José Murillo Netto é urologista pediátrico e professor da Faculdade de Medicina da UFJF. (Foto: Carolina de Paula)

Definida pela incontinência urinária durante o período do sono em crianças maiores de cinco anos, a enurese noturna é um distúrbio que tem causas desconhecidas pela maioria da população. Muitos imaginam que suas origens são puramente psicológicas – ou que as crianças afetadas fazem o ato de propósito, como uma ‘birra’. Tal avaliação, além de dificultar um tratamento adequado, gera um sofrimento muito grande naqueles afetados diretamente e indiretamente pela doença. 

Com o intuito de quebrar paradigmas e criar novas estratégias multidisciplinares para o tratamento adequado da patologia, pesquisadores da UFJF desenvolvem ações e pesquisas voltadas para o tema. Uma das iniciativas é o projeto de extensão “Atenção às crianças portadoras de enurese noturna e disfunções do trato urinário inferior”, liderado por José Murillo Netto, urologista pediátrico e professor da Faculdade de Medicina da UFJF. Sendo único na região, ele utiliza, desde 2005, as estruturas físicas e profissionais do Hospital Universitário (HU).

Netto explica que a origem da enurese noturna é, na verdade, multifatorial. “Existem diversos fatores associados ao distúrbio, desde os genéticos, até aos aspectos relacionados à produção do hormônio antidiurético, que diminui a produção de urina à noite. Algumas crianças também podem ter um funcionamento anormal da bexiga durante o sono. Desta forma, existem dois tipos de enurese: a primária, que é aquela que a criança sempre fez xixi na cama; e a secundária, com a criança tendo um período mínimo de seis meses sem apresentar episódios”, indica.

Nos casos de enurese primária, o docente aponta que não existe um fator psicológico como causa, mas sim como consequência de todo o estresse social causado pelo distúrbio. Entretanto, no caso da enurese secundária, pode existir um fator de estresse emocional que engatilhe o retorno ao estágio anterior em que a criança volta a apresentar os episódios de urinar na cama durante à noite. Cacilda Andrade, psicóloga e docente da Faculdade de Medicina, também integra a equipe do projeto e aponta a magnitude dos impactos psicológicos nas crianças afetadas.

“Em relação à confusão de achar que a enurese é psicológica, geralmente os pais não buscam ajuda e as crianças ficam em um sofrimento muito grande, além de se sentirem culpadas por algo que ela não têm controle. Muitas crianças que chegam já sofreram muito, porque os responsáveis achavam que elas mesmas tinham que resolver o problema, tendo que se esforçar que o problema que ela possui precisa de um tratamento adequado”, enaltece. 

Tratamento interdisciplinar e novas pesquisas no meio

Um diferencial do trabalho é a presença da multidisciplinaridade nos tratamentos aplicados às crianças portadoras da enurese noturna. Netto explica que o ideal para o tratamento é que seja interdisciplinar, e que a criança afetada seja tratada por um profissional que entenda de enurese. “Entretanto, nem sempre as pessoas conseguem ter acesso adequado a esse tipo de tratamento. Aqui no HU, temos condição de oferecer esse tipo de tratamento. A psicologia cuida da área de comportamento, a enfermagem faz a parte da orientação e das mudanças de hábito, e, em alguns casos, utilizamos a fisioterapia com a eletroestimulação para alcançar os melhores resultados nos tratamentos”, salienta.

Ambos explicam que o encaminhamento até o projeto se dá por meio da rede do Sistema Único de Saúde (SUS). São casos advindos de diversas cidades e regiões do país, já que o projeto é considerado um dos mais importantes da área, com reconhecimento internacional. A equipe liderada por Netto se ampara em diversas pesquisas na área, também desenvolvidas por eles. O grupo é um dos que mais publicam sobre o tema no país. Uma das pesquisas, que ainda está em processo de publicação, faz uma mapeamento sobre as repercussões psicológicas dos traumas vividos por crianças com enurese em desenhos desenvolvidos por elas. 

Para Cacilda, é de suma importância apontar que o desenho é um facilitador entre o profissional de saúde e a criança afetada, justamente por ter uma esfera lúdica e sem julgamentos. “Na verdade, dentro da psicologia, nós não analisamos os desenhos sem a fala da criança, para não interferir no que é da criança e no que ela está sentindo. Fizemos um estudo que avalia os dados do desenho de acordo com critérios pré-estabelecidos, e também o que a criança fala sobre o episódio retratado. O interessante é que todos os resultados das análises gráficas também se mostraram iguais aos das entrevistas. Foi muito importante para ver que os desenhos das crianças são de extrema importância para qualquer profissional de saúde”, esclarece.

Pesquisas estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU
A Coordenação de Divulgação Científica da Diretoria de Imagem Institucional, em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa (Propp), está promovendo uma estratégia de fortalecimento das ações de pesquisa da Universidade, mostrando que estão alinhadas a um ou mais dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU). Os ODS são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade.

As pesquisas citadas nesta matéria estão alinhadas ao ODS 3 (Saúde e bem-estar).