova espécie, eles recapitularam todo o histórico de quando a planta havia sido coletada pela primeira vez. Foram feitas algumas expedições ao local para tentar reencontrar a espécie, em 2022 e em 2023, mas não houve sucesso. “O que nós constatamos é que a antropização avançou muito na região, e a criação de fazendas, áreas de pastagem, e até mesmo incêndios incontrolados podem ter dizimado a espécie.” 

A planta foi coletada por Fátima Salimena em 2005 em uma área muito específica na Serra do Cipó (Foto: Fátima Salimena)

De acordo com o doutorando, o primeiro estudo sobre as plantas da família Verbenaceae da Serra do Cipó foi realizado por Salimena em seu mestrado na Universidade de São Paulo, com uma publicação em 1998. “A Serra do Cipó, de onde S. odorata é originária, é uma região de alta importância biológica e relativamente bem coletada em termos de sua flora desde 1972 através do amplo estudo conduzido pela USP.”

Para a pesquisadora Fátima Salimena, esta espécie é considerada microendêmica, ou seja, com ocorrência em uma única localidade com área muito reduzida, por isso é considerada rara na natureza. “Atualmente a única população desta espécie está na UFJF sob cultivo”, aponta.

Há estudos em andamento para produção de novos indivíduos a partir de cultura in vitro no Departamento de Botânica. Há a expectativa, inclusive, de reintroduzi-la na região onde foi encontrada originalmente. Isso pode ser viabilizado por meio de parceria com Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que é o órgão responsável pela área junto ao Parque Nacional da Serra do Cipó.

O foco dos pesquisadores agora é reintroduzir a Stachytarpheta odorata em seu habitat natural (Foto: Reprodução)

Para se entender sobre o que representa uma planta extinta, Pedro Cardoso salienta que significa perder todo o potencial que ela tem de sua utilidade para a vida humana, na descoberta de substâncias químicas, de medicamentos que podem ajudar a combater doenças.

“Para além da perspectiva de uso humano, é importante justificar que espécies raras desempenham um papel fundamental para a manutenção dos ecossistemas, e a extinção resulta na perda de funções ecológicas que desempenham, por exemplo, a interação com os polinizadores e a oferta de recursos para a fauna. A extinção representa ainda o aniquilamento de uma linhagem que tem uma história evolutiva única na Terra”, lamenta Cardoso.

Potencial de novas descobertas

“A estimativa é que existam outras 12 milhões de espécies ainda a serem descobertas e descritas pela ciência, segundo Thomas Lewinsohn, professor e pesquisador da Unicamp”, enfatiza Fátima Salimena sobre o potencial da taxonomia de novos seres vivos, já que atualmente existem contabilizados cerca de 1,75 milhões em todo o planeta, o que representa 30% da biodiversidade da Terra. 

Sobre a biodiversidade brasileira, a docente aposentada do ICB comenta que se trata da flora mais rica do mundo: “Uma nova espécie de planta é descrita por dia no Brasil, segundo a coordenadora do projeto Flora do Brasil, Rafaela Forzza. Muitas destas espécies são endêmicas, como a nova espécie Stachytarpheta odorata, o que faz com que os taxonomistas corram contra o tempo, diante da destruição dos ambientes naturais e perda acelerada da biodiversidade”.

Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU

As ações de pesquisa da UFJF estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). A pesquisa citada nesta matéria se alinha ao ODS 15 (Vida Terrestre).

Confira a lista completa no site da ONU.

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