Historicamente negligenciada, a saúde mental vem aos poucos ganhando atenção. A campanha Janeiro Branco foi implantada em 2014 nos moldes do Outubro Rosa, Novembro Azul, Agosto Dourado, entre outras. Com o objetivo de chamar a atenção da sociedade para a temática, o mês de janeiro foi escolhido pela sua representatividade de iniciar o ano, momento em que as pessoas estão mais focadas em resoluções e metas.

As implicações da disseminação do coronavírus para a saúde mental já estão sendo relatadas na literatura científica (Foto: Sasha Freemind/Unsplash)

O ano de 2022 traz ainda um novo sentido, após quase dois anos de distanciamento social imposto pela pandemia de Covid-19. Se, de um lado, os problemas podem ter se agravado por conta do isolamento, de outro, cada vez mais o assunto tem repercutido em diversas instâncias sociais, sobretudo na internet.

“Ainda se observa um estigma significativo relacionado à saúde mental, porém, após a pandemia, onde vivemos uma epidemia de transtornos mentais, este tema se tornou mais acessível, a Psicologia foi muito convocada a estar em espaços de debate”, observa a pesquisadora Fabiane Rossi, docente do Departamento de Psicologia da UFJF.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em torno de 12 milhões de brasileiros sofrem de depressão, o que equivale a 5,8% da população e coloca o Brasil em segundo lugar no ranking americano, perdendo apenas para os Estados Unidos. A ansiedade afeta 18,6 milhões de brasileiros e os transtornos mentais são responsáveis por mais de um terço do número de pessoas incapacitadas nas Américas.

Por isso, para Rossi, o grande desafio é fazer com que a valorização da “importância dessas discussões se concretize após este cenário pandêmico e que políticas públicas possam ser pensadas visando a prevenção e a promoção da saúde mental”. Uma preocupação é que o problema tem atingido cada vez mais a população jovem: “estudantes estão expostos a períodos de grandes modificações na vida pessoal e social”.

Na opinião da especialista, a rotina acadêmica impõe muitas responsabilidades, como grade curricular extensa, novos métodos de estudo ou mudança de cidade, que, aliadas ao período de transição na vida dos jovens adultos, propicia maior predisposição ao aparecimento de transtornos mentais.

Cuidados com a saúde mental

Acredita-se que os estudantes são altamente acometidos por esses transtornos. Em sua avaliação, é importante reconhecer alguns sintomas e diferenciar o que são reações esperadas e o que de fato é um quadro de adoecimento para que se possa buscar ajuda profissional.

“A depressão apresenta sintomas como tristeza, humor deprimido, perda de interesse em atividades, mudanças de apetite, ganho ou perda de peso, insônia ou dormir em excesso, perda de energia ou fadiga acentuada. Já a ansiedade pode ser percebida por meio de alguns sinais como sensação de falta de ar, coração acelerado, suor excessivo, mãos frias e suadas, boca seca, tontura. Porém, é preciso certa frequência, intensidade e com impacto significativo na vida do indivíduo. Assim, somente um profissional especializado pode realizar esse diagnóstico”, alerta sobre quando se deve procurar ajuda.

Em tratamento e vivendo um dia de cada vez, Luan Sabino entende a cura como um processo longo e ressalta a importância de aceitar ajuda (Foto: Arquivo pessoal)

Junto com os compromissos da graduação, o estudante do 8º período de Odontologia, Luan Sabino, passou por momentos difíceis quando se sentiu dominado por profundos sentimentos de tristeza e angústia: “É normal ter dias difíceis, a vida tem dessas fases, os dias tristes existem e podem ter várias causas. Porém, quando isso não passa, podemos perceber que algo está errado, foi aí que notei que estava deprimido.”

O futuro dentista acredita que muitos ainda escondem o problema, não buscam ajuda, se isolam e camuflam a dor por trás de sorrisos. “Nunca deixe que o vazio em você permaneça, pois ele vai afetar todas as esferas da sua vida; lute contra ele, está tudo bem não estar bem. Aceitar o seu processo vai ser libertador e você vai voltar a se sentir bem. Sua vida é única; é só uma fase”, aconselha.

Pesquisa entre universitários

É nesse contexto que está sendo realizada a pesquisa “Sintomas de transtorno de ansiedade e depressão entre estudantes universitários de Minas Gerais: estudo multicêntrico”. Universitários de todos os cursos da Universidade Federal de Juiz de Fora estão convidados a participar da coleta de dados, por meio de formulário on-line, que ficará disponível na UFJF até 25 de fevereiro.

A iniciativa é da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), tendo surgido em 2018 a partir do Projeto sobre Ansiedade e Depressão em Universitários (Padu), devido à preocupação com as repercussões da saúde mental na graduação. Com engajamento de nove instituições de ensino de todo o estado mineiro, o questionário abrange perguntas socioeconômicas, hábitos de vida, condições de saúde, qualidade de vida, suporte social, resiliência e solidão. Todas as informações são confidenciais, sendo usadas apenas para fins científicos.

A partir desse levantamento, o Padu pretende propor ações para tornar o ambiente universitário mais acolhedor e inclusivo. “Também investigaremos quais são os fatores que podem estar relacionados aos sintomas de ansiedade e depressão”, destaca a responsável pelo projeto na UFJF, a professora Fabiane Rossi. No campus de Governador Valadares, a pesquisadora responsável é a docente do Departamento de Medicina, Eulilian Dias de Freitas.

Da análise à aplicação 

Para conhecer a prevalência dos sintomas de transtornos de ansiedade e depressão entre graduandos, a expectativa é que haja participação de pelo menos 5% dos matriculados de cada instituição federal de ensino superior (Ifes) participante, totalizando cerca de 5.000 estudantes.

Fabiane Rossi realizou estudo sobre saúde mental na pandemia de Covid-19 (Foto: Reprodução)

Ao término das coletas, serão iniciadas as etapas de consistência e análise dos dados. Os resultados irão embasar iniciativas para minimizar os sintomas de transtorno de ansiedade e depressão dentro das Ifes e serão produzidos concomitantemente artigos científicos, monografias, teses, dissertações, além de materiais educativos e de orientação de auxílio psicológico.

“Este estudo irá acarretar em implicações importantes para a comunidade acadêmica, pois será possível entender as diferenças entre as áreas do conhecimento e em qual momento da vida universitária os estudantes estão sendo mais acometidos pelos sintomas de transtornos de ansiedade e depressão, e quais fatores estão associados”, detalha.

O conhecimento da pesquisa será útil para promover ações diversas em todas as instituições envolvidas, tais como: rodas de conversa e criação de programas de saúde mental que sejam eficientes, amplos e acolhedores, uma vez que estudantes com esses sintomas tendem a apresentar baixo rendimento e aumentar a probabilidade de evasão. Para Rossi, isso reforça a necessidade de orientar o planejamento de estratégias de mitigação dos efeitos psicológicos nesse público.

Com relação ao papel da campanha Janeiro Branco, Fabiane Rossi alega que é uma ação importante porque traz para o debate temas que anteriormente eram considerados tabus, como saúde mental e suicídio. “Porém, elas precisam ser pensadas com cautela, pois muitas se tornam pontuais somente em determinado mês”, contrapõe.

Para além da conscientização sobre estas condições de saúde/adoecimento, a pesquisadora reconhece que “é necessário um debate sobre a importância do desenvolvimento de políticas públicas direcionadas à garantia do acesso a condições de saúde, à prevenção em saúde mental e à ampliação dos serviços que compõem a rede de atenção psicossocial”.

Atendimento psicológico 

Na UFJF, a Pró-Reitoria de Assistência Estudantil (Proae) realiza atualmente dois tipos de atendimento individual: o projeto Fala Aí, realizado em parceria com o CPA, e a psicoterapia breve, que deve ser solicitada pelo e-mail do Serviço de Psicologia – psicologia.proae@ufjf.edu.br.

Segundo a psicóloga da Proae, Rosana Cognalato, os atendimentos do Serviço de Psicologia nunca foram interrompidos. “Estamos realizando sessões virtuais desde que o isolamento social se fez necessário. Inclusive, no ano passado, foram organizadas abordagens em grupo, virtualmente”, ressalta.

Além disso, a Universidade também conta com o Centro de Psicologia Aplicada (CPA), criado para atender às demandas de ensino, pesquisa, extensão e prática do curso de Psicologia, ofertando atendimento psicológico na área de Psicologia Clínica à população local e adjacências. Em maio de 2021, o CPA retomou as atividades com o público de forma remota, por telefone.

Serviço 

Formulário da pesquisa com universitários | padu.ufjf@gmail.com

Atendimento psicológico (Proae) | psicologia.proae@ufjf.edu.br

Centro de Psicologia Aplicada (CPA) | cpa.psicologia@ufjf.edu.br | (32) 2102-3121