O Núcleo de Espectroscopia e Estrutura Molecular (Neem) da Universidade Federal de Juiz de Fora foi um dos contemplados na chamada da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI) – Infraestrutura de Pesquisa em Áreas Prioritárias (Proinfra 2021). O Neem vai receber o montante de R$ 2.464.055,16, o que representa o valor total solicitado. A Rede Integrada de Pesquisa em Alta Velocidade (RePesq) é outra beneficiada da UFJF neste edital.
Vinculado ao Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (ICE), o Núcleo de Espectroscopia e Estrutura Molecular também teve projeto aprovado em demanda submetida pelo Sistema de Gestão de Investimentos em Tecnologia (Sigitec) da Petrobras. O projeto de pesquisa foi assinado recentemente entre as instituições, sendo R$ 4,95 milhões o valor a ser financiado. Somente com essas duas chamadas, serão mais de 7 milhões de reais investidos no Neem.
Composto majoritariamente por pesquisadores do Departamento de Química, o Núcleo conta ainda com docentes do Departamento de Física, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e da Faculdade de Farmácia (FF), tendo atuação diversificada. De acordo com o professor Luiz Fernando Cappa de Oliveira, coordenador do Neem, o aporte financeiro será usado na aquisição de novo instrumento para fazer espectroscopia de alto nível, com um conjunto significativo de linhas de excitação, desde o ultravioleta até o infravermelho próximo.
O novo equipamento vai “permitir obter informações relevantes através do espalhamento inelástico de luz (efeito Raman) e também dados da emissão luminescente dos mais variados tipos de sistemas químicos (sólidos, líquidos, gases)”. Podem ser analisados por esse instrumento uma grande diversidade de materiais, tais como: fármacos, produtos naturais, alimentos, vidros diferenciados.
O pesquisador explica que a espectroscopia vibracional é o estudo das propriedades vibracionais de sistemas químicos: “todas as moléculas, que contêm átomos que se ligam espacialmente para formar estruturas químicas, apresentam movimentos vibracionais.” Um exemplo é a união química dos átomos de hidrogênio e de oxigênio para formar a molécula de água.
“Como os átomos, todos ou alguns, se movimentam no espaço com uma energia determinada, essa energia associada a esse movimento pode ser observada e medida através da interação das substâncias com luz (na região do infravermelho ou visível) e ser usada como uma ferramenta de análise quali e quantitativa daquele sistema químico em qualquer ambiente em que esteja”, esclarece sobre o potencial científico do Neem.
Além de Luiz Fernando Cappa, também estiveram envolvidos nesta chamada os pesquisadores Flávia Cavalieri Machado, Antônio Carlos Sant’Ana, Gustavo Fernandes Souza Andrade, Cristiano Legnani, Benjamin Fragneaud, Welber Gianini Quirino, Lyderson Facio Viccini, Michele Munck e Ítalo Tuler Perrone.
A Química na exploração de petróleo
Intitulada ‘Espectroscopia Raman para caracterização mineralógica e da matéria orgânica’, a pesquisa financiada pela Petrobras tem potencial para ajudar a determinar a busca por novos poços de petróleo, conforme informa Cappa. “A detecção de componentes geológicos associados à presença de um bolsão orgânico, como alguns minerais baseados em carbono, indica um caminho mais preciso na busca por petróleo.” Os recursos serão utilizados para compra de equipamentos, insumos e bolsas, além da contratação de recursos humanos especializados.
Com base na técnica de determinação de estruturas químicas, conhecida como espectroscopia Raman, será feito levantamento de banco de dados de amostras minerais reais obtidas a partir de perfurações de poços petrolíferos. Segundo o pesquisador, o imageamento confocal por espectroscopia Raman é uma técnica analítica não destrutiva que permite identificar e quantificar fases minerais, líquidas e gasosas, além da presença de compostos orgânicos em amostras laterais e testemunhos.
Uma vantagem analítica é evitar etapas de preparação de amostras, permitindo analisar fragmentos com superfície rugosa, lâminas petrográficas e bipolidas, seções polidas, lâminas de palinofósseis, entre outros. Tal técnica possibilita examinar os modos vibracionais atribuídos às ligações químicas de cada fase da amostra, caracterizando a composição química e a estrutura molecular.
“Em cada ponto analisado é obtido um espectro Raman gerado pela incidência de um laser com comprimento de onda no ultravioleta, visível ou infravermelho a depender da resposta do analito. A amostra é digitalizada ponto por ponto e linha por linha, e para cada pixel é capturado um espectro Raman completo durante a varredura contínua”, detalha. Ao incidir uma faixa de luz sobre uma amostra do material a ser analisado, é possível obter informações a respeito de suas propriedades químicas e físicas, a partir das ondas eletromagnéticas espelhadas pelas vibrações moleculares do sólido.
Para maior agilidade e precisão, a equipe científica desenvolverá, em colaboração com empresa especialista, software de reconhecimento dos padrões de imagem Raman das amostras obtidas a partir de inteligência artificial. Com isso, será possível gerar uma comparação entre esses sinais e os dados de uma amostra desconhecida. “Montaremos um banco de dados com inúmeros espectros e imagens Raman para, quando necessário, comparar com um espectro e permitir a identificação qualitativa – e muitas vezes quantitativa – da amostra de interesse”, acrescenta o professor do Departamento de Química da UFJF.
A expectativa é obter uma vantagem analítica ao evitar etapas de preparação, resultando numa produção mais eficiente de hidrocarbonetos. Também participam desta pesquisa os professores Celly Izumi, Gustavo Andrade e Antonio Carlos Sant’Ana, todos do Departamento de Química da UFJF, além do envolvimento de estudantes.
Pesquisas de ponta
Atualmente, o laboratório conta com dois espectrômetros Raman: um interferométrico com excitação em 1064 nm, equipado com microscópio e um dispersivo com linhas de excitação em 532, 632,8 e 785 nm, também com microscópio. Há dois instrumentos para aquisição de espectros na região do infravermelho, analisador dinâmico de tamanho de partícula com possibilidade de medição de potencial e um espectrofotômetro que mede transições eletrônicas nas regiões do ultravioleta/visível/infravermelho próximo, na faixa de 200 a 2000 nm.
A nova aquisição vai permitir uma “modernização da infraestrutura instrumental, uma vez que o último equipamento foi adquirido ainda em 2012, ampliando a possibilidade de obtenções de espectros Raman, com variadas linhas de excitação. Além disso, poderemos iniciar estudos de propriedades luminescentes de sistemas químicos, através do novo módulo associado ao instrumento Raman que vai permitir medir espectros de emissão de fluorescência desde o ultravioleta até o infravermelho próximo”.
Dentre os experimentos que estão sendo desenvolvidos no Neem, além do projeto subvencionado pela Petrobras, há o estudo de novos materiais, no qual pesquisadores do Departamento de Física desenvolvem estudos de caracterização de novos materiais baseados em carbono ou sistemas 2D usando espectroscopia Raman como ferramenta de análise.
Há ainda diversas parcerias internacionais estabelecidas. Atualmente, as colaborações ocorrem com pesquisadores de diferentes países e instituições: a Universidade de Victoria, Canadá; o Instituto de Estructura de la Materia – Consejo Superior de Investigaciones Cientificas (IEM-CSIC) em Madri, Espanha; a Universidade Charles, Praga, República Tcheca; a Soutwest Jiaotong University, China; ou ainda, a Universidade de Bradford, Inglaterra.
Sobre o Neem
Instituído há 22 anos, o Núcleo de Espectroscopia e Estrutura Molecular tem como papel fundamental desenvolver pesquisas de alto nível nas mais variadas áreas, contribuindo para a formação de recursos humanos de qualidade na área. “Para se ter uma ideia geral, nos últimos 20 anos foram mais de 300 artigos publicados por pesquisadores ligados ao Núcleo nas áreas de Química, Física, Biologia”, menciona.
Por se tratar de laboratório multiusuário, o Neem atende a pesquisadores de quaisquer unidades. “Para citar dois exemplos, colegas da Faculdade de Odontologia interessados em mapear superfícies dentárias, ou ainda colegas do ICB interessados em estudar pigmentos em moluscos e conchas da coleção do museu de Malacologia. Essas colaborações também se estendem a colegas de outras universidades, como UFMG, UFSJ, UFV, USP, UNICAMP, UFRJ.”
Para o docente, oportunidades como estas são situações diferentes que se apresentam como fontes de financiamento diversas, além das agências convencionais. Apesar dessas contribuições financeiras, as dificuldades orçamentárias das universidades, com os sucessivos cortes em todos os setores da ciência brasileira, têm impactado na dinâmica das atividades de pesquisa nos laboratórios.
Pesquisa está alinhada aos ODS da ONU
As ações de pesquisa da UFJF estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). O Núcleo citado nesta matéria está alinhado ao ODS 9 (Indústria, inovação e infraestrutura). Confira a lista completa no site da ONU.
Outras informações: ufjf.br/neem
Relembre: O potencial tecnológico da Química para a exploração de petróleo